JUSTIÇA ACIMA DA LEI
JUSTIÇA ACIMA DA LEI
CAPITULO I
SETEMBRO DE 1998
CHEGADA A PORTO VELHO
A tarde caía, quando o Senhor Branda e esposa chegaram à pequena cidade oceânica de Porto Velho. Dirigia o carro o Sr. Alexandre Masoc. Ao seu lado, estava o Senhor Branda e Mada, sua esposa que ocupava o banco traseiro.
O asfalto era em dupla pista. Uma enorme rede elétrica, de alta e baixa tensão, margeava a estrada. O fluxo de caminhões e carretas era intenso.
O Sr. Alexandre Masoc parou o carro em um bolicho. A beira da estrada, um alpendre antecipava o pequeno comércio. Para acessá-lo, havia três degraus; na porta, havia diversas propagandas coladas; um pequeno degrau diferenciava o nível entre o alpendre e o prédio comercial.
O Sr. Masoc adentrou e solicitou informações ao bolicheiro.
- Boa tarde Senhor! – disse Alexandre. - Por favor, como podemos chegar à Pesca Oceânica.
O homem, de aparência humilde e feições fortes, informou:
- Fica no final da estrada, não tem como errar, é um prédio alto com vidraças verdes.
Agradeceu e retornou ao carro. Ao final da rua, como havia informado o bolicheiro, surgiu um imponente edifício de três andares, tipo cristaleira, ostentando vidraças verdes.
Alexandre estacionou o carro, era o final da tarde, desceu, contornou-o e abriu a porta para o Senhor Branda, que desceu e abriu a porta de trás para a Senhora Branda descer.
O Senhor Branda, homem alto, com os seus 58 anos fazia uma bela figura aristocrática, mais se parecendo com um lorde inglês. Cabelos castanho-claros, barba e bigode, com cerca de dez milímetros de comprimento, naturalmente brancos com óculos de grau de grande tamanho, que escondiam os olhos azuis. Como era início de primavera, ainda fazia frio. Vestia um casaco xadrez, camisa azul-clara, gravata em tom azul-escuro. Sobre a cabeça tinha um chapéu de feltro preto, de abas curtas, com uma pequena pena branca na lateral direita da fita, que contornava o domo. Madalena Branda (Mada), como carinhosamente lhe chamava o Senhor Branda, era uma jovem senhora, cabelos escuros, olhos verdes, lábios grossos, com um metro e setenta e seis, uma bela figura de mulher, vestindo um traje preto sobre uma capa branca.
Adentraram no estabelecimento, após subir três amplos degraus de mármore e abriram a grande porta de aço, com afrescos em bronze e latão. Foram recepcionados por uma moça muito esbelta, que se apresentou como sendo a secretária executiva do Sr. Renato Corso, diretor presidente do Grupo Pesca Oceânica S/A.
O Senhor Branda se apresentou:
- Sou o Ricardo Branda, oceanógrafo. Esta é minha esposa, Madalena Branda, e este é meu amigo, parceiro e motorista, professor Alexandre Masoc.
A secretária fez uma mesura a cada apresentação e informou que o Sr. Renato Corso os aguardava, e que a seguissem até o seu escritório. Bateu à porta, antes de abri-la, e convidou-os a adentrar. Sentado, diante de uma sofisticada mesa de trabalho, estava o Sr. Renato Corso, que, ao vê-los, se levantou. Era um homem de poderosa compleição, peito amplo, ombros largos, ligeiramente gordo. O sólido pescoço sustentava uma cabeça admiravelmente bem formada, os cabelos eram escuros e crespos, feições fortemente pronunciadas, simpático, esboçava um amplo sorriso, que ressaltava o canino direito, que ligeiramente se adiantava dos demais dentes perfeitos e alvos. Vestindo uma fatiota cinza, camisa branca e gravata estampada, cumprimentou, inicialmente, o Sr. Ricardo Branda dizendo:
- Que imensa satisfação conhecê-lo, professor Branda. Não é sempre que temos um oceanógrafo famoso interessado em formar uma parceria científica com a nossa empresa.
O Senhor Branda respondeu:
- A satisfação é toda minha, Sr. Renato Corso. Espero que seja profícua a nossa parceria. Esta é Madalena, minha esposa, e este é meu amigo e parceiro, Sr. Alexandre Masoc.
O Sr. Renato, quando cumprimentou Madalena, quase desabou. Pálido foi logo dizendo:
- Desculpe, mas sua esposa tem uma enorme semelhança com minha falecida esposa, Margarita. Por um momento, parecia que estava na presença dela.
O Senhor Branda disse:
- Acho que sua falecida esposa era muito bonita; as mulheres bonitas todas se parecem.
- Não, Senhor Branda, sua esposa realmente é muito parecida com Margarita. Se fossem irmãs, não se pareceriam tanto.
Houve uma pausa, olhares se entrelaçaram, com grande habilidade o Sr. Renato Corso, quebrando o silêncio, disse:
- Os senhores devem estar cansados da viagem, deixaremos os negócios para amanhã. A companhia tem um hotel neste mesmo prédio, no lado norte. Márcia (a secretária executiva do Sr. Renato Corso) lhes acompanhará até o hotel.
O hotel era pequeno, tinha dez apartamentos e duas suítes. O Sr. Alexandre ocupou um dos apartamentos, e o Senhor Branda e esposa ocuparam uma suíte. Após um gostoso e demorado banho, com água quente encanada, Alexandre desceu ao bar e restaurante. Como sabia dos gostos do Senhor Branda e de Mada, determinou que o “barman” preparasse um drinque de vodka com suco de abacaxi e, para ele, apenas um refrigerante sabor cola. Puxando conversa com o “barman,” perguntou qual era o seu nome e se trabalhava no hotel há muito tempo, ao que respondeu que já estava há dez anos naquele mister, e que seu nome era Pedro Elias de Assis.
- Eu sou Alexandre Masoc, secretário do Senhor Branda, que é um oceanógrafo, que irá desenvolver um estudo sobre cadeia alimentar dos peixes desta região.
Fale-me sobre a Pesca Oceânica, Sr. Pedro Elias?- argüiu Alexandre.
- A Pesca Oceânica é uma empresa familiar. O Sr. Renato Corso a herdou de seu pai, que a herdou de seu avô. A empresa possui diversas fábricas em todo o país e é voltada para a exportação de peixes enlatados e congelados.
Nesse momento, chega o Senhor Branda e Mada. O Senhor Branda diz:
- Como é, Alexandre, o meu drinque está servido?
- Sim, e está no cálice.
Não e necessário dizer que os dois se conheciam demasiadamente bem. Alexandre apresentou o Senhor Branda e Mada ao “barman” e lhes disse que ele estava lhe contando sobre a Pesca Oceânica. Como o interesse era comum aos três, solicitou ao Pedro Elias que continuasse a sua narrativa. Pedro disse:
- O que sei sobre a empresa é que se trata de um grupo muito forte e que é dirigido pelo braço de ferro do Sr. Renato Corso, que, após o falecimento de sua esposa, em 1990, se dedicou de corpo e alma ao trabalho. Após haver assumido a presidência da empresa, esta dobrou de tamanho. Para tanto, o Sr. Renato trabalha das 5 horas da manhã ate, às vezes, às 21 horas da noite. No entanto, viaja com freqüência ao exterior, se afastando da empresa por, mais ou menos, quinze dias, a cada três meses. Viaja também para as demais unidades industriais do país.
O maître se aproximou, cumprimentando-os, todo solícito, alcançando a carta de vinhos e de refeições. Como de costume, os cavalheiros deixaram a escolha a cargo da dama. Mada, após haver discutido os pratos e vinhos com o maître, sugeriu um vinho nacional de ótima qualidade. O maître abriu a garrafa e ofereceu a rolha a Mada, que a cheirou e aprovou o vinho. Mada escolheu como entrada uma sopa de agnolline e, como prato principal, um filé de atum grelhado com batatas no vapor. Enquanto esperavam pelo preparo da refeição, conversavam sobre o hotel, sua forma sofisticada da construção. Na lateral esquerda do restaurante, havia uma lareira, onde nós de pinheiros eram queimados. Ao centro, uma pequena pista para dança, circundada por finas mesas para quatro lugares. A luz era atendida por luminárias incrustadas nas paredes, quebrando qualquer incidência de luz direta. Os comensais eram poucos; havia um casal de idosos à direita, à esquerda um casal de meia idade e, aos fundos, um senhor falando espanhol. Logo determinaram que fosse argentino, pois estava dando uma bronca no “garçom”. A música ambiental, naquele momento tocava “AS TIME GOES BY”, o que os fazia lembrar do filme “Casablanca”. O ambiente estava divinamente agradável, o que fez o Sr. Alexandre convidar Mada para dançar. Enquanto dançavam na pequena pista, Alexandre observava o Senhor Branda e pensava:
- Homem extraordinário! Devo a ele tudo o que sou. Praticamente ele me tirou da sarjeta, completamente embriagado, já com delírios tremes, me amparou, mesmo antes de saber que se tratava de um professor de línguas e de etiqueta social. Internou-me em uma casa de recuperação de alcoólatras, custeou todas as despesas e me aceitou como parceiro e amigo, isso há mais de dez anos. Se há verdadeira amizade e respeito é o que sinto pelo Sr. Ricardo Branda.
Agora a musica que tocava era o “TEMA DE LARA”, o que os fez lembrar do filme Dr. Jivago. Vendo que o “garçom” havia servido o jantar, pararam a dança. Alexandre conduziu Mada até a mesa. O Senhor Branda já a esperava de pé, recuando a cadeira para Mada se colocar na posição de sentar, aproximou-a levemente e Mada sentou. O jantar estava de excelente qualidade, o que os fez comer mais do que o necessário.
CAPÍTULO II
VISITA À PESCA OCEÂNICA
No dia seguinte, após haverem tomado um excelente desjejum no hotel, dirigiram-se até a sala do Sr. Renato Corso, que lhes recebeu com muita simpatia, esboçando um largo sorriso. Chamando a secretária, Márcia Regina Murdoc, determinou que a mesma levasse a Senhora Branda até o escritório, que lhes havia reservado, salientando que tinha mandado instalar Internet, e-mail, fax, televisão, vídeo, retoprojetor e dois microcomputadores, servidos por uma impressora. No entanto, se algo mais fosse necessário, teria apenas de solicitar à Márcia Regina. Mada e Márcia Regina se afastaram. Acomodaram-se em um grande sofá de couro. O Sr. Renato Corso, apertando as mãos, uma contra a outra, pela ponta dos dedos, disse:
- Senhor Branda, conte-me sobre o trabalho que vai desenvolver na Pesca Oceânica. Confesso-me curioso sobre o estudo da cadeia alimentar dos peixes. O que isso significará para a minha empresa?
