O preço da satisfação
O general examinou as contas que a esposa acabara de trazer e arregalou os olhos.
- Peggy! O que é que eu lhe disse sobre moderar nas despesas? Estamos na América, não na corte de Sua Majestade! Onde vai usar todos esses caríssimos vestidos de seda francesa?
A jovem esposa inclinou-se sobre o marido de têmporas grisalhas e beijou-lhe o rosto.
- Meu amor! Você se casou com uma Shippen, membro de uma das mais importantes famílias de Filadélfia. O que queria que eu vestisse? Trapos?
O general suspirou.
- Certo, não quero que vista trapos, mas deve convir que meus rendimentos como general não estão sendo suficientes para cobrir nossos gastos, que têm sido crescentes. Festas, banquetes, vestidos... e nada disso me rendeu sequer uma mísera promoção, enquanto outros, que nada mereceriam, são adulados e ascendem na hierarquia.
Peggy abraçou pelas costas o marido, que estava sentado à mesa da sala de jantar, encostando o rosto no dele.
- Washington te traiu... você tudo fez para ajudá-lo, foi ferido duas vezes em combate... e aquele egocêntrico simplesmente virou-lhe as costas. Você tem toda a razão: estão lhe preterindo nas promoções.
- Eu sei - retrucou o general, juntando os papéis sobre a mesa - e me irrito profundamente toda vez que penso no assunto. Mas isso em nada contribui para resolver o nosso problema financeiro. Estamos com dívidas, muitas dívidas.
Peggy soltou o marido e sentou-se ao lado dele na mesa. Encarou-o, muito séria.
- Posso lhe dar uma sugestão?
- Sou todo ouvidos.
- Lembra-se do major André?
- Refere-se ao inglês que andou arrastando uma asa para o seu lado, antes de nos casarmos? - Indagou o general, sobrolhos erguidos. Peggy mordeu os lábios.
- Bem... sim, esse André. E não, ele não arrastou a asa para o meu lado. É apenas um cavalheiro e trata bem todas as damas, indistintamente.
O general apenas balançou a cabeça, em atitude de expectativa.
- O major, como deve saber, é o chefe da espionagem britânica - prosseguiu Peggy. - E se você... repassasse para ele alguns segredos militares, em troca de um bom pagamento?
O general ficou estático.
- Esse país não tem futuro, meu amor. Sei como se sente, como soldado leal que é, - insistiu Peggy - mas o melhor que poderemos fazer, é tentar conseguir uma compensação justa pelo seu sacrifício, enquanto você ainda detém algum poder, e partirmos em definitivo para a Inglaterra!
O general olhou para o teto, como que considerando a ideia. Depois, encarou a esposa.
- Partindo do princípio de que eu estivesse disposto a conversar com esse André sobre mudar de lado, como faria para encontrá-lo?
- Bem... como eu o conheço, poderia atuar como intermediária entre vocês.
O general ergueu um sobrolho.
- Não sei se gosto muito desta última parte.
- Você pode mandar outra pessoa de sua confiança, se desejar - concedeu Peggy, erguendo-se e dando-lhe outro beijo no rosto antes de sair.
Novamente só, o general encarou as contas sobre a mesa. Que preço os ingleses pagariam por sua defecção?
Precisava descobrir, decidiu-se.
- [07-10-2018]