Contos de Mochilão II - O P2 e o Católico

Assim que o carro parou, Júlia correu até a janela e conversou com o motorista. Eu, feliz e aliviado, peguei minha mochila e fui atrás. Quando cheguei ela já estava sentando no banco da frente. Dei boa tarde e já fui me jogando esbaforido no banco de trás. Confirmada a direção, fechamos as portas, o carro começou a arrancar. Pouquíssimos metros percorridos, Júlia abre a porta e se joga para fora do automóvel em movimento.

- Pedro, ele tá armado!

No susto, tentei raciocionar o que acontecia.

- Claro, tá cheio de bandido nessa estrada - o homem retruca com impaciência. - Se quiser pode descer.

Reparo em sua feição, rugosa e mal-encarada, com a visível arrogância de quem não fazia questão alguma de esclarecer a situação. "Só pode ser civil", penso.

- Você é policial? - indago.

- Sou - ele diz, como se fosse óbvio.

- Pedro, eu nao quero ir com ele - Júlia diz decidida.

- Olha, eu também prefiro descer. Boa viagem - digo eu.

Acredito que qualquer bandido seria mais simpático.

Voltamos à estaca zero, mas não ficamos nela por muito tempo. Passados poucos minutos um caminhão parou e seguimos viagem. Dessa vez um religioso, católico, bem simpático. Ele tinha por dentro do para-brisa umas três Aparecidas, ao lado de várias fitinhas coloridas daquelas que católicos usam pra fazer promessas. Achei uma bonita decoração. Falamos sobre nossas vidas, nossas famílias, uma série de questionamentos padrão de quem dá carona e tá afim de conversar. Além de passar o tempo também serve pra descobrir disfarçadamente quem são os estranhos que se acaba de pôr na boleia.

Nessas idas e vindas já ouvi centenas de histórias. A maioria nem me lembro mais, mas uma coisa é certa: nenhuma é igual a outra. Quando se entra no carro de um desconhecido pra viajar com ele por alguns minutos, ou horas, é necessário estar de mente aberta. Estoura-se uma bolha social e gira-se uma roleta completamente aleatória. No mundo real, ou você aprende a lidar com as diferenças ou, provavelmente, você não fará diferença alguma.

Dougg Ribeiro
Enviado por Dougg Ribeiro em 30/04/2019
Código do texto: T6635551
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