- Sr. Renato, meu trabalho consiste em analisar a cadeia alimentar dos peixes, principalmente, o que mais é pescado pela sua indústria, que é o atum. A cadeia alimentar é uma seqüência de transferência de energia e matéria, onde cada organismo serve de alimento para o outro. Quem produz o alimento é produtor e quem consome é o consumidor. Como as plantas fabricam alimentos para si e para outros seres vivos, eles são os produtores de um ecossistema.
Os animais herbívoros, que se alimentam das plantas, são chamados consumidores primários.
Os animais carnívoros, que se alimentam dos herbívoros, são chamados consumidores secundários. Os carnívoros, que se alimentam de outros carnívoros, são chamados de consumidores terciários e assim por diante.
Os animais que consomem plantas e animais são chamados onívoros, como o homem. Os que se nutrem de sangue são os hematófagos, de insetos, são os insetívoros, e de detritos de vegetais e animais, são os detritívoros.
Os consumidores secundários, terciários e quaternários são chamados de predadores, animais que caçam outros animais.
Quando os seres produtores e consumidores morrem, eles são decompostos por fungos e bactérias chamados decompositores. O produto dessa decomposição serve para realimentar as plantas.
Essa seqüência de alimentação dos seres vivos é chamada cadeia alimentar, que também podem ser marinha, a dos oceanos e mares.
As cadeias alimentares mantêm os ecossistemas em perfeito equilíbrio.
Setenta e um por cento da superfície terrestre está coberta por mares e oceanos. O oceano é importante para o mundo, pois cria chuvas, mantém temperaturas adequadas para a vida e sustenta a pesca. É também fundamental para o equilíbrio ecológico do planeta, pois cerca de setenta por cento do oxigênio liberado para a atmosfera é produzido pelo fitoplâncton, durante o processo fotossintético.
Após a formação da Terra, há 4600 milhões de anos, enormes quantidades de vapor de água foram libertadas dos vulcões e da superfície do planeta em fogo. Alguns milhões de anos mais tarde, assim que a temperatura da superfície da Terra baixou, ocorreu a condensação deste vapor. Formou-se, então, toda a água existente atualmente, originando um "Oceano Primitivo". Este Oceano Primitivo, formado há mais de 4000 milhões de anos, era muito diferente do atual. As águas eram ácidas e a sua temperatura rondava o ponto de ebulição.
As forças que o oceano exerceu sobre a costa primitiva ajudaram a moldar o relevo do globo. Lentamente, entre 4000 e 2000 milhões anos atrás, o fundo do mar se abriu em diversas fissuras, permitindo o contato do magma com a água. Moldaram-se os fundos oceânicos e iniciou-se um processo de deslocamento das diferentes placas tectônicas. Atualmente, embora imperceptível, este movimento não cessa, e origina catástrofes naturais como terremotos e erupções vulcânicas.
Embora a água esteja presente noutros locais do universo, apenas no nosso planeta existe água nos três estados da matéria: sólido, gasoso e liquido. De fato, bastava a Terra estar cinco por cento mais perto do sol para toda a água se evaporar, originando um efeito estufa, semelhante ao que se observa em Vênus. Por outro lado, caso estivesse três por cento mais afastada do Sol, toda a água congelaria, como sucede em Marte.
A água da zona oceânica ou mar aberto rodeia continentes mais além das plataformas continentais, onde o fundo do mar cai drasticamente. Devido à pureza das águas profundas, com respeito a partículas, limo e matéria orgânica, a luz penetra profundamente. As plantas podem fotossintetizar até a cem metros de profundidade. Somente alguma luz azul se dispersa novamente à superfície,e é por isso que a água parece azul escura; vistos dos satélites, os oceanos azuis parecem quase negros.
As correntes de água no oceano são principalmente dirigidas pelos ventos que incidem na água. As correntes marítimas dirigidas por esses ventos vão a grandes círculos. A corrente do lado oeste do oceano é muito forte. Um exemplo na Flórida é a corrente do golfo, que chega a velocidades de dois a vinte quilômetros por hora, para o norte. Em profundidades maiores, existe uma contracorrente com as águas do fundo, que voltam para o Equador. Essas águas são muito frias, com temperatura perto do ponto de congelamento da água marinha, quase 2ºC mais frio do que o ponto de congelamento da água doce.
As águas mais profundas do ecossistema oceânico são ricas em nutrientes provenientes da decomposição, no passado, de matéria orgânica. Essa matéria foi levada ao fundo do mar por migração animal e pelo movimento das águas profundas. Esse movimento é chamado de correntes de ressurgência. O plâncton, que é um microorganismo em suspensão na água, move-se junto a estas correntes.
Apesar da vida na área oceânica ser dispersa, também é diversa e interessante. Ela tem muitos tipos de minúsculos fitoplânctons. O zooplâncton move-se perto da superfície durante a noite, quando não é tão visível para os carnívoros, e mais profundamente durante o dia. Muitos animais maiores, incluindo peixes, também se movem desde a superfície ao fundo, até oitocentos metros, no seu ciclo diário; são auxiliados por grandes e turbulentos redemoinhos gerados pelas correntes, ventos, ondas e marés.
Esses organismos refletem o sonar, que são ondas sonoras, usadas pelas embarcações para visualizar o fundo do mar, parecendo um falso fundo marinho, que sobe na noite e desce de dia. Os alimentos convergem através da cadeia alimentar em peixes que nadam depressa, como o atum.
O sistema oceânico tem algas do tipo sargaço-marrom, que formam colunas paralelas em direção ao vento. Ondas dirigidas pelo vento causam redemoinhos, que movem o sargaço flutuante por essas linhas, onde as águas superficiais convergem e giram, para voltar por outro caminho. Muitos dos animais que flutuam nesse ecossistema são azul-brilhante, como a medusa, chamada de "caravela portuguesa".
A organização do ecossistema tem a mesma forma básica de outros sistemas; tem fontes externas, produtores e consumidores. No sistema oceânico, a turbulência é de especial importância, pois causa as misturas verticais e horizontais de nutrientes e gases. A turbulência é água com muitos redemoinhos circulares e correntes que mudam de direção constantemente. Ventos e diferenças de pressão da água mantêm a água em constante movimento. Essas energias, são como redemoinhos turbulentos e correntes de ressurgência.
A turbulência mantém o plâncton em movimento, ajudando a prover suas necessidades e levando à superfície aqueles que estão no fundo do mar. O fitoplâncton é o produtor no ecossistema marinho, como o diatomáceas, dinoflagelados e outras algas microscópicas. O zooplâncton é composto por animais em suspensão que, em sua maior parte, se alimenta do fitoplâncton. Nestes incluem-se muitos tipos de organismos, desde protozoários microscópicos até medusas.
Os materiais perdidos da rede alimentar marinha dirigem-se às águas profundas, antes de sua decomposição. Decomposições subseqüentes liberam os nutrientes da matéria orgânica. A água marinha de ressurgência devolve esses nutrientes perdidos à superfície, onde estimulam o crescimento do fitoplâncton, e depois, de toda a cadeia alimentar. As áreas de ressurgência criam ricas zonas pesqueiras. Correntes, costa continental, e áreas de ressurgência são importantes para a pesca.
As baleias e os atuns dependem de cardumes de pequenos camarões, chamados krill, para se alimentarem. Vivendo de fitoplâncton em águas férteis, o krill desenvolve-se em enormes quantidades, especialmente em águas árticas e antárticas, fortes correntes concentram fitoplâncton para alimentar o krill. Normalmente, a energia que passa através da cadeia alimentar necessitaria de vários passos intermediários para passar de organismos tão pequenos, como o fitoplâncton, a organismos tão grandes, como as baleias e os atuns, mas fortes correntes fazem que menos passos sejam necessários. Devido a muitos anos de caça indiscriminada, é possível que haja apenas um décimo da população original de baleias, hoje em dia; e algumas espécies estão a correr perigo de extinção. Tratados internacionais reduziram a caça às baleias, e algumas populações estão a se restabelecer. Aparentemente, outros peixes, aves marinhas e gaivotas comem o krill que não é aproveitado.
Após a longa conversa científica, entre duas pessoas que conhecem profundamente um assunto, foram convidados a fazer uma visita à indústria de pescado. O Sr. Renato Corso perguntou ao Senhor Branda se sua esposa Madalena não quereria os acompanhar. O Senhor Branda respondeu:
- Mada é especialista apenas na parte limpa do processo de pesquisa, fazendo traduções e versões nas línguas; francesa, inglesa e alemã, as quais domina muito bem. Porém, não gosta de lidar com pescado.
Como é exigido pela Inspeção Federal de Alimentos, tiveram de trocar de roupas, colocando as da indústria, que eram formadas por calça e guarda-pó de brim branco, botas de PVC branco, máscara de pano e capacete, tipo casquinha. Já no parque industrial, o Sr. Renato Corso os levou à parte limpa do processamento de pescado (entende-se por parte limpa do processo a parte em que os peixes já estão limpos, sem vísceras, cabeça, cauda e pele). Adentraram na área de processamento de atum.
Dizia o Sr. Renato Corso:
- O processamento do pescado de atum resulta em três produtos industrializados: atum sólido, atum ralado (grated) e farinha de peixe, a partir do resíduo proveniente da limpeza inicial do pescado.
Em linhas gerais, as etapas do processo são três: evisceração, cozimento e resfriamento. A retirada de pele, limpeza final, com início na parte da manhã, é realizada à temperatura ambiente.
Em média, são empregadas cinquenta toneladas de atum ao dia, sendo que o seu aproveitamento se restringe a cerca de quarenta por cento(vinte toneladas.) devido às perdas provenientes da evisceração; cozimento e limpeza.
A meta de produção no setor do atum é de quatrocentos e cinqüenta mil latas/dia, sendo setenta por cento de atum sólido.
Inicialmente, ocorre o recebimento de um monobloco (bandeja plástica retangular), com peso total de cerca de trinta quilos, contendo no seu interior de sete a doze unidades de atum com, aproximadamente três a cinco quilos por peça, já pré-cozidos, sem cabeça, e à temperatura ambiente, encaixado num suporte (fixo), localizado à direita e atrás do assento de cada operadora. Para facilitar a retirada do peixe do interior do monobloco, o seu suprimento é feito pelo apontador, toda vez que este for esvaziado, o que, pelo ritmo de produção desejado pela empresa, ocorre a cada uma hora.
É usada uma faca sem corte para, com a outra mão, preparar e limpar o peixe (raspagem e corte), no processo de fabricação da farinha de peixe, que utiliza a espinha central e a carne escura do lombo dos peixes, e no preparo do atum sólido e do atum ralado. Em ambas as situações, os pedaços inteiros e ralados, limpos, são depositados numa bandeja.
