A Fera Sedenta – O Livro dos Grandes Caçadores

Os ventos tormentosos da noite fria cercavam o vilarejo desconhecido, ao mesmo tempo que a nevasca prendia todos do clã de caçadores em suas casas. Alice, adoentada, recuperava suas energias em sua cama, enquanto amontoada de cobertas e peles de feras dos pés à cabeça. Respirava fundo enquanto podia apenas olhar a parede de pedras escuras a sua frente, com seu arco de caça, pendido na parede e a pegar teias de aranha. Quando a porta do quarto se abriu lentamente, Alice ajeitou-se suavemente a ficar sentada. Quem vinha era Litas, seu filho, e com o livro de histórias em mãos como de costume. O menino, quase tropeçando nos lençóis de algodão feitos a mão que se enrolava, andou até a beira da cama, entregou o livro a sua mãe e sentou-se no tapete de peles de urso, ao seu lado.

O livro era muito antigo, logo a capa já estava com manchas de várias cores e desgastada. Alice agora sorridente, mesmo com os olhos fundos, gentilmente abriu a página marcada anteriormente com uma pena, enquanto os olhos de Litas brilhavam como sempre. Certas páginas já estavam com os dias contados, rasgadas ou envelhecidas, outras sequer legíveis, mas isso não podia impedir que a história fosse contada.

Logo Alice começou, calmamente:

— “Em uma noite chuvosa...” — começou ela — “...um homem caçava para salvar sua família. Era uma tempestade muito forte, mas ele não tinha escolha, pois sua esposa e dois filhos já famintos a dias o esperavam. Em épocas como essa, os animais não davam as caras. Outrora este homem já como um grande e bravo caçador, hoje só pensava em suas costas doloridas, embora ainda sem cabelos brancos, mas longos. Mas este tinha algo muito pior para se preocupar. Se sentia completamente perdido, cercado por uma mata alta logo quando pouco podia enxergar com a chuva e a noite de mãos dadas...”

“Embora não vesse nada ao seu redor, ele sabia que não estava só. Ele sentia a sede de sangue que arrepiava os pelos do braço mesmo banhado pela chuva gélida. Tudo que podia fazer era continuar empunhando firmemente sua lança de ponta de pedra, enquanto pensava num discurso de como pedir aos deuses da natureza para que cuidassem de sua família. Mas seus pensamentos foram interrompidos por um barulho claro o bastante de um passo sobre a mata para que o homem ficasse paralisado. Sem mover-se um músculo, olhava para todas as direções rapidamente, desesperado. Sabia que era como entre duas montanhas sem saídas, perseguido por uma cobra venenosa...”

“O que o espreitava era uma grande fera com dentes afiados que saltavam para fora de sua boca e ficavam a amostra para suas presas. Está sabia muito bem o que deveria de fazer e se aproximava passo a passo dentre a mata que a cobria por completo, até que tivesse uma visão clara da costa de seu alvo, amedrontado. Paciente, a fera esperou mais alguns segundos a observar, até encontrar seu momento. Com uma meia rebolada de gato seguido por um impulso monstruoso em todas as patas enormes, a fera saltou na direção do homem...”

“Quando um raio iluminou os céus, o homem virou bruscamente e pode ver a fera no ar, como se o tempo tivesse parado, e ela com as garras e presas brilhando a parecerem mais afiadas que o normal, voando em sua direção. Pouco pensou em reagir a tentativa de encarar de frente a sua morte enquanto agarrava sua lança, mas foi levado para o chão embarreado. Caído no chão e ensanguentado e com uma grande fera sobre seu corpo, o homem fechou os olhos. A fera, sem se mover, fora atravessada pela lança, mas nada à impediu de raspar suas garras no braço do homem, embora nada mais ela conseguiu fazer. Quando voltou para si, o homem abriu os olhos novamente e sequer acreditava que ainda estava vivo. Depois de muito se arrastar, saiu de baixo da fera e se ajoelhou ao seu lado enquanto era banhado pela chuva.”.

Quando finalmente terminou, Alice tossiu duas vezes e fechou o livro. Mas Antes que o menino fizesse mil perguntas, seu pai o interrompeu ao entrar no quarto, com uma tigela de sopa em mãos e o braço enfaixado, a ordenar com uma voz amigável para que Litas fosse dormir.

Nota: Primeiro conto do livro que reunirá as histórias dos caçadores do clã Lesten. A partir destes contos, irei criar o universo do meu livro, ainda em planejamento, deixar algumas ideias claras para mim mesmo, além da experiência. Vale ressaltar que “O livro dos grandes caçadores” estará inserido na história da obra, não sendo o título da mesma. Deixe seu feedback e obrigado por ler.

Felipe Remes
Enviado por Felipe Remes em 23/11/2019
Código do texto: T6802027
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