PREAMBULO
   No tempo do cangaço à violência era tanto quanto o é agora, o cangaceiro vivia com medo e para sobreviver tinham de gritar que eram mais bravos, mais ruins e para ratificar esta fama de mau matava insdscriminadamente apenas para manter esta fama , matavam velhos mulheres e crianças, às vezes apenas olhavam alguém e dizia cabra não fui com tua cara vou te sangrar e fazia isto sangrava tirando a vida de alguém que nunca tinha lhe feito mal algum. Tem um cabra que eles chamavam de Lampião cujo nome era Virgulino e aqui é parodiado por um Trovador meio pancada que cismou de ser o Trovulino, espero que alguns amigos que puderem, acompanhem o relato que é só mais um causo.

                           TROVULINO 01

     Um rapaz trabalhador, cabra ordeiro, diferente dos irmãos e do pai que não eram flor para se cheirar. Morava num pequeno e pobre arraial, e era casada com Juversina, morena destas que só tem no nordeste, queimada de sol, com um jeitinho abusado que só enganava seu marido, homem pacato e que não fazia muita questão de saber se a água estava correndo para baixo ou subia a corredeira. Claro que existem muitas histórias sobre o lendário Trovulino. Cada uma mais cavernosa do que a outra, existem também causos cômicos, inventados pelo pessoal do campo em volta das fogueiras em noites de forró. Quando se juntam para conversarem e descansar os pés do levanta poeira, que mais que uma dança, é um esporte que exige um preparo físico de dar inveja a qualquer desportista dos mais completos e capacitados. Param, contam alguns causos caboclos e voltam a dançar.

     Nestas rodas e também em velórios regados a cachaça é que surgem os contos mais divertidos e claro. Hoje é que se arriscam os piadistas a inventarem tais histórias, no tempo que Capitão Trovulino era vivo quem se aventurasse a estes arroubos de valentia só vivia até encontrar algum cangaceiro, mesmo um que nunca tivesse visto Trovulino, ele estava mortinho da silva, o cabra matava e se justificava: - “Não aceito zombaria para cima do capitão, que é cabra valente e se  ele aparecesse aqui, o caboclo morria de medo e nem precisava gastar bala." Pura verdade, eu mesmo... Estou contando porque sei que ele está em alguma parte do inferno, ou quem sabe, com a ajuda de um santo do sertão, “tinha de monte”! Ele possa até estar por perto do céu ou no limbo esperando uma chance de nascer de novo. Se é que não está encarnado no lombo daquele camarada lá dos States, que está dando tiros nos iraquianos e só fala em brigar e obrigar aos outros a se curvarem a ele, pode até não ter nada a ver, mas o cara é ruim de mais companheiro!

     Voltando a vaca fria, este era o nosso herói. Antes dele se tornar tristemente famoso, morava numa casinha de taipa, até grande para quem não tinha filhos, ficava na saída do povoado que contava com quarenta casas, se muito. Perto da sua morada, tinha apenas a venda do português que era amante da fogosa mulher de Trovulino, e facilitava para ela alguns babiláques, tipo água de cheiro, sabonete, que ficava por conta de Juversina ser madrinha de um dos muitos portuguesinhos espalhados nas redondezas. Trovulino não queria desconfiar de nada, é... Porque querendo, era só ele abrir os olhos, pois todo mundo sabia, até a parentagem do Trovulino, mas entre saber e contar sem uma prova contundente, era um risco que, mesmo sendo parente, ninguém se permitia correr. A razão era simples, porque naqueles tempos matava-se em nome da honra e não se brincava com as coisas que poderiam provocá-la, pois, nestes entreveros sobravam mortes para todos os envolvidos, muitas vezes iniciando-se uma guerra entre as famílias. Por isto, como quem fica sabendo por ultimo é o corno, o marido dormia tranqüilo o sono dos que não devem ou nada tem a cobrar. Eram as máximas funcionando: “O raio não me atingiu por que vou sentir o choque?” - “O que os olhos não vêm o coração não sente!”

     Era uma manhã de terça-feira e Trovulino saíra com o raiar do dia de um sol que já nascia quente no sertão e caminhara para sua lavoura de mandioca já com um ano e meio, no ponto de ser colhida para a farinhada. Era ele sair e Juversina se aboletava em cima de uma pedra em forma de mesa não muito alta, que ficava na frente da casa, como a desafiar o dono e quem quisesse tentar quebrá-la. Ali ela ficava penteando os cabelos na cor negro e cortados um pouco abaixo dos ombros, mais para tesar o português, que abria a venda bem cedo sabendo que não apareceria nenhum freguês e a única razão, era a endiabrada mulher do Trovulino, que sabia como mexer com os brios do portuga e com as outras partes mais ainda. Ele ficava elétrico e perdia o bom senso, logo sinalizando para a libidinosa morena para se achegar até a venda, onde ele lhe dava um mimo. Às vezes uma bala doce e outras, quando ele queria um agradecimento maior abria mão de um vidrinho de água de cheiro, deixando-a escolher o perfume mais ao seu gosto.