Quando as bandejas são preenchidas (peso final de cerca de quatro quilos em média), o funcionário as coloca sobre a esteira transportadora, situada ao nível da mesa, e no seu centro que, após pesagem, serão direcionadas para a respectiva linha de produção (atum ralado ou sólido).
Existe prescrição da empresa para que o tempo máximo entre a limpeza e o enlatamento do processo seja de trinta minutos, devido à qualidade requerida para o produto (escurecimento da carne por oxidação). Assim, a avaliação da qualidade de cada peça de pescado é feita pela funcionária, a quem cabe também a obrigação, de mensurar a qualidade inicial do pescado (odor, coloração e estrutura do tecido). Vale dizer que existe preferência generalizada por pescados de tamanhos maiores, uma vez que o resultado final, em peso produzido, é mais conveniente.
Após visitarem a parte de processamento, o Sr. Renato Corso os levou até as partes de utilidades, como casa de caldeiras, sala de refrigeração e outras.
De volta ao escritório do Sr. Renato Corso, trocaram a roupa utilizada na visita à indústria. O Senhor Branda solicitou licença para ir ao escritório, que iria ocupar juntamente com Mada. O Sr. Renato Corso lembrou que deveriam fazer os planos para as ações dos próximos dias. O Senhor Branda disse que voltaria logo acompanhado de sua esposa. O Sr. Alexandre Masoc permaneceu no escritório. O Sr. Renato perguntou:
- Sr. Alexandre, conhece há muito tempo o Senhor Branda?
- Há mais de dez anos, sirvo-lhe com lealdade e dedicação. É o homem mais correto e bondoso que conheço. O Senhor Branda é um homem do mundo, fala diversos idiomas, todas as suas ações são previamente estudadas e planejadas. Em suas pesquisas de oceano, faz registro fotográfico e até mesmo filmagens de todos os eventos importantes.
Nesse momento, entram o Senhor Branda e Mada. O Sr. Renato Corso pergunta à Senhora Branda o que achou do escritório, ao que respondeu que tudo estava na mais perfeita ordem, estando lá tudo de que necessitava. Agradeceu com uma mesura.
CAPÍTULO III
INÍCIO DOS TRABALHOS
O Senhor Branda diz que necessitaria, para a pesca do dia seguinte, de cinco contentores térmicos com gelo seco, para colocar as amostras colhidas durante a pesca. Sairia com o primeiro barco, que faria a pesca das amostras, com uma pequena rede de arrasto, uma vez que o atum é pescado com caniços. No entanto, teria de abrir alguns exemplares, para retirar os restos alimentares, os quais seriam acondicionados em gelo, para exames no laboratório da indústria. Falou que a primeira fase do trabalho seria a coleta de amostras, a segunda, a análise das amostras em laboratório e a terceira, o relatório da pesquisa, este a ser feito em sua casa de campo.
No dia seguinte, às 6 horas, parte o Senhor Branda com o primeiro atuneiro. Às 9 horas da manhã, Mada foi para o escritório. O Sr. Alexandre Masoc retornou para o Rio de Janeiro, onde tinha várias atividades a desenvolver.
- Bom-dia, Senhora Branda! - disse Márcia ao aproximar-se.
- Bom-dia! - respondeu Madalena - Em que lhe posso ser útil?
- Em nada no momento, apenas queria ver se a senhora não está precisando de alguma coisa, como uma garrafa de café, por exemplo.
- Senhora Branda, soube que é uma secretária trilingüe! Tão jovem, com tanta experiência?
- Certamente nem sempre fui esposa do Sr. Ricardo Branda. E você, quantas línguas fala?
- Apenas a do nosso país. - respondeu vexada.
- Não se preocupe. Às vezes, isso não faz a menor diferença. Fale-me sobre a Pesca Oceânica.
- Trabalho para o Sr. Renato Corso, apenas há dois anos. Não cheguei a conhecê-lo, antes do acidente da esposa.
-Como foi o acidente? - perguntou Mada.
- Foi horrível. Segundo o que me contaram, alguns dias antes do Natal, dona Margarita foi fazer compras na cidade vizinha, onde o comércio é mais forte. Ao retornar, o motorista se perdeu em uma curva e ela foi lançada para fora do veículo, durante a capotagem, tendo o pescoço partido e morte instantânea.
O atuneiro singrava o oceano; na proa ia o Senhor Branda, com seu binóculo, procurando algo no horizonte. De repente, alguém puxa-o pela perna da calça. Ele olha e é um grumete, que lhe diz que o comandante o estava chamando. O Senhor Branda dirigiu-se à sala de comando. Lá o esperava o comandante Flamingo, homem forte, com seus quarenta e cinco anos de idade, cabelo vermelho, exibindo um grande bigode cor de fogo, “queimado” pelo hábito de fumar charutos. Convidou o Senhor Branda a entrar na cabina e sentar-se em uma pequena poltrona. Ofereceu-lhe um charuto, o que o senhor Branda agradeceu, dizendo que preferia o seu cachimbo, dando início ao ritual necessário para o fumar de um bom cachimbo.
- Mas em que posso servi-lo?
- Acabo de receber ordens para lhe dar todo o apoio necessário a sua missão, incluindo desvio de rota, se o senhor entender necessário. Com todo o respeito, o que é que o Senhor vai fazer? Se isso não for uma indiscrição.
O Senhor Branda, com inigualável paciência e cortesia, narrou detalhadamente suas atividades, as quais foram, pelo comandante Flamingo, plenamente entendidas, destacando dois marinheiros para ajudar na pesca de arrasto.
Mada conversava com Márcia Regina, quando à porta do escritório surge o Sr. Renato Corso. Pede licença à Madalena e lhe deseja um bom-dia o qual é respondido por Madalena. Márcia Regina, que já se encontrava de saída, disse que lhe traria uma xícara de chá e se retirou. O Sr. Renato Corso, meio sem jeito, disse que falara com o navio pesqueiro, onde se encontrava o Senhor Branda e que lá estava tudo bem, colocando-se à disposição para o que fosse necessário. Mada agradeceu, dizendo que tudo estava correndo às mil maravilhas. O Sr. Renato, encompridando a conversa, solicitou:
- Senhora Branda, fale-me sobre seu marido.
- O Senhor Branda é um homem do mundo, é sincero, honesto e trabalhador, o homem mais generoso que conheci.
- Como conheceu seu marido?
- Fui classificada em um concurso que ele fez para ser sua secretária. Após contratada, tive de me especializar em três línguas: Francês, Inglês e Alemão. Já trabalhava para ele há dois anos, quando meu pai foi acometido de uma doença grave e rara, tratável apenas nos Estados Unidos da América. Sendo de família pobre, não tínhamos o suficiente nem para a viagem de ida. O Senhor Branda custeou todas as despesas até a morte de papai, que ocorreu nos EUA, após um ano e meio de tratamento. O Senhor Branda nunca perguntou se íamos pagar a conta, que passara de um milhão de dólares. Após o falecimento de meu pai, continuei trabalhando para ele e estudando as três línguas necessárias ao desempenho de minhas funções.
- Se não for uma indiscrição, gostaria de saber que idade a senhora tem?
- Tenho 26 anos.
- Dez anos mais moça do que teria minha esposa, Margarita, se estivesse viva.
Nesse momento, chega Márcia Regina, trazendo o chá, que havia prometido. O Sr. Renato Corso colocou-se novamente à disposição e se afastou.
Passadas duas horas aproximadamente, Mada recebe uma ligação telefônica do Sr. Renato Corso, que solicita sua presença no seu escritório. Lá chegando, o Sr. Renato Corso lhe diz:
- Chamei-a, pois acabo de receber uma mensagem do navio, por rádio, pois o telefone celular está péssimo. O comandante, informa que não conseguiu localizar o cardume e que não retornará hoje. O Senhor Branda lhe mandou dizer que tudo está ótimo e solicitou que eu a acompanhasse no jantar.
Às 20 horas, o Sr. Renato, conforme combinado, compareceu ao restaurante do hotel. O barman lhe serviu, sem que tivesse solicitado, uma pequena dose de whisky escocês, com bastante gelo. A porta do restaurante se abre e surge aquela figura ímpar, deslumbrante, em um vestido de veludo preto, com um discreto decote, onde brilhava um colar de ouro com uma pedra de esmeralda azul. O Sr. Renato Corso, ao vê-la, levantou e se dirigiu ao seu encontro. Fez uma mesura, pegou-a pela mão e levou-a até a mesa; afastou a cadeira e aproximou-a, quando Mada estava no lugar. Renato lhe ofereceu uma bebida e Mada respondeu que aceitava uma pequena dose de whisky escocês, com bastante gelo.
- Senhora Branda, é impressionante a semelhança que tem com a minha finada esposa, Margarita.
- São seus olhos que estão desejosos para vê-la.
- Madalena, se assim posso lhe chamar.
- Claro que pode, Sr. Renato.
- Voltando a nossa conversa, que fora interrompida, como casou com o Senhor Branda?
- A única maneira que achei de retribuir o que o Sr. Branda fizera por meu pai, foi me oferecer como sua esposa.
- E ele aceitou?
- Relutou muito até fazermos o contrato. Fez questão de que no contrato tivesse uma cláusula que ele poderia ser rescindido por mim, a qualquer momento, sem dar qualquer justificativa. Por minha vez, fiz questão de colocar uma cláusula de que somente rescindiria o contrato, após haver pago, com correção todas as despesas que tivera com meu pai. Como vê, fomos muito honestos um com o outro.
O maître chegou e alcançou a carta de vinhos e o menu. O Sr. Renato Corso perguntou?
- Gosta de camarão?
Mada respondeu que sim.
- Queremos um camarão à parmigiana. Madalena escolha o vinho.
- Queremos o mesmo vinho que foi servido ontem, estava ótimo.
Em todo o jantar, Renato Corso não deixava de olhar para Mada, parecia extasiado. Mada disse:
- Fale-me sobre você, sua família, seus negócios?
Tudo que Renato Corso contou à Mada foi que estudara na Europa e Ásia, por dois anos, antes de assumir a direção das indústrias da família. Ao retornar dos estudos, se enamorou de Margarita, que era filha de um dos diretores do Grupo, casou-se aos vinte e oito anos e permaneceu casado por sete anos, quando Margarita sofreu um acidente fatal. Antes do acidente, planejavam ter filhos, o que não se concretizou.
No navio pesqueiro, o Senhor Branda jantava com o comandante Flamingo, e falavam sobre a pesca do atum. Dizia o Senhor Branda:
- Atum, albacora, tuna, albacore são considerados os peixes mais hidrodinâmicos entre as formas existentes. O corpo é fusiforme e o pedúnculo caudal bastante estreito. Existem várias espécies que alcançam de cinqüenta e duzentos quilos. As espécies mais comuns na costa brasileira são a albacora (Thunnus albacares) e o atum (Thunnus atlanticus), menor que a albacora.
