A acolhida
Quando o ônibus de turismo chegou, trazendo alunos de ensino médio do vizinho vilarejo de Harthford para a visita guiada ao museu de História Natural de Kinbrough, a primeira coisa que Jay Marshall notou é que havia uma garota diferente no grupo. Ela se destacava das colegas como uma rosa num campo de margaridas, ou algum outro clichê do gênero. Não que não houvessem outras garotas bonitas na turma de adolescentes de Harthford, mas ela era a única hispânica; a pele oliva, os cabelos e olhos negros, deixavam isso bem evidente. Uma garota alegre, ele percebeu, enquanto ela ria com as colegas, aguardando o início da apresentação.
- E o que você vai fazer, Graciela? - Perguntou uma das adolescentes louras que a rodeavam.
- Não vou fazer nada! - Redarguiu ela, erguendo as mãos e dando um sorriso luminoso para as amigas.
Graciela. Então esse era o nome, pensou Jay. Afastou-se discretamente, deu uma volta pelo estacionamento e abordou o grupo pelo outro lado, como se estivesse vindo da administração do museu.
- Tem alguma Graciela aqui? - Indagou.
- Graciela sou eu - respondeu a morena, colocando a mão no peito. - Algum problema?
- Jay Marshall, do Grêmio Estudantil Hispânico de Kinbrough - apresentou-se ele, estendendo a mão. - Posso falar um minuto com você sobre o nosso trabalho... em particular?
As colegas de Graciela entreolharam-se e começaram a rir, um tanto nervosamente, avaliou Jay. A própria interpelada parecia surpresa, e hesitou em apertar a mão estendida.
- Em particular... onde? - Indagou ela com suspeição.
- Na recepção do museu - declarou ele, após soltar a mão dela. - É um lugar público, há bastante gente...
Graciela olhou para as colegas. Algumas deram de ombros, e a que parecia a líder do grupo, comentou:
- Não demore, Graciela, ou vai perder a apresentação.
- Tá bem - respondeu a garota. E dirigindo um olhar confiante para Jay, acrescentou:
- Vamos!
Caminharam em silêncio até a recepção do museu que, como ele dissera, apresentava um fluxo constante de gente indo e vindo. Jay localizou um banco vazio, junto à uma das colunas que sustentavam a cúpula do edifício, e sentaram-se lado a lado. Graciela lançou um olhar divertido para Jay.
- Grêmio Estudantil Hispânico de Kinbrough... ¿en serio, muchacho?
Pego na mentira, Jay começou a rir.
- Se eu dissesse Grêmio Estudantil Afro-americano, você me seguiria?
- Provavelmente não - admitiu Graciela, ficando subitamente séria. - Você mora aqui, em Kinbrough?
- Sim. E estudo no colégio William J. Jefferson.
- Mas afinal, por que queria falar comigo, Jay? Além do fato de que, tecnicamente, somos ambos não-brancos?
- Bom... isso me chamou a atenção realmente. Até onde eu saiba, não há... não-brancos... vivendo em Harthford. E você é muito bonita, também.
- Ah... grata - respondeu ela, subitamente tímida, baixando os olhos.
Ergueu o rosto e o encarou com determinação.
- Eu não nasci em Harthford; na verdade, fui adotada aos 12 anos por uma família que reside na cidade, os Hendersons.
- Desculpe... não quis ser invasivo. Deve ser muito especial, para a terem adotado nesta idade. Geralmente, casais querem crianças pequenas e...
Parou de falar.
- E da sua própria etnia? - Complementou ela com um sorriso. - É, eu sei. Mas os meus pais adotivos pensam diferente. Segundo eles costumam dizer, estava na hora de dar um pouco de diversidade à Harthford.
- Você não se sente solitária, Graciela? - Arriscou Jay.
A garota olhou em torno, enquanto o fluxo de passantes continuava.
- Muito... às vezes.
Voltou a encará-lo.
- Você tem AIM? - Indagou.
- O Messenger da AOL? Sim, tenho.
Ela rasgou um pedaço de um folheto do museu e escreveu algo à caneta.
- Esse é o meu nome de usuário no AIM... me adiciona e me procura lá hoje à noite, por volta das 21 h!
- Tá bom! - Respondeu Jay, feliz da vida, guardando o papel no bolso.
- Agora eu tenho que ir... - declarou ela, erguendo-se. - Ou vão vir me buscar...
Antes que ele pudesse dizer mais alguma coisa, ela saiu apressada, rumo ao estacionamento.
- [Continua em "A porta se abre"]
- [08-12-2018]