O silêncio e a Liberdade - parte II

Silêncio e Liberdade percorrem o mundo em busca de seres que os valorizem e que onde possam viver tranquilamente. Está cada vez mais difícil. Numa de suas buscas os dois se encontraram numa dimensão que vai além de nosso pensamento pequeno e limitado. Num encontro de auras, energias em formas de corpos cheios de luz flutuam e torno dos dois. Por um momento se perde naquele reino.

– Posso sentir o que está pensando...

– Porque estamos aqui.

– Porque estamos vivendo o que está acontecendo.

– Saiu do controle. Tudo. Estamos sem ter o que fazer.

– Temos muita pouca influência nas ações realizadas atualmente.

– Muitos de nós se foram, grandes fontes de energia estão perdendo suas forças.

– Eu sei, nós mesmos não temos para onde ir.

Tempos se passaram com os dois naquele multiverso onde forças de todos os tipos se encontram e um canal paralelo foi aberto com a função de os mais infinitos seres poderem se encontrar e compartilhar sua sabedoria. Isso é para outra estória. (Rede social do futuro).

O mundo está passando por um processo de transformação e mudanças muito acelerados. Difícil acompanhar todos os avanços que surgem a cada dia. As pessoas estão focando cada vez mais suas atenções em prol do individualismo, da ambição e em outros valores superficiais, que comparados a outras forças, não são nada além de átomos e células se reproduzindo sem controle. Não se escuta mais a voz interna que cada um tem dentro de si, nem sabem que ela existe.

O Silêncio como uma forma superior mesmo sendo tão poderoso, não conseguiu que a humanidade tomasse outro rumo. Quando as primeiras pessoas começaram a explorar o planeta terra, tanto silêncio e principalmente liberdade ficaram entusiasmados. E após anos convivendo em harmonia foi que sem perceber as pessoas não estavam mais tão interessadas em ficar quietas, em escutar seu coração e agir com a intuição. Os peregrinos que adoravam a liberdade e o silêncio com suas longas caminhadas começaram a seguir seus caminhos sobre rodas velozes e ágeis.

Na primeira era dos homens onde a Liberdade era tão valorizada e Silêncio era tão admirado tudo ocorreu muito bem. Conseguiram seguidores fieis, que mais tarde se tornariam guerreiros da paz, a pequena resistência para lutar contra todos aqueles que não estão nem aí para nada. Que são um bando de gente sem noção do que fazem, vão acabar com tudo porque não tem nem ideia das consequências de seus atos.

Durante muito tempo eles lutaram e tentaram se unir a humanidade. Grandes esforços foram feitos por parte de ambos. Silêncio, que não suportava mais toda a algazarra e a sua falta que fazia para todas as pessoas foi se isolando cada vez mais, tentava ir há algum lugar onde poderia viver, mas estes lugares já não existiam mais, ele poderia estar em qualquer local do mundo em apenas um instante, e mesmo assim estava difícil. As pessoas da terra estavam concentradas em se expandir, novas tecnologias levaram informação onde apenas havia animais, plantas e pedras que viviam em plena harmonia. Até em pântanos e desertos começavam a chegar o que diziam que era progresso, máquinas de drenar sugavam tudo que tinha a sua frente, sua poluição sonora, visual e aérea eram insuportáveis, até seus operadores tinham que usar máscaras e roupas especiais para tentar comandar as enormes construções de metal. Silêncio não era mais bem-vindo.

Liberdade foi também ficando cada vez escassa, ela foi diminuindo até se tornar apenas um conceito do passado. Cidades inteiras foram destruídas vistas seu caráter libertino. A humanidade estava à beira de um colapso, só eles não sabiam disso. Alguns governos mundiais, entidades religiosas e pessoas poderosas comandavam a destruição. Guerras civis, tumultos e explosões dominavam o planeta, nos jornais só se falava nisso, toda revolta envolvida numa maléfica rede que dificilmente poderia ser desfeita. Liberdade se movia como o vento, muitas vezes rápida e feroz ela percorria grandes caminhos atrás de um lugar tranquilo, mas estava difícil, pois seus opressores aumentavam em muito seus devotos. Ela tentou se exilar numa das cidades mais pacatas que encontrou, pensava o que tinha acontecido, onde foi que ela errou, porque tudo estava se tornando doloroso para todos, nem Felicidade momentânea estava aparecendo mais, Paz então nem se fala, há muito tempo não se ouve falar dela, foi a primeira a partir. Liberdade não tinha mais para onde fugir.

Foi no alto de uma colina que eles se encontram pela última vez na terra. Através dos fortes ventos vindos do Sul que Liberdade chegou a seu destino, no alto podia-se ver um redemoinho acima da última rocha voltada para o norte. E com o chegar da noite foi Silêncio que foi se aproximando, aos poucos, pois esperava que liberdade se acalmasse e tudo ficasse tranquilo novamente.