- Quais as espécies que você costuma pescar, comandante?
- Costumamos pescar espécies mais novas, que andam em cardumes e com peso abaixo dos vinte quilos.
- É, realmente, as espécies encontram-se amplamente distribuídas de acordo com a temperatura da água! - argumentou o Senhor Branda. - Por exemplo, a albacora vive em águas quentes, com temperatura ao redor dos 27°C. São encontradas sozinhas ou em cardumes. Grandes cardumes de albacora costumam freqüentar o litoral do Nordeste. Os cardumes, muitas vezes mistos, às vezes são acompanhados por golfinhos e baleias. Indivíduos jovens costumam formar grandes cardumes. Alimentam-se de lulas e peixes, como sardinhas e manjubas. Não costumam se aproximar da costa, sendo mais freqüentes em alto-mar. São importantes para a indústria pesqueira.
- Que tipo de linhas vocês utilizam na pesca?
- Por serem espécies de grande porte e muito ativas, os equipamentos são do tipo pesado. As linhas variam de 12 a 30 lb. E os anzóis de n° 3/0 a 8/0.
- Quais as iscas que utilizam?
- As iscas naturais mais usadas são lulas e peixes pelágicos, entre eles sardinha, parati e peixe voador, muito apreciado. Também pegam muito bem iscas artificiais, como plugs de meia-água, lulas sintéticas e colheres.
Durante a noite fez-se a captura do isco, com auxílio de luzes para atrair os peixes. Depois de cada lanço, e mantendo a rede na água, os peixes aprisionados são retirados em pequenas quantidades, com a ajuda de chalavares e, imediatamente, são introduzidos no viveiro, metendo a chalavar suavemente dentro dele deixando sair o peixe sem os forçar. Os viveiros são em madeira, sendo um dos componentes da pesca com isco vivo. Neste atuneiro temos quatro viveiros com, aproximadamente, dez metros cúbicos cada um, localizados abaixo do convés principal, na zona central do navio.
A conversa foi até altas horas da noite. Na manhã seguinte, às 6 horas, iniciaram a procura dos cardumes. O barco dirigia-se para as zonas onde tradicionalmente os atuns aparecem, com um corrico com a amostra empatada em uma linha fraca, para partir quando o atum mordesse, impedindo que o peixe ficasse preso e os seus movimentos desordenados espantassem os outros que o acompanhassem. Após duas horas, o cardume fora avistado e, detectada a sua presença, o atuneiro iniciou a abordagem. Os pescadores identificam a direção que levava a localização da “cabeça” do cardume. O barco navega ao lado do cardume, com todo o cuidado para não o “cortar”, colocando-se um pouco à frente da “cabeça”. Nessa posição, o engodador começa a lançar à água isco vivo em quantidade, para atrair o cardume, tentando pará-lo. Assim, o cardume de atum começa a vir ao encontro da embarcação. O engodador, nesse momento, passa a lançar o isco vivo um a um, regularmente, apenas à borda, onde foram lançadas as canas, até que os atuns viessem comer, quase encostados ao atuneiro. No momento em que o atum já está francamente a comer à borda, param-se todas as bombas de esgoto e a própria hélice, e ligam-se os chuveiros, ao mesmo tempo em que os pescadores iscam os anzóis e começam a pescar. Explicou Flamingo:
- Os chuveiros têm duas finalidades: não deixar o atum ver os pescadores, pois as águas ao largo são límpidas, e provocar à superfície um marulho, que se assemelha ao movimento dos cardumes de pequenos peixes, o que torna o atum mais sôfrego de alimento.
O pescador, quando o atum era pequeno ou médio, mal sentia o peixe ferrar, levantava a vara, fazendo com que o peixe ficasse à altura da axila, apertava-o com o braço e retirava o anzol, ou o lançava simplesmente para trás, o que fazia com que se desferrasse.
O convés estava cheio, os homens estavam cansados. E ainda teriam de acondicionar os peixes no gelo. O cardume se fora; era hora de acondicionar o pescado no gelo. Enquanto os homens acondicionavam os peixes no porão, sob a camada de gelo, o Sr. Branda escolhia alguns exemplares e os eviscerava, com imenso cuidado, usando uma técnica que se poderia comparar a uma técnica cirúrgica. Os restos das últimas refeições eram acondicionados cuidadosamente em sacos plásticos; os exemplares eram mapeados, medidos e as anotações, todas numeradas, correspondiam às amostras que eram acondicionadas nos contentores com gelo seco.
Algumas horas depois, o ritual se inicia novamente, até que a carga por fim ficou completa. Era hora de retornar ao porto. No retorno, que durara cerca de oito horas, o Sr. Branda aproveitou para colher amostras, utilizando redes de arrasto. As espécies capturadas eram miudamente catalogadas, medidas pelo Sr. Branda que ora filmava, ora fotografava.
O barco atracara no cais da Pesca Oceânica. O Sr. Branda desceu e se dirigiu ao escritório de Madalena, que o esperava de braços abertos. Um forte e carinhoso abraço de ambas as partes se sucedeu, Mada disse que havia sentido muito a sua falta, embora estivesse absorta na maioria do tempo pelo trabalho. O Sr. Branda lhe contou demoradamente toda a pesca, enquanto lhe segurava as mãos. Ao final, lhe disse que convidara o comandante do Luzianna para o jantar.
- Como foi de pescaria, Sr. Branda? - disse o Sr. Renato Corso, ao surgir à porta.
- Olá, como vai Sr. Renato. A pesca foi ótima, colhi belos exemplares para meus estudos, mas sente-se e conversemos.
A conversa foi animada. O Sr. Renato prestava a atenção nos mínimos detalhes, com simpatia e admiração. Mada nesse momento passara a fazer suas atividades normais. Ao final da conversa, o Sr. Renato, desejando uma boa-noite a ambos, se afastou.
À noite, no restaurante do hotel, o comandante Flamingo, trajando um blazer azul e calça branca, chegara antes de seus anfitriões. Tomava uma dose de vodca com suco de abacaxi, encostado no balcão do bar. Passados alguns minutos, adentra no restaurante o casal Branda. Mada vestia um traje verde calipso, exibia uma gargantilha de ouro no pescoço e o Sr. Branda, um terno grafite, camisa azul-clara e gravata preta. O comandante Flamingo dirigiu-se a ele e o Sr. Branda a apresentou:
- Este é o comandante Flamingo, esta é Madalena.
O comandante Flamingo fez uma mesura, Madalena lhe alcançou a mão, o comandante a pegou e lhe depositou um ósculo no dorso da mão. Todos concordaram em beber vodca com suco de abacaxi; o barman preparara uma dose e serviu a todos. A conversa fluía e versava sobre pesca e navios. O comandante do Luzianna mandara preparar para o jantar, a pedido dos anfitriões, iscas de peixe, uma tábua de frios e uma salada completa, à moda da casa. Como parecendo cansada da conversa sobre pescas e navios, Mada, dirigindo a palavra ao comandante Flamingo, disse:
- Comandante, por que não nos fala sobre o senhor? Deve ter uma vasta experiência de vida?
- Menos do que a senhora possa imaginar, Sra. Branda.
CAPITULO IV
COMANDANTE FLAMINGO:
- Sou filho de pescadores. Com idade de doze anos já pescava com meu pai, quando não estava estudando. Não necessito dizer que meus pais eram pobres, porém vivíamos com honestidade e respeito mútuo.
Certo dia, quando tinha dezessete anos, conheci na escola uma menina de dezesseis anos, que estudava numa série anterior a minha. Ela se chamava Lailla, filha de um advogado famoso na época. Iniciamos um flerte e logo nos intitulávamos namorados. O namoro evoluía, estávamos apaixonados, nos intervalos na escola sempre estávamos juntos. Lailla, ou Lai, como carinhosamente a chamava, era uma obra de arte da natureza: Tinha o rosto angelical, o corpo perfeito, a pele aveludada como um pêssego maduro, seios bem formados, o cabelo loiro formava imensos cachos, que se debruçavam sobre os ombros e seus olhos verdes mais pareciam duas esmeraldas lampejantes. Eu era louco por Lai. Certo dia, combinamos que no sábado iríamos sair de barco, oceano adentro. O pequeno barco subia e descia as ondas, que quebravam na praia. Passada a rebentação, o mar estava calmo. Lai estava adorando o passeio. Quando já não mais se avistava a praia, desligamos o motor, deixando o barco à deriva. Lai se aproximou, peguei-a em meus braços e nos beijamos longamente. Como a situação era propícia fomos até as últimas conseqüências: nos amamos por mais de uma vez. O corpo despido de Lai é a mais fantástica lembrança que carrego comigo. Seus cabelos absolutamente louros, os seios fartos, mas firmes, sua cintura, bem marcada, seus quadris, arredondados, pernas longas, bem torneadas, canelas grossas e pé pequeno. Retornamos do passeio e ao chegar à beira do cais, seu pai já a esperava, andando indócil ao redor do luxuoso carro. Mal Lai descera, seu pai a pegou pelo braço, sem ao menos olhar para mim. Com truculência, a colocou no carro e partiu em disparada. Na segunda feira, Lai não compareceu às aulas, na terça também não, na quarta, quinta e sexta não. Fiquei desesperado. Criei coragem e fui até a mansão, onde ela morava. Era um casarão antigo, portas largas e altas, maçanetas de bronze, um batente, com a forma de uma mão em bronze. Bati na porta com bastante firmeza, um senhor de mais ou menos quarenta anos atendera, perguntei por Laila, e o homem disse que ela viajara para o exterior. Disse-lhe que queria falar com o pai dela. O homem respondeu que o Dr. Francisco era um homem muito ocupado e que não poderia me atender. Passaram-se várias semanas e todos os dias e a todo o momento que podia passava rondando a casa. O pai de Laila saía de carro e por diversas vezes tentei pará-lo, porém tinha de sair fora, senão era atropelado. À noite, sozinho na casa de meus pais, que nada sabiam, ficava até altas horas da noite pensando em Lai. Em meus pensamentos, recordava como era carinhosa e o quanto a amava. Terminei o segundo grau e tendo completado 18 anos, resolvi me alistar na marinha. Fui aceito na marinha, entrei para a escola naval, estudei muito, pois o meu objetivo era retornar graduado e procurar Lai. Tive oportunidade de seguir a carreira militar, tendo, em quinze anos, galgado o posto de capitão da Marinha Brasileira. Tirara uma licença de duas semanas e resolvera retornar a minha cidade natal. Meus pais já haviam morrido, por isso me hospedei em um hotel. No dia seguinte, caminhava pela cidade, saudoso dos últimos detalhes, pois a cidade havia crescido; muita coisa mudara e as ruas agora eram todas calçadas ou asfaltadas. Ao chegar à rua onde morava Lai avistei o casarão, velho e mal cuidado. Bati com o batente. Alguém abrira a porta, era um homem que deveria ter sessenta anos ou mais. Seus traços não me eram estranhos, lembrei-me: era o mesmo empregado que me atendera há quinze anos atrás. Apresentei-me como capitão Pedro de Albuquerque da Marinha Brasileira, e disse que queria saber notícias de Laila. “A senhorinha Laila!” disse o homem. “O senhor está louco”? O homem não tinha me reconhecido. Perguntei-lhe se o Dr. Samuel Noronha, advogado famoso, ainda morava na casa. – “Não”, senhor,”respondeu o homem”, “A família Noronha se mudou após a morte de sua filha Laila”. A dor que senti no peito foi maior do que se estivesse sentido a penetração de um punhal. Perguntei ao homem, se não se lembrava de mim. Há mais de quinze anos, eu era o garoto que passou várias semanas rondando a casa e procurando falar com o Sr. Samuel. “Ah, agora me lembro como você está mudado ficou um homem forte e vistoso”.Por favor, conte-me o que aconteceu, quando Laila morreu?
