O Feriadão
Olha que se aproxima mais um feriado. Na verdade é um feriadão, pois sua comemoração é justamente na quinta-feira e com toda certeza a grande maioria dos brasileiros vai enforcar a sexta-feira. Certo? Mais é claro que sim.
Uma boa parte das famílias se reunirá, ou numa casa de praia ou num pequeno sítio de sua propriedade. Um dia antes começam os preparativos para viagem. Sim, eu disse preparativos para a viagem, pois qualquer um dos dois lugares mencionados, sempre é afastado da cidade que moram.
Tudo pronto. Lá vão eles divididos em duas vans de luxo, dessas que fazem turismo. No início da viagem tudo é festa, mas logo começam os problemas... É verdade, começam os problemas. E é justamente quando entram na estrada e descobrem que todo mundo também resolveu passar o feriadão na mesma praia que eles.
Bem! Para se ter ideia e conhecer o tamanho do problema, uma viagem que normalmente é feita hora e meia, provavelmente vai levar de oito a dez horas. E levou.
Chegaram na casa de praia de madrugada. Logo constataram que o mato estava com metro e meio de altura e quase não dava para ver a casa nos fundos do terreno.
Deixaram os veículos do lado de fora, pois não tinha como colocá-los no interior. Afasta mato daqui, afasta mato da li conseguiram entrar na casa. Não tem luz nem água. Ajeitam-se de qualquer maneira pelo aposento iluminado por velas. Na verdade, um salão enorme onde os colchonetes foram estendidos para receber os vinte e oito afortunados. Depois de muita luta com os pernilongos dormiram, preocupados com a segurança dos veículos é claro.
Será que iriam arrombar algum deles? – Era o pensamento geral.
Pela manhã conferiram se as vans estavam intactas antes de começar a gincana.
Eram oito horas quando Júlio, o dono da casa, saiu à procura de um eletricista para resolver o problema da luz, logo um outro tentava ver se na cisterna tinha água suficiente para ser mandada para a caixa quando a energia fosse restabelecida. Enquanto outros três começavam a capinar o terreno, na tentativa de deixar o local mais habitável.
- Vou comprar leite, café e pão. Ouviram um terceiro se oferecer para realizar a tal façanha.
Chegou o eletricista. Após duas horas estava tudo funcionando. Mas descobriram que a água era pouca. Resolveram encomendar um caminhão pipa. E lá foi aquele que antes achou o eletricista, comprar a água.
- Gente... Já são quase onze horas da manhã e cadê o Henrique que não chega com o nosso desjejum? – Reclamou Geny, a sogra do dono da casa.
Por volta das duas horas da tarde chega Antenor com duas caixas de leite longa vida, meio quilo de café, trinta bisnagas, e dez quilos de carne para o churrasco de Sábado. Tinha conseguido efetuar essas compras depois de enfrentar uma fila durante três horas. Sem contar que para ir ao centro da cidade e voltar gastou duas horas no engarrafamento.
- Nosso café da manhã está garantido para hoje, amanhã e domingo. – Afiançou Henrique, cansado, mas cheio de orgulho por ter completado sua missão.
Nesse momento dona Geny perguntou.
- Quem vai fazer o almoço hoje?
Ninguém se manifestou.
- Vamos tomar esse café para ir a praia, na volta cuidamos do almoço.
Enquanto mulheres e crianças estavam na praia, os homens continuavam limpando o terreno e desalojando ainda mais os mosquitos. A noite seria promissora.
De repente chega à notícia: – Carlinhos, de cinco anos, uma das crianças havia desaparecido.
Para tudo. Angústia no ar. E todos vão para a praia a procura do garoto. Uma hora mais tarde, após um estresse danado encontram o menino distante 2 km de onde estavam, sentado na padaria da praça. Chorava mãe, chorava filho.
Os homens voltam à limpeza enquanto as mulheres preparam o almoço, diga-se jantar. As sete da noite tudo pronto, terreno limpo e comida feita, mas banho nem pensar, o caminhão com a água ainda não tinha chegado. Comeram assim mesmo.