     Neste dia a safadeza já estava armada, mas, antes que o portuga fizesse o já esperado sinal, mudou o cenário: surgiu um cavaleiro vestido como caubói americano: cavalo branco de patas negras, arreios com debrue de prata bem polida e brilhando ao sol, ofuscando os olhos da fogosa morena que ficou logo interessada no chegante, um vistoso viajante de semblante moreno e sorriso desavergonhado, que lhe dava a certeza do seu sucesso com todas as mulheres que olhava. Como garantia da sua segurança e charme, trazia um olho de lobo guará esquerdo seco, e que ele mesmo caçara e mandara benzer no terreiro de sua madrinha macumbeira afamada nas redondezas. Para ele não precisou nem do pagamento costumeiro do litro de vinho catuaba, que ele fez questão de levar assim mesmo e dizer que era presente. “Diziam que quem tinha o olho de lobo era o dono das mulheres do mundo”. A indumentária completava o conjunto: calça de brim sanforizado, camisa de seda escarlate, lenço amarelo ao pescoço, chapéu preto de couro de lebre quebrado na testa, dois revólveres negros colt cavalinho e cabos nacarados brancos, e na cela um coldre com uma, papo amarelo. “Famoso rifle de vinte e dois tiros que, no nordeste, perdia a marca de fábrica e virava a temida, papo amarelo”, usada pelos jagunços de fazendeiros, os macacos, “designação dos policiais das volantes formadas para perseguir os cangaceiros,” que também portavam este tipo de arma. Tudo nele indicava ser um pistoleiro cheio de manhas e que trabalhavam por conta própria, alugando-se para coronéis que lhes pagavam para eliminar desafetos políticos e seus outros inimigos. Esta era uma prática muito acentuada nos tempos do coronelismo, que mandavam e desmandavam nos sertões... Acho que até hoje ainda existem tais sortilégios.

     Quando passou pela morena de pele aveludada, bundinha arrebitada, já encontrou o olhar dela praticamente tirando toda a roupa dele e deixando o bonitão pelado pronto para ser comido. Quando ela sentiu o olhar do pistoleiro em cima dela, levantou-se da pedra. Manteve os cabelos passando por cima do ombro, seguros com uma mão, enquanto a outra manejava o pente, ao mesmo tempo armava um semblante na carinha safada fingindo estar envergonhada, mas sem desviar nenhum instante o olhar do sacana. O rapaz, “perfeito cafajeste”. Já se sentindo dono da situação, deu o golpe de misericórdia quando, como o mais perfeito cavalheiro, segurou a aba do chapéu inclinando a cabeça num gesto estudado, até na tonalidade da voz que era grave, mas clara, e não feria os ouvidos, quase que hipnotizando o ouvinte. – “Bom dia, jovem e linda senhorita.” - Isto era um convite a uma resposta, e ele sabia que ela viria. Conhecia muito bem as mulheres, tendo sido criado no meio de prostitutas e amigas de sua mãe que era dona de um bordel, cedo ele já aprendera a conhecer as manhas femininas e treinar qual a melhor maneira de tirar delas tudo o que precisava ou tudo que ele queria.

     A vida na cidade média, com mais de três mil habitantes e com grande movimentação de cacau, lidando com todas as espécies de freqüentadores da zona de meretrícios, que sempre recebem nome engraçado como esta que se chamava: “Fogo na Tarraquêta”, deu a Serafim a malandragem e coragem para ser um fora da lei, cometendo seu primeiro assassinato aos treze anos de idade, para roubar um bêbado que ele seguira quando viu a boa quantia de notas que o sujeito transportava. Bom conhecedor dos meandros das ruas, na esquina de uma rua estreita permaneceu de atalaia e enfiou um punhal de dez polegadas nas costas do individuo, que morreu sem nem gritar quando a lamina perfurou seu coração. Desta data em diante foi se aperfeiçoando, e logo atingiu a marca de dezoito mortes, que o tornava um bom pistoleiro com fama de seguro, corajoso e confiável e que não falhava nunca.
Trovador das Alterosas
Enviado por Trovador das Alterosas em 02/12/2018
Reeditado em 02/12/2018
Código do texto: T6517131
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