“Quando você desapareceu, ou seja, quando não mais rondava a casa, Laila entrou em profunda depressão. Praticamente prisioneira em seu quarto, passou a não se alimentar e seu pai não amoleceu o coração. Passaram-se meses, o pai dizia que Laila estava em viagem pelo exterior, enquanto ele permanecia trancada dentro de casa. Dada à fraqueza, contraíra uma gripe, que se transformou em pneumonia, não resistiu e morreu três meses após a sua partida. Em seguida, sua mãe morreu de desgosto e seu pai se suicidou.” Senti uma profunda tristeza, chorei profundamente, passei uma semana embriagado. Um dia acordei, me olhei no espelho e disse: homem reaja! Tomei um banho, desci para o refeitório do hotel, tomei um desjejum, não mais bebi e ao cabo da licença, retornei ao navio onde servia. Dois anos depois, passei para a reserva, sendo contratado pela Pesca Oceânica, como comandante do Luzianna, adotando o codinome de Flamingo. E, aqui estamos.
O garçom serviu a refeição, todos comiam e o Sr. Branda disse:
- Comandante, ficamos muito comovidos com a sua história, mas depois disso o senhor não voltou a se apaixonar?
-Não, Sr. Branda, até o momento não apareceu a mulher que substituísse as recordações de Laila.
Voltaram a falar sobre pesca e oceano, até o final do jantar.
ARAQUÉM NÓRTON 1945- Rio de Janeiro
O bem sucedido empresário Aníbal de Toledo mantinha, em um pequeno bordel da cidade, uma jovem com apenas dezoito anos, chamada Andora da Silva, que ele mesmo tinha colocado lá, sob suas expensas econômicas. Andora ficara grávida de Aníbal que, quando soube da gravidez, disse-lhe que esta era de sua total responsabilidade, abandonando-a sua sorte. Andora, que não era prostituta profissional e estando grávida, foi amparada pelas prostitutas do bordel que se cotizavam para prover o seu sustento. Chegara o dia e a hora do nascimento. As prostitutas chamaram uma parteira da cidade, que atendeu o parto. O parto fora difícil, mas nascera um belo bebê varão. Passados uns poucos dias, Andora passou a ter febre alta, foi chamado um médico, que a hospitalizou para fazer uma curetagem, porém a infecção estava generalizada e a moça morreu poucas dias após a hospitalização. O bebe de Andora foi adotado pela dona do bordel, uma mulher madura, porém com uma beleza incontestável e uma alegria contagiante, que registrou o bebê com o nome de Araquém Nórton. Araquém foi à criança mais amada do mundo. Era paparicado e adorado por uma dúzia de tias, todas prostitutas, que sempre lhes dedicavam toda a atenção e carinho. Araquém, desde pequeno, mostrara ser mais inteligente do que a maioria dos homens. Muito cedo entendeu que o mundo é um grande mercado, onde tudo se compra ou se vende. Na escola, esteve sempre à frente dos demais colegas. Chegava a entender que a escola era uma perda de tempo, pois sua capacidade de aprender era tal que a freqüentava apenas por obrigação, para passar de ano, pois seu aprendizado autodidático o levava a ter interesse por matérias diversas as do aprendizado normal.
Chegando à maioridade, sua mãe adotiva, a dona da Casa Rosada, o enviou para o exterior. Primeiro para a Europa, onde Araquém permaneceu durante dois anos, aprendendo as línguas inglesa, alemã e francesa. Mais tarde, permaneceu nos Estados Unidos da América, por seis meses, onde ampliou seus estudos sobre diversos níveis de conhecimento.
Araquém Nórton teve de retornar ao Brasil prematuramente, pois sua mãe adotiva havia falecido, deixando-lhe a propriedade e uma pequena fortuna, que acumulara em toda a sua vida.
Araquém nomeou uma das mulheres de sua confiança para tomar conta da Casa Rosada, passando a dedicar-se a estudar o submundo, envolvendo-se com drogados e alcoólatras. Fundou diversos alcoólatras anônimos e drogados anônimos. Sempre se dedicou com muito carinho às prostitutas, afinal estas foram as que ele conheceu como suas parentes mais próximas. Com sua inteligência, não foi difícil passar em concursos, chegando a ser gerente de uma rede bancária. Porém não era o que queria, terminou se demitindo e passando a se dedicar ao investimento de capitais. Na bolsa de valores ganhou milhões. Fez grandes investimento em casas de tolerância, mas sempre as doava às prostitutas que lá freqüentavam.
CAPITULO V
UM AGRAVO: ARAQUÉM - 1980
Em 1980, quando Araquém tinha 35 anos, foi procurado em sua casa de campo, por uma prostituta, a qual não conhecia. A mulher estava com o rosto deformado, cheio de hematomas, tendo lhe contado a seguinte história: Que o procurara aconselhada por uma amiga, para que ele a ajudasse, pois fora espancada por um liente, que se dizia apaixonado por ela e que lhe fizera uma proposta: para que vivesse apenas para ele, em um apartamento na cidade. Como se recusara, aplicou-lhe uma tremenda surra e desapareceu.
Araquém perguntou:
- Você o conhece bem? Qual é o seu nome?
A mulher lhe respondeu:
- Ele se apresentou simplesmente como João, nada mais disse sobre si, pois sempre o atendi como cliente e tudo o que fiz, para agradá-lo, foi em pleno exercício da profissão. Araquém colocou a mão na testa e pensou por alguns instantes: Ela não sabe nada, estamos num mato sem cachorro. E, disse?
- Minha cara, você terá de me fornecer, no mínimo, um retrato falado desse homem. Coloque-o em seu pensamento, reproduza a sua imagem e a descreva miudamente.
A mulher pôs-se a pensar, e disse:
- Não sei como descrevê-lo.
Araquém sacudiu a cabeça e falou:
- Vou lhe fazer um rol de perguntas. Você, antes de responder a cada uma delas, deverá pensar, e somente responda quando estiver certa de estar dando a mais correta descrição.
A mulher assentiu, sacudindo a cabeça positivamente, e ele perguntou:
- Descreva a sua estatura.
- Em torno de um metro e sessenta, pernas curtas, tórax largo, cabeça grande e pescoço curto.
- Descreva a sua fisionomia.
- Cabelos pretos e lisos, um pouco grisalhos, com grandes entradas nas têmporas; apresentava-se com barba escanhoada e sem bigode; quase nunca sorria e quando o fazia apenas alargava o canto da boca; seu nariz e orelhas são normais para o tamanho da cabeça.
- Que idade acha que tem?
- Em torno de quarenta e cinco anos.
- Ele é expansivo, ou soturno; de fala fácil, ou quieto; alegre ou triste?
A vítima pensou detidamente, coçou a cabeça embaraçada e disse:
- Não sei como responder, pois o seu humor era muito variável; tinha dias que estava alegre e falante, outros estava triste e soturno.
Araquém colocou a mão no queixo pensativo e falou:
- O relacionamento de vocês foi longo, tanto que o levou a interpretar que você gostava dele, estou certo?
- Sim respondeu pensativa.
- Alguma vez ele a convidou para sair com ele para jantar ou passear?
- Apenas uma vez, me convidou para passar com ele um fim de semana, em um hotel na cidade vizinha. Porém, eu tive que dar entrada sozinha, no hotel que ele recomendou. Ficamos em quartos separados, para fins de registro no hotel.
- Sabe o nome do hotel?
- Sim, eu lembro perfeitamente, pois o seu nome estava escrito no cardápio e nas toalhas de banho. O nome era Lafaiete Hotel.
- Quando isso aconteceu? Será possível você lembrar a data, pense o quanto for necessário.
Após pensar demoradamente, respondeu:
- Não, não lembro.
Araquém lhe disse:
- Quanto tempo faz isso?
- Mais ou menos dois meses atrás.
- Ótimo! - respondeu Araquém.
- E foi no inicio ou no fim do mês?
- No início, sim, foi na primeira semana do mês.
- Ótimo! –e que dia da semana?
- Foi em uma segunda-feira.
- Considerando que estamos em novembro, dois meses atrás seria em setembro; na segunda-feira da primeira semana, vejamos, foi no dia 04 de setembro de 1980.
- Minha amiga! - disse Araquém com muito carinho: - Siga teu caminho: a justiça será feita.
Abraçou a mulher, aplicou-lhe um ósculo na fronte e desejou que ela fosse em paz.
A INVESTIGAÇÃO NO HOTEL
Araquém chegara ao Lafaiete Hotel, às 19 horas. Este estava em pleno movimento, com a recepção cheia. Após esperar por cerca de vinte minutos, foi finalmente atendido pelo recepcionista, que o registrou mediante a apresentação de documentos de identidade.
Às 22 horas, Araquém desceu até a recepção. O movimento já era insignificante. Apenas pessoas circulavam, dirigindo-se para o refeitório. Araquém Nórton se encostou no balcão de atendimento, quando foi interpelado pelo recepcionista, que lhe perguntou?
- Em que posso servi-lo?
Araquém tirou um bloco de anotações do bolso, e disse:
- Um cidadão esteve hospedado neste hotel no dia 04 de setembro passado. Eu tive um contato de negócios com ele, e agora necessito de seus serviços; perdi o seu cartão,e não lembro do nome dele e também não sei o seu endereço.
O recepcionista, rapaz de mais ou menos 25 anos, disse:
- Não podemos dar informações sobre nossos hóspedes, você entende, é regulamento do Hotel.