A água chegou as nove da noite. Ligada as mangueiras do caminhão a cisterna, começa o abastecimento. Devido a vários furos na velha mangueira, quase cai mais água fora do que dentro. O terreno fica encharcado e o peso do caminhão abriu uma vala ao sair dele.
- Já podemos guardar os carro aqui dentro. – Sugeriu Jorge.
Assim fizeram, mas quando a segunda van entrou ficou atolada no lamaçal que se formara bem na entrada do terreno, impedindo dessa forma a saída da outra. Teriam que esperar secar tudo para depois retirar aquela van do atoleiro e liberar a outra. Pelo menos iriam dormir tranquilos naquela noite.
A quinta feira passou e ninguém curtiu direito. Dormiram quase meia noite depois de uma seresta desafinada. Outra briga com os mosquitos. Até defumador fizeram para tentar espantá-los, mais nada deu jeito.
A sexta feira amanheceu chuvosa e assim ficou o dia todo. Ninguém saiu naquele dia. Lavam a louça do dia anterior e já sujam tudo novamente, mas ninguém se preocupa em lavá-las.
Os oitos adolescentes, filhos dos casais em questão, tiveram a brilhante ideia de fazer uma festinha com os amigos que conheceram na vizinhança. Eram onze horas da noite quando começou o baile funk e se estendeu até as três da madrugada. Ninguém conseguiu dormir direito. Primeiro com o barulho depois com os mosquitos.
Acordaram quase meio dia e a maioria estava mal humorada e empolada com as mordidas das muriçocas. Tomaram o café da manhã reforçado e foram para a praia. As quatro da tarde voltaram.
- Não tem comida. – Lembrou Ester.
- Hoje é Sábado. Vamos comer no restaurante. – Sugeriu Margarida.
- Quem é que vai lavar a louça de ontem? Está todinha lá em cima da pia. – Perguntou dona Geny com ar sarcástico.
Mas uma vez ninguém se manifestou.
Não foi a toa que o Chico fez a música, “Joga bosta na Geny”. Ô velha nojenta. Pensou todas as mulheres da casa, ao mesmo tempo, menos sua filha. Afinal, mãe é mãe.
Resolveram deixar os carros e ir andando até ao restaurante, pois o terreno ainda estava muito molhado. Retornaram nove horas da noite. O ir e vir para o jantar levou quase cinco horas.
- Hoje não tem baile funk, festinha e nem seresta. O bate papo só até as onze e meia. Amanhã é Domingo...Vamos acordar cedo para ir a praia e aproveitar bem o final do feriadão. – Determinou Júlio, afinal a casa era dele e alguém precisava colocar ordem no recinto.
- Se não chover é claro. – Ponderou dona Geny.
Essa velha é mesmo uma jararaca. Desta vez todos tiveram esse pensamento. Menos já sabem quem, não é?
Logo, logo estavam dormindo. Acordaram cedo com o barulho das trovoadas. Chovia a cântaros. Era relâmpago pra todo lado. Assim deu duas horas da tarde e nada de melhorar. Sol? Era mais certo no Japão do que ali onde eles estavam.
- Gente esse tempo não vai melhorar. Vamos arruma as coisas e ir embora mais cedo, pelo menos não pegaremos a estrada engarrafada. – Falou Antenor.
Assim fizeram. Malas feitas e colocadas nos carros. Chegou à hora da partida. Contataram que o lamaçal havia piorado devido a forte chuva que ainda não tinha parado.
- Vamos desatolar o van do Geraldo, mas com cuidado para não piorar isso aqui mais ainda. – Recomendou Jorge.
Escorrega daqui, escorregada da li conseguiram tirar o pesado veículo, mas para desespero deles a outra também atolou naquele lugar. Esforço redobrado. Quase cinco horas da tarde quando todos se acomodaram nas vans para irem embora. Estavam todos molhados e enlameados. Os carros também, por fora e agora por dentro. Criança chorando, adolescente falando alto e mulher reclamando. O desespero era geral e piorou ainda mais quando entraram na estrada.
Lá estava o maldito engarrafamento novamente.
- Esqueceram a carne! – Lembrou dona Geny. – Vamos voltar! Insistiu ela.
Ninguém disse uma única palavra, mas se olhar queimasse dona Geny estava torrada.