– Finalmente encontramos um lugar onde possamos ficar algum tempo.

– Não se anime, não serás por muito tempo, logo os humanos chegarão com suas máquinas e quebrarão o que levamos milhares de anos para conseguir.

– Me recordo do tempo em que encontrávamos caminhantes indo de um lugar para outro, em seus corações nós vivíamos e éramos cultivados, eles adoravam os dias intermináveis, as longas jornadas, com nossa ajuda para eles o tempo era muito relativo, eles não o contavam, apenas o vivenciavam, um dia após o outro. Mesmo quando apareciam grandes caravanas em jornadas sem fim a maioria eram de pessoas de bem, que viviam suas vidas caminhando, livre e na maior parte sem preocupações com o mundo exterior.

– Sim, desde que paz se foi estamos cada vez piores, os andarilhos desapareceram, nem os grandes grupos aparecem mais, todos eles passam pelas novas estradas construídas e se isolam em suas máquinas de quatro rodas.

Durante algum tempo ficaram assim. As noites ficavam mais soturnas com silêncio se concentrando onde estava, outra hora liberdade se manifestava por suas rajadas de vento que iam até o alto dos céus, dando medo nos homens que estavam por perto e afugentando outros. Ficaram semanas meditando sobre suas eternas vidas.

– Não podemos viver aqui para sempre.

– Eu sei.

– Vamos buscar outro lugar, outra montanha mais alta.

– Acho difícil, a própria terra está revolta, as grandes pedras estão ruindo, nas florestas as árvores se agitam mais a cada dia que os homens se aproximam, nem o chão tremendo sob seus pés interrompe a marcha dos humanos em direção a seus objetivos nefastos. Já não aguento mais todo este tumulto em todo o lugar, onde quer que formos vai se assim.

– Como assim?

– Eles estão chegando, há muitos deles. Guerra já está por perto manipulando a alma de muitos que já há tem dentro de si, com ela rondando tem poder o suficiente para atingir muitos e conquistar vários guerreiros para seu exército. Fui informado por Angústia, apesar de ela se alimentar um pouco de tudo isso também não está feliz, e mesmo ficando um pouco melhor não está gostando de nada do que acontece há tempos em nosso mundo, ela está do nosso lado e diz para os homens ficarem em suas casas.

Liberdade e Silêncio se concentraram e viram um batalhão de homens vindo em direção a colina onde estavam. Eles teriam que passar por um pequeno bosque ao pé do morro, estavam armados com serras-elétricas e machados afiados, queriam a lenha, a água da nascente do pequeno riacho e pedras preciosas, queriam e destruíam tudo que estava a sua frente gritando e seguindo em passos firmes em direção ao alto. Numa manifestação rara de poder Silêncio ergueu-se e fez todos sentiram um pouco de sua aura. Todos os homens pararam de cantar e falar, simplesmente não conseguiam, ficaram uns olhando para os outros em desespero, suas vozes não saíam, também não conseguiam ouvir nem o maior barulho do seu lado. Ficaram amedrontados, mas teimosos do jeito que são foram em frente, caminhando mais lentamente, um olhando para cara dos outros e apontando a direção, parece que estavam vivos e conseguiam caminhar. Não foi por muito tempo que ficaram neste estado, agora era Liberdade que os atacou. De repente o chapéu do principal homem no comando voou, e em poucos segundos quando ele se abaixou para pegar já via outros homens lutando contra pequenas rajadas de vento vindas diretamente na direção do grupo. Os poucos que ficaram após a primeira investida agora tinham muita dificuldade para seguir em frente. O clima estava cada vez pior, vários não resistiram e se deixaram levar pela ventania que os carregou até a entrada da pequena floresta. O principal homem, um ser de grande estatura e peso foi o último a deixar a expedição, ainda olhou para o alto e sentiu algo estranho, como se tivesse vida lá cima e que tudo que tinha acontecido foi para deixar lá em paz.

– A paz se foi há muito tempo, até eu sei disso – Disse isso para si mesmo e jurou em voz alta que voltaria para destruir aquele lugar amaldiçoado.

Após isso o mais forte de todos os ventos o jogou para longe, neste curto caminho que estava sendo arremessado, primeiro suas pesadas botas saíram do chão, em seguida seu corpo flutuou levemente, deu tempo de ele mexer seus braços até que foi jogado com força na direção de uma grande árvore. Ele sentiu alguma coisa, não sabia o que, mas sentiu, não queria admitir isso e não contou para ninguém.

– Parece que nos demos bem nessa.

– Não se anime, eles voltarão, você viu a expressão do último homem, não viu?