Araquém passou a mão na cabeça, alisando o cabelo e disse:
- Não se trata de uma informação. O que quero é apenas que o senhor me faça um serviço, e para tanto devo pagar. O que quero é que durante a noite, quando não tiver mais movimento, o senhor me faça uma lista de todo o homem que se hospedou no dia 4 de setembro e que não estivesse acompanhado, apenas isso. Para tanto, lhe proponho o pagamento de 100 reais, pelo trabalho de, no máximo, uma hora.
O rapaz assentiu e disse:
-Terá a sua relação pela manhã. No entanto, a direção do hotel não deve saber de nada.
- Certamente. - respondeu Araquém, piscando o olho direito.
A ESTRATÉGIA DA PROCURA.
No dia seguinte, Araquém Nórton levantou cedo em sua casa de campo. Após o desjejum, começou a
procurar na lista telefônica, colocando ao lado dos nomes, o número do telefone encontrado na lista. Após
haver completado o serviço, passou a elaborar a estratégia de abordagem, que consistia em telefonar para os números, dizendo o seguinte: “ Por favor, quero falar com o Sr. Fulano de Tal? Quando este atendesse, perguntaria” O Sr. esteve Hospedado no Hotel Lafaiete, na cidade de Landría, no dia 4 de setembro?” Esperaria a resposta. Se fosse positiva, diria o seguinte:
- Eu estive hospedado no mesmo hotel, onde tive uma valise trocada. Acontece que dei saída do hotel e viajei para o exterior, somente retornando agora. Por acaso, o Sr. também não teve uma valise trocada?
Caso a resposta fosse “não, não estive hospedado nesse hotel”, então era de se considerar esse nome como suspeito de ser o indivíduo que é procurado.
De toda a lista de trinta e quatro pessoas, Araquém obteve cinco respostas de que não estiveram hospedados. Portanto cinco suspeitos. Procurou na lista telefônica, desta feita, o endereço do assinante, que mostrou:
João Victor de Mendonça – Rua Flores da Cunha, 1456;
Marcos D’Almeida Vasconcelos – Rua Duque de Caxias, 1287;
Antônio Pereira de Albuquerque – Rua Marques do Pombal; 234;
Otávio Becker – Rua 25 de Julho, apto 24, Edifício Claudia;
Gilberto Martins – Rua das Alamedas, 976.
No escritório, havia apenas uma mesa para reuniões, a que era utilizada para os trabalhos burocráticos. Na parede, uma placa que dizia: - “Detetive Pereira, investigações especializadas”.
O homem era de estatura mediana, com média obesidade, olhos de chacal, nariz afilado, calvo, com cabeça pequena e pescoço curto, usando um terno cinza amarrotado, camisa azul-claro e gravata borboleta.
- Sou um cliente, meu endereço postal é caixa 235. Espero não me identificar. Quero um trabalho extremamente confidencial. Quando pronto, o Sr. deverá enviar caixa posta, o número da sua conta bancária e quanto deverei depositar para satisfazer os seus honorários. Após o pagamento, o senhor enviará à caixa postal o fruto de seu trabalho.
O detetive, nada perguntou, dizendo apenas:
- Qual é o trabalho?
- O trabalho consiste em o senhor fotografar cinco homens, para que sejam identificados. Portanto, deverão ser tiradas diversas fotos e em diversos ângulos. Aqui está a relação com os nomes e endereços.
Passados quinze dias, Araquém telefona para Marta, pedindo que ela o procurasse com a brevidade que fosse possível.
Marta não se fez esperar. Os hematomas haviam desaparecido, Araquém nem a conheceu quando a viu.
Quando Marta disse:
- Me chamou, pois aqui estou.
Araquém a cumprimentou e disse:
- Marta, tenho algumas fotos para você ver; espero que identifique o seu agressor.
Marta examinou as fotos e disse, separando cinco delas.
- É este, é este o homem que me espancou.
Araquém agradeceu a identificação, e disse:
- Terá notícias dele em breve, é só esperar.
A TÁTICA DA AÇÃO:
Araquém estacionara o carro no pátio de estacionamento do Banco Interamericano do Brasil S/A. E adentrara no saguão do salão principal, que era circundado por diversos postos de atendimento personalizado, separados uns dos outros por um pequeno espaço. Logo foi atendido por um dos gerente executivos, que o fez sentar em uma poltrona localizada à frente do posto de trabalho. Araquém disse que queria abrir uma conta corrente.O gerente solícito perguntou?
- De quanto será o depósito inicial?
- De um milhão de reais! - respondeu Araquém. Após a abertura da conta, Araquém solicitou informações confidenciais sobre uma empresa da região. O gerente executivo informa que não as poderia dar. No entanto, o encaminharia ao diretor executivo do banco. Araquém foi encaminhado a um gabinete luxuoso. O gerente falou em solilóquio com o diretor, se virou para Araquém e disse:
- Este é o Sr. Araquém Nórton, nosso novo cliente, que deseja algumas informações. – Fez uma mesura e se afastou. O diretor levantou e se dirigiu para perto de Araquém. Estendeu-lhe a mão, dizendo:
- Grande satisfação em tê-lo como novo cliente de nosso banco. Sou João Victor de Mendonça, diretor executivo deste banco. Em que lhe posso ser útil?
– Sou Araquém Nórton, investidor de valores. Acabo de abrir uma conta com o seu banco, de forma que pretendo estreitar nossos interesses comerciais e financeiros. Necessito, para tanto, que o seu banco me forneça um dossiê completo sobre as Indústrias Têxteis Brascubas S/A.
João Victor passou a mão sobre a cabeça, apertou o queixo e disse:
- Bem, essas indústrias estão passando por séria dificuldade, diria até que estão em fase pré-falimentar.
Araquém sorriu, esticando os cantos da boca, olhou demoradamente para o seu interlocutor e disse:
- Sr. João, esse fato já é de meu conhecimento, o que quero saber é a quem pertence o controle acionário da empresa? Como está composto o seu capital? Com quem estão as ações ordinárias que dão direito a voto? Qual o montante das ações preferências?- E assim por diante.
O Sr. João Victor de Mendonça levantou e dirigiu-se até uma mesinha, onde havia uma garrafa térmica e algumas xícaras para cafezinho. Serviu dois cafezinhos, alcançou um para Araquém, gesto este que o permitiu pensar por alguns instantes e falou:
- Para obtermos tais informações é necessário uma demorada pesquisa, e isso leva tempo e demanda muito trabalho. Mas poderá ser feito. No entanto, necessito saber qual o seu interesse?
Araquém, preparando uma porção de fumo no cachimbo, disse:
- Já contava com essa pergunta. Nosso interesse é adquirir o controle acionário e tomar posse da empresa. Como disse, sou um investidor, tenho faro para o negócio. Essa empresa na minha mão dobrará sua produção em poucos meses; sua ações irão subir vertiginosamente, sua produção de têxteis será voltada à exportação. Naturalmente, necessito saber as exigências do banco para a prestação desse serviço?
- Apenas faremos o serviço na promessa de tê-lo como cliente preferencial do nosso banco. Dentro de quinze dias terá o seu relatório.
Passados os quinze dias, Araquém retornou ao banco e foi recebido pelo Sr. João Victor que, após uma breve conversa de negócios, entrega-lhe o levantamento realizado. Araquém examina o trabalho, verificando que as ações ordinárias estavam nas mãos de apenas dois sócios. As preferências, essas sim, estavam pulverizadas. No entanto, a maioria estava em poder de investidores conhecidos no mercado de capitais. Araquém disse:
- No momento, somente me interessam as ordinárias, as quais pretendo comprar por preço vil, negociando com os diretores da empresa.
Agradeceu dizendo que voltaria a vê-lo num futuro próximo.
Passados dois dias, o Sr. João Victor recebe um telefonema dos diretores da empresa Indústrias Têxteis Brascubas S/A, solicitando informações sobre o Sr. Araquém Nórton, que estava interessado em adquirir o controle acionário da empresa. João Victor informa que o Sr. Araquém, é cliente preferencial do banco e que tem uma grande quantia depositada em sua conta.
Os diretores informaram que, sendo assim, iriam fechar o negócio no dia seguinte, ou seja, passariam o controle acionário da empresa ao Sr. Araquém Nórton.
A transação é realizada no dia seguinte. Após a compra, Araquém vai ao banco e conversa demoradamente com o Sr. João Victor, dando-lhe ciência de que haverá um aporte financeiro de $50.000.000, para a modernização e duplicação das indústrias.
O DIA DA BOLSA:
No dia seguinte, Araquém vai à bolsa de valores, e vê que três pessoas estão comprando as ações preferências da Indústrias Têxteis Brascubas S/A, e que estas estão valendo cada vez mais, pois as três pessoas as compram sem parar.
Por uma semana, Araquém acompanhou as negociações das ações das Têxteis Brascubas. As ofertas já não existiam mais, o que indicava que as ações já estavam nas mãos dos três compradores. Araquém pede a autofalência da empresa Têxteis Brascubas e a liquidação da massa falida.
Tão rápido como um rastilho de pólvora a notícia se espalhou. Araquém recebe um telefonema do Sr. João Victor de Mendonça. O homem estava possesso, dizia que fora traído, que havia comprado todas as ações preferenciais da Brascubas, que agora não valiam nada. Araquém perguntou apenas se lhe aconselhara a comprar as ações? Se lhe tinha garantido algum negócio? Não, então por que estava se queixando?
No dia seguinte, os jornais estampam a seguinte notícia: “Preso” Diretor executivo de banco por dar desfalque: para aquisição de ações que não valiam nada
JULIA MENEZES PEREIRA - 1997
O telefone toca na residência de campo do Sr. Araquém Nórton. É ele próprio quem atende.
- Alô quem fala? - diz a voz de uma mulher.
- É Araquém Nórton, as suas ordens.
- O senhor não me conhece - diz a voz, - No entanto, já ouvi falar muito do Sr., que ajuda as pessoas que se sentem injustiçadas, como é o meu caso, por isso, necessito falar com o Sr..
A voz deu uma pausa, como que sugerindo que o seu interlocutor falasse alguma coisa.
Disse Araquém:
- Podemos marcar uma hora para lhe receber em minha casa.
A voz hesitou e disse:
- Não, eu não poderia ir vê-lo, em não tenho recursos e sou paraplégica. O Sr. teria de vir até a minha residência, que fica em um bairro pobre, perto da Central do Brasil.
– Pode me fornecer o endereço completo? - perguntou Araquém.
– Sim, fica na Rua dos Açores, 4765. O Sr. chegando à Central do Brasil é só perguntar a alguém ou consultar um mapa, que é fácil de encontrar. Eu estou sempre em casa. Meu nome é Júlia Menezes Pereira.
