A Floresta das Vozes

Chovia na manhã de sábado na floresta das vozes. A neblina branca acinzentada impedia o cavaleiro a regressar ao castelo, mas mesmo assim, com uma capa de chuva feita de couro, continuava a cavalgar pela trilha, que quase não se dava para ver, a não ser se forçasse a vista.

Aos poucos, o cavaleiro percebeu que a floresta das vozes não tinha esse nome em vão. No meio dos sons das gotas de chuva que batiam na capa, ele ouvia sussurros. Pareciam que via de sua mente, ouvia ao lado de sua orelha e encima de sua cabeça, mas não via quem emitia.

Já tinha escutado várias histórias sobre a floresta das vozes, diziam que as pessoas enlouqueciam, outras que levavam para a morte, mas o bravo cavaleiro era inabalável. Continuou espourear o seu cavalo, que de início pareceu não ouvir as vozes, mas após algum tempo, o cavalo começou a balançar a cabeça e coicear o vento.

-Calma rapaz!-disse o cavaleiro passando a não no pescoço do animal, mas pareceu piorar, o cavalo começou a pular e pular, o cavaleiro acabou perdendo sua capa e caiu do cavalo, dando de cara na lama da trilha, enquanto o pobre cavalo, saiu em disparada na direção das árvores.

O cavaleiro todo sujo de lama, não se acanhou da chuva, ficou no meio da trilha até suas vestes ficarem regularmente limpas. Sua armadura se fora com o cavalo, mas ainda restava a capa que achou e sua espada. Correu para debaixo de uma árvore, não protegia tanto mas era melhor do que a chuva.

Os sussuros tinham parado, como se quisessem que perdesse o cavalo. A neblina ainda continuava opaca, tinha que fazer um esforço para ver a árvore na sua frente, a chuva parecia aumentar e a água parecia alagar a estrada, estava sentindo a água cobrir suas botas.

Se afastando um pouco mais da trilha e contando as árvores que encotava, o cavaleiro então começa a ouvir novamente os sussuros. Agora preciam mais nítidos, "por aqui", "venha", "está no caminho".

-Estão tentando me enganar!-gritou o cavaleiro, seu grito abafado pela chuva irritou as vozes, que agora gritavam na sua cabeça:

-Aqui!-um voz gritava atrás do cavaleiro

-Não! Não tem!-respondia

-Me ajuda!-ouviu a voz de uma criança

-Não vou!-gritou o cavaleiro

-Aqui

-Mentira!

-Sua honra

-Para!

-Glória

-Para!

-Não vai escapar

-Cala a boca!

-De mim

-Chega!- gritou o cavaleiro, dessa vez ainda mais alto e pegou sua espada- Venham! Demônios! Venham provar da lâmina da minha espada! Venham!-suas palavras somente eram respondidas pelo barulho da chuva e nada mais.

Com frio, molhado e sem nada para poder sobreviver a noite, o cavaleiro se desespera. Se enrola nas folhas e lamas, na tentativa de reter o calor. A chuva já tinha parado, a neblina ainda estava ao redor.

A lama era fria, ia demorar pra secar, o tempo ainda estava úmido. Ficou uns instantes deitado, pedindo para que os deuses o protegessem, mas nada adiantava, a lama não aquecia. O cavaleiro começou a chorar, a fome doia tanto quando o gelar da noite. Rolava de dor pelo chão úmido e congelante. E num último ato de misericórdia, ele gritou:

-Onde vocês estão!?-não se ouviu nada- Me ajude!-gritou outra vez, mas nada ele ouviu e denovo gritou:

-Aqui, porfa!...vor- seu grito de socorro mais forte se transformou em um sussurro, estava ficando roco de tanto chamar por ajuda, deitou-se no chão e viu que era o fim e que se tornaria parte daquelas árvores e sua voz mais uma que assombra a floresta das vozes.

Hoganes Molva
Enviado por Hoganes Molva em 13/03/2019
Reeditado em 13/03/2019
Código do texto: T6596649
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