– Sei que voltarão, não temos mais para onde ir, estamos mais fracos devido aos nossos últimos esforços.

– Sei para onde iremos, não é o lugar mais bonito, está bem longe dos humanos, até daqueles poucos que ainda gostamos.

– Onde?

– O planeta nos abandonou, os homens não creem mais na liberdade, não sabem há muito o que é ficar quietos consigo mesmo e ouvir seus corações. Vamos embora daqui. Vamos subir aos céus, juntos conseguiremos, vamos ver a humanidade de longe.

– Sim, vamos reunir nossas últimas forças.

– Adeus planeta Terra, adeus humanos, por gerações vocês foram livres e conseguiram viver em silêncio e acima de tudo em paz. Após anos de luta vocês acham que ganharam, mas na verdade perdem e muito com nossa ausência.

– Pobres, não durarão muito.

– Sinto pena deles.

– Sinto tristeza por eles.

– Adeus.

– Adeus.

Foi numa noite onde cerca de cem dos melhores homens se reuniram com máquinas de última tecnologia vindas da capital, armas a lazer, escavadeiras com pontas de uma liga muito resistente de metal que perfuravam todo tipo de matéria em seu caminho. Os homens estavam mais firmes em seus passos, o comandante da destruição anterior comandava a investida, era uma pessoa de ações frias e cruéis. Ele representava muito bem todos aqueles homens. Todos estavam indo a aquele lugar e acabar de uma vez por todas o que começaram. Aos poucos os passos foram se tornando mais cautelosos, olhavam ao redor e começaram a sentir algumas mudanças, miraram o Norte e viram uma escuridão tomar conta do local, redemoinhos de vento subiam com força até as grandes nuvens, chegaram a parar e observar tudo que havia na montanha a sua frente. Ficaram vários minutos olhando o que estava acontecendo. - Será isso um preparo para a batalha que está por vir? - Não. Pois não havia nenhum sinal de que tudo o que estava acontecendo lá em cima chegaria até eles. As máquinas foram desligadas e por um breve momento eles ficaram em silêncio por vontade própria. Observando o céu mudar de tom e sentindo o ar ficando mais denso. Logo em seguida tudo parou instantaneamente. Ninguém comentou nada, só se olharam e viram que não haveria batalha alguma. Aqueles homens foram os únicos dos humanos que presenciaram o poder de seres mais complexos que nós. Naquele dia eles desligaram as máquinas. Com apenas um aceno do superior no comando eles deram meia volta e começaram a se retirar, depois do último soldado virar as costas aquele que já tinha participado de muitas batalhas fincou os olhos no cume da montanha, os movimentos estranhos começavam a desaparecer, ele deu um pequeno sorriso, fazia muitos anos que não tinha essa expressão em seu rosto. Ele foi o único ser que realmente soube o que aconteceu, não sabia o porquê daquilo, no entanto aquele episódio iria o marcar para sempre em toda sua vida. Ninguém falou nada e cada um interpretou de uma forma única e totalmente pessoal.

– O mundo está tomado em definitivo pelos seres de má índole, o mal está vencendo e através do coração mais suscetível dos humanos, eles próprios sem se darem conta, abaixaram a guarda e deixaram que pequenas ambições se tornassem objetivos primários e para isso se aliaram a quem não deviam. Conseguiram o que queriam no início e quando forem enxergar a realidade, já será tarde demais. O preço de tudo isso será o fim deles.

Como tinham previstos alguns loucos & sábios há muito tempo atrás. Haveria de chegar uma hora em que graciosa liberdade pereceria e o grande poder do silêncio sumiria para todo o sempre enquanto os humanos não soubessem conviver em harmonia entre eles e entre todos os serem vivos e energias que habitam a nossa linha no espaço.

Se enganara eles que Silêncio e Liberdade sumiriam em definitivo. Eles subiram aos céus, vivem entre as estrelas e percorrem o Universo em busca de Paz.

E até hoje, quando sem dizer nenhuma palavra, se olha para céu, percorre a visão entre todas as estrelas. Para aqueles que conseguem unir estes dois elementos, poder senti-los dentro de si, isso faz brilhar um fogo em seu coração que vai te ajudar a seguir em frente, a compreender um pouco mais de tudo do que acontece a sua volta. Silêncio e Liberdade te ajudam a escolher o caminho certo, a fazer a escolha correta. Enquanto pessoas por pouco que fizerem continuarem nesta busca, além de ajudar a si mesmas, estão ajudando os próprios poderes do Universo. Pois Paz ainda está muito longe, nem vista ela é, muito menos conquistada, vamos unir nossas forças para que ela reine novamente como já foi há tempos atrás.

Pedro de Alcântara
Enviado por Pedro de Alcântara em 11/05/2019
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