- Aguarde-me, Sra. Júlia, em breve nos encontraremos.
Eram dez horas da manhã, quando Araquém Nórton chegou à Central do Brasil. O movimento era intenso, trens que chegavam e trens que saíam.
Araquém abre o mapa do bairro e localiza a Rua dos Açores, número 4765, distante uns quatro quarteirões, o que o levou a pegar um táxi. O motorista era um português, com o sotaque acentuado dos lusitanos.
- Donde vais? - perguntou o motorista.
Araquém lhe forneceu o endereço e o homem deu partida no veículo. Localizada a casa, Araquém pagou o táxi e o dispensou. A casa era realmente modesta, de construção mista. Sua frente era em alvenaria de tijolos e os fundos em madeira. Um portão de ferro dava entrada ao pátio e uma rampa dava acesso à porta. Araquém apertou a campainha, a porta abriu, uma jovem senhora, aparentando cerca de quarenta anos, conduzindo-se sobre uma cadeira de rodas, surgiu sob o resplendor do sol da manhã. A jovem senhora, com cabelos castanho-claros, que formavam um coque na parte lateral esquerda da cabeça, olhos verdes como duas esmeraldas, lábios grossos e bem formados, esboçando um largo sorriso, que expunha uma grande e perfeita dentadura, lhe disse:
- Estava a sua espera, Sr. Araquém. Entre, por favor.
A sala era pequena, mas acomodava um sofá e duas poltronas sobre um grande tapete.
Araquém, se acomodou em uma poltrona, pondo-se a imaginar qual seria a história daquela mulher? Júlia posicionou sua cadeira de rodas à frente do Sr. Araquém e disse:
- Ouvi falar muito do Sr. e por isso resolvi lhe telefonar, e expor as minhas dificuldades.
O que disse Araquém:.
- Antes que comece, quero lhe informar que não deve ter grandes esperanças. É que seu caso pode ser de difícil solução. Em síntese, não lhe garanto nada, a não ser ouvi-la atentamente e estudar o seu caso.
- Quando eu tinha vinte anos, isso já vão dezoito anos, era uma jovem sonhadora que tinha vindo do interior. A vida não era fácil. Para encurtar o caso, logo passei a ser garota de programa. Saí por várias vezes com um rapaz com cerca de vinte anos, que me apanhava seguidamente para fazermos programa. Costumávamos dançar, beber e após terminávamos a noite em um motel de qualidade. Uma noite, quando nos dirigíamos ao motel, o rapaz, em alta velocidade e embriagado, se perdeu em uma curva e o carro bateu de lado em um poste. Eu perdi os sentidos com a batida, tendo acordado em um hospital, alguns dias depois, quando tive a notícia de que tinha ficado paraplégica. Perguntei pelo meu companheiro e me disseram que nada havia sofrido. Permaneci por diversas semanas hospitalizada, quando obtive alta e fui para a casa de uma amiga. Alguns meses depois, recebi uma intimação para comparecer a uma audiência, para apurar a responsabilidade criminal do acidente e perante o juíz para dar um depoimento no julgamento do rapaz que tinha se acidentado junto comigo. Quando, na audiência, vi o réu, disse que havia um engano: que aquele não era o rapaz que havia se acidentado comigo. O advogado de defesa começou a me perguntar, qual era a minha profissão, se no dia havia bebido muito, quantas doses, enfim fez a corte não dar bola para este detalhe, pois o que estava em julgamento não era a pessoa que se acidentara junto comigo. Mais tarde soube que o acusado fora condenado, porém ficara em liberdade por ser réu primário e por ter bons antecedentes. Meu advogado me informou que o réu não tinha nada na vida, que impetrar uma ação indenizatória seria perda de tempo. Com o acidente, mudei de profissão, passei a ser costureira, que é como ganho a vida atualmente.
- Tem alguma idéia do porquê da mudança de acusado?
- Sim, o rapaz que se acidentou junto comigo era um playboy. Utilizava diversos carros; sempre que saíamos gastava sem exagero, porém tudo era do melhor, desde os restaurantes até os motéis. Nunca regateava quando eu lhe cobrava os meus serviços.
- Diga-me uma coisa, o veículo acidentado, a quem pertencia? – perguntou Araquém.
- No processo constava que o dono do veículo era a pessoa que estava sendo julgada. – respondeu Júlia.
- Para que eu possa iniciar as investigações e o processo de reparação, necessito saber dos seguintes: Todo o seu nome, como consta no processo, o número do processo, a vara onde tramitou e a data do acidente. Aqui tem o meu cartão, quando obtiver as informações, favor me remeter. Ah, mais um detalhe. Quanto acharia que deveria ser indenizada como reparação? Não diga nada agora, pense, e me informe oportunamente.
PESCA OCEÂNICA.
Na manhã seguinte, o Sr. Ricardo Branda, se dirigiu ao escritório do Sr. Renato Corso, bate na porta e adentrou.
– Bom-dia Sr. Renato, acabo de receber um e-mail, que me obriga a viajar para a Suíça, Devo ficar afastado por uma semana.
- Os negócios sempre nos obrigam a interromper um trabalho por outro mais urgente. - Argumentou o Sr. Renato Corso.
- No entanto, Mada prosseguirá as suas tarefas junto à Companhia. Vou poupá-la dessa viagem maçante.
Falaram sobre o andamento das pesquisas e outros diversos assuntos. O Sr. Branda se despediu com um até breve.
Madalena levou o Sr. Branda até o aeroporto na cidade vizinha, e retornou à Pesca Oceânica. No dia seguinte, estava Madalena no escritório trabalhando quando, bate à porta e entra o Sr. Renato Corso.
- Bom-dia Sra. Branda, isto é, Madalena, se assim posso lhe chamar?
- Bom-dia, Sr. Renato, certamente que pode me chamar de Madalena.
Vim lhe convidar para passear de barco no sábado. A previsão do tempo será favorável aos velejadores.
– Aceito o convite, pena que ainda esta frio para banho.
- Também quero lhe convidar para o jantar à noite em um restaurante na cidade vizinha
- Certamente, pois com a viagem do Branda ficarei muito solitária.
O Sr. Renato observou-a trabalhando, antes de se afastar. Madalena era uma das mulheres mais lindas e desejáveis que já vira e ele pretendia possuí-la. Porém, não era estúpido nem cego. Tratava-se de uma mulher comprometida. Tinha de ir devagar. À noite, a estrada para a cidade serpenteia ao longo do vale do mesmo nome, com suas colinas formadas por dunas de areia. No confortável banco do luxuoso carro, Madalena e Renato conversavam. Ele lhe falou da esposa falecida, de que pretendiam ter filhos. Mada ouvia com simpatia. Renato estacionou o carro à frente de um restaurante, desceu contornou o carro e abriu a porta para Madalena, que desceu. Um manobrista solicitou a chave do carro. Renato dá o braço à Madalena e a conduziu até a porta de entrada do restaurante. A porta se abriu automaticamente, e eles adentraram no salão. O recepcionista lhes desejou uma boa-noite e um excelente jantar, conduzindo-os até uma mesa, no canto esquerdo do salão. Renato afastou a cadeira, Madalena se colocou na posição, ele aproximou a cadeira e ela sentou. O maître apresentou a carta de vinhos e refeições. A música ambiental, naquele momento, tocava Lá Luna interpretado por Sarah Brigntman. O Sr. Renato Corso olhava atentamente para a sua companheira e imaginava: Como sou um homem de sorte, a vida me coloca a oportunidade de ser feliz novamente. No entanto, devo ser cauteloso e sensato, não posso me precipitar, tudo tem de dar certo.
- Vamos tomar um aperitivo? – sugeriu Renato.
– Um whisky com soda e gelo. – respondeu Madalena.
A conversa fora animada, o jantar estava ótimo, porém tinham de retornar ao hotel, pois haviam combinado que velejariam no dia seguinte.
Eram 7 horas da manhã de sábado. Renato apanha Madalena no hotel e se dirigem ao clube de regatas. Na enseada, onde fica o clube, a potente lancha já estava pronta. Renato segura a mão de Madalena, apoiando-a para entrar no barco. Madalena vestia um traje de banho, branco, em duas peças. E se cobria com um quimono branco. Seus cabelos estavam protegidos por um esvoaçante lenço branco, preso à cabeça por um chapéu de abas largas. O Sr. Renato vestia uma camiseta roxa, “colada ao corpo”, e uma bermuda preta. O mar estava tranqüilo. O vento se fazia sentir como uma delicada brisa, a enseada desaparecia no horizonte. Renato dirigia a lancha com rara habilidade. Madalena, sentada ao seu lado, desfrutava das carícias do vento, em sua delicada pele. Renato a observava, esperando que ela falasse. Madalena olhou para Renato e sorriu. Renato perguntou:
– Está se divertindo?
- Estou adorando. - respondeu Madalena.
Renato colocou sua mão sobre a mão de madalena, fitou-a nos olhos e disse:
- Madalena, desde que a conheci, minha vida se modificou, não paro de pensar em você. E não é pelo fato de se parecer com minha falecida esposa, pois lhe conhecendo mais vejo que a aparência é apenas física; no mais é completamente diferente.
- Espero que seja para melhor! Argumentou Madalena.
Assentiu Renato
- Sem dúvidas, você é mais desembaraçada, tem mais vivência.
Renato pára o barco, o fluxo das ondas, o balançar suave, a brisa da maresia, com delicadeza, acaricia os rostos deles. Renato olha para Madalena, o encontro de olhares é como um ímã a aproximá-los. Para desfazer o embaraço, Madalena diz:
- Vamos preparar um drinque? E após pescar?
- Certamente. - respondeu Renato, dirigindo-se para o interior do barco.
Madalena permanece apreciando a calmaria do oceano. Renato não suporta mais, somente pensa em Madalena, tomá-la em seus braços e beijá-la. Ao retornar com os drinques diz:
- Não agüento mais, estou apaixonado por você, eu a quero somente para mim.
Aproximando-se cada vez mais, Madalena coloca a mão em seu peito e o faz parar, dizendo:
- Sr. Renato, não haverá nada entre nós, até que eu resolva tudo com Ricardo. Como já lhe disse, ele é um homem honrado e lhe devo tudo o que sou. Além disso, temos um contrato de casamento que não poderei saldar no momento.
Argumentou Renato:
- Sou um homem rico e posso saldar toda a sua dívida com Branda!
-Ainda assim, restará a gratidão que tenho para com ele, essa não tem preço.
- Madalena, você é jovem demais para permanecer com ele! Nós podemos ser felizes, por um longo tempo, somos feito um para o outro, eu lhe amo.
Por mais que Renato insistisse, Madalena resistia heroicamente. Renato disse que iria falar com o Sr. Branda ao retornar da Suíça e esclarecer tudo. Madalena disse-lhe que não. Quando chegasse o momento ela mesma falaria. No entanto teriam de se conhecer melhor.
Durante a semana seguinte, se encontraram todas as noites, conversavam, porém Madalena não deixava haver qualquer aproximação, sempre alegando que jamais trairia a confiança de Ricardo. Renato, por sua vez, não cansava de insistir. Após oito dias de viagem, retornou Ricardo Branda. Madalena foi buscá-lo no aeroporto da cidade vizinha. Como de costume, Ricardo beijou-a na testa e lhe deu um abraço carinhoso. Madalena demonstrava imensa alegria ao vê-lo retornar. Ricardo lhe contou que tudo correra dentro do programado, porem que a viagem fora cansativa.
Ao chegarem ao escritório da Pesca Oceânica, Ricardo se dirigiu ao escritório do Sr. Renato Corso. Os dois homens trocaram cumprimentos, e Renato não conseguiu disfarçar o nervosismo. O Sr. Branda notando isto, disse:
- Sr. Renato, há algo errado? Você parece nervoso e preocupado!
Ao que Renato respondeu:
- Esta tudo bem! Como foi de viagem?
- Muito bem, porém, como sempre, cansativa!
Branda lhe contou a viagem, com abundância de detalhes. Renato lhe ouviu com aparente atenção, e ao final o Sr. Branda lhe perguntou:.
- Como foram as coisas por aqui?
- Muito bem, fiz companhia à Madalena, não foi favor algum, foram horas agradáveis as que passamos juntos.
- Mada é uma ótima companhia! - respondeu Branda.
- O comandante Flamingo se encontra em terra? - perguntou Branda.
– Sim, está se preparando para uma nova pescaria, sairá amanhã cedo. - respondeu Renato.
Nesse momento, entrou Madalena.
– Com licença, senhores. Ricardo,!acabo de receber um e-mail para você.
Madalena alcança o e-mail a Branda, que o lê e diz:
- É do Masoc. Diz que devo ir ter com o meu editor imediatamente. Responda que vou vê-lo amanhã.
Antes que Madalena se afastasse, Renato disse:
- Quero convidá-los para o jantar, hoje à noite.
Ambos assentiram e Renato disse:
- Apanho-lhes às 20 horas, no hotel.
Madalena se afastou, os dois homens continuaram a conversar. Dizia o Sr. Branda que necessitava de alguns esclarecimentos para seu estudo, que poderiam ser fornecidos pelo comandante Flamingo, e que iria procurá-lo mais tarde.
Às 20 horas, Renato Corso estacionou o seu luxuoso carro na frente do hotel. Já prontos, Madalena e Ricardo, o varão abriu a porta de trás do carro para a dama entrar. Após acomodá-la, entrou na dianteira do carro.
- Será uma linda noite, Sr. Renato! - diz Ricardo, acomodando-se no banco.
O potente carro anda sobre o asfalto. Seus ocupantes, em silêncio, apreciam a paisagem, que se movimenta velozmente. O carro é estacionado na frente de um restaurante à beira da estrada. Renato adianta-se e abre a porta para a saída de Madalena. Branda, já fora do carro, oferece-lhe o braço, e os três adentram. O restaurante tinha estilo holandês, com decoração própria da terra que lhe dava o nome. O maître os recebe dizendo:
- Sejam bem-vindos.
Renato se adianta e diz:
- Queremos um reservado, pois vamos tratar de negócios.
O maître assentiu com uma flexão da cabeça:
– Acompanhem-me, por favor.
O reservado, como é comum na Holanda, consistia em uma peça não mais de dois por três metros, quatro poltronas, uma mesa baixa entre as poltronas e um exaustor de parede, que iniciara seu funcionamento, deixando o ambiente bem ventilado. Os comensais se acomodaram nas poltronas. Renato à frente de Madalena e Branda. O garçom ofereceu a carta única, onde continham aperitivos, bebidas e refeições, à Madalena, ao Sr. Ricardo Branda e, por final ao Sr. Renato. Após a escolha, o garçom se afastou. Renato disse
- Sr. Ricardo, somos pessoas cultas e embora nos conheçamos há pouco tempo, o Sr. é merecedor da maior estima e consideração. A verdade é que eu amo Madalena, porém ainda não sei se sou correspondido. No entanto, quero me casar com ela.
Um silêncio fúnebre se instalou no ambiente. Ao fundo, apenas se ouvia o barulho do exaustor. Branda fitou demoradamente o Sr. Renato, olhou-o olho no olho, após fitou Madalena da mesma forma, cofiou a barba demoradamente e disse.
- Sr. Renato, aos meus 58 anos, com toda a experiência de vida que tenho, sabia que mais cedo ou mais tarde Madalena iria encontrar um homem mais novo que a amaria, tanto como eu. Por isso, somente aceitei me casar com ela, mediante a condição de que a qualquer momento,quando entendesse necessário, sem qualquer explicação, eu a deixaria livre. E, Sr. Renato, isso foi um ato consciente, o qual vou cumprir, sem qualquer mágoa ou rancor.
- Minha cara Madalena, esse também é seu desejo? – perguntou Ricardo.
– Sim! Porém em nosso contrato, eu coloquei uma cláusula que o ressarciria de todas as despesas que tiveste com meu pai. Como sabes, não tenho como fazê-lo.
Renato interpôs-se, dizendo:
- Tais despesas eu ressarcirei.
-Não, isso não é importante. - interviu Ricardo.
- Faço questão de cumprir o contrato que Madalena tem com o Sr. enfatizou Renato.
- Os drinques chegaram, o ambiente focou soturno. Madalena, completamente deslocada, permanecia de cabeça baixa. O jantar transcorreu com um clima de embaraço de todas as partes. O Sr. Ricardo Branda, visivelmente abalado, mal tocara na comida. As 22 horas e 30 minutos, aproximadamente, o carro foi estacionado à frente do hotel da Pesca Oceânica. O Sr. Branda desceu, abriu a porta traseira e Madalena desceu. Branda lhe ofereceu o braço, como se nada tivesse acontecido. Despediram-se de Renato, que ficou totalmente embaraçado, retirando-se em seguida.
No dia seguinte, Ricardo acordou cedo, tomou um táxi e se dirigiu ao aeroporto da cidade vizinha. Às 9 horas, Madalena chegou ao escritório e se dirigiu ao gabinete do Sr. Renato, que já se encontrava trabalhando.
-Bom-dia Renato!
Sentou-se a sua frente, olhando-o demoradamente e disse:
- Havia lhe dito que eu comunicaria ao Ricardo. Você precipitou tudo. No entanto, acho que foi melhor assim.
Renato, como um adolescente extasiado, se levantou. Madalena pôs-se de pé, Renato se aproximou dela tomou-a em seus braços e lhe sugou os lábios, enquanto a comprimia entre seus braços. Madalena, quase perdendo o fôlego, o empurra, libertando-se e dizendo:
- Vá com calma, estamos em ambiente e horário de trabalho.
Renato voltou a se sentar e Madalena fez o mesmo. Renato lhe perguntou como foi ontem à noite com o Sr. Branda?
– Agiu como um perfeito cavalheiro. Fez de conta que já esperava o acontecido, acordou cedo e viajou.
– Fale-me mais sobre o contrato de vocês. - pediu Renato.
Madalena lhe contou novamente a história, desta feita com maiores detalhes. Renato, que ouvira atentamente, lhe disse.
- Você, certamente, tem as contas bancárias do Sr. Ricardo Branda?
- Sim, eu tenho. Necessito de três bancos. Mandarei fazer três depósitos de quinhentos mil dólares. Após isso, comunicarei ao Sr. Branda.
No dia seguinte, acompanhado de Madalena, viajou para Porto Seguro em lua de mel. Hospedam-se em finíssimos hotéis. Madalena está eufórica. Renato imensamente feliz. Retornam dentro de oito dias e encontram um telegrama do Sr. Branda, que diz:
“Congratulo-me convosco, Sr. Renato Corso. Desnecessário ressarcimento efetuado, como já foi feito, o encaminharei a quem lhe é merecedor. Meus votos de felicidades. Dados aos imprevistos acontecimentos, dou por interrompidos os trabalhos na Pesca Oceânica. Meus estudos serão continuados em outra companhia. Ricardo Branda.”
ARAQUÉM NÓRTON
Duas semanas após haver visitado Júlia Menezes Pereira, Araquém Nórton recebeu uma carta da mesma.
- Caro, Sr. Araquém. De acordo com o combinado, estou lhe enviando as informações solicitadas. Apenas não posso informar o quanto custaria uma justa reparação de tudo o que passei. Deixo isso a seu critério, quanto à reparação em dinheiro, no entanto, acho que o ingrato deve pagar por tudo o que passei, para que a justiça seja feita. Um grande abraço, Júlia.
- Alô quem fala?
- É o Dr. Cristiano Júri as suas ordens.
- Aqui fala Araquém Nórton, Desejo contratar seus serviços, como advogado. Como serão cobrados seus honorários para fazer uma investigação judicial?
– Cobro por tarefa; diga-me o que deverei fazer e eu informo o preço.
– Necessito de informações pormenorizadas de um processo ocorrido em 1982, em que foi vítima Júlia Menezes Pereira. Quero informações do réu e, se possível, seu endereço na época.
– Sr. Araquém, não sei da dificuldade que terei, pois já faz bastante tempo. Poderei ter que desentranhá-lo de um arquivo morto do tribunal. Por isso, proponho pagamento por hora trabalhada. Cobrar-lhe-ei cem reais por hora, com dez horas pagas antecipadamente. Se for em menos horas, lhe devolverei o que sobrar.
- Fechado , dê-me o número da sua conta bancária, que lhe farei o passe.
-Telefonarei dentro de uma semana. Muito obrigado.
Passada uma semana, Araquém recebe o resultado da investigação, que dizia:
Processo nº 45 780/82
3a Vara Civil da cidade do Rio de Janeiro
Réu: Sebastião Rodrigues de Azevedo
Profissão: Escriturário
Endereço: Rua das Andorinhas, 4780 – Rio de Janeiro.
Endereço Ocupacional: Distribuidora de Alimentos Andrau Ltda.
Telefone: 15. 476.3999
Conclusão do Processo: O réu foi considerado culpado de lesões corporais grave. Por ser primário, ter endereço fixo e ser trabalhador, foi sentenciado a dois anos de reclusão. A pena foi comutada para a de liberdade vigiada.
CAPITULO VI
HERCULAN DECROIS - UM DETETIVE ESPECIALIZADO
Nos pequenos classificados se lia:
HERCULAN – O Detetive.
Especialista em desaparecidos.
Investigações de adultério.
Informações confidenciais.
Telefone 011.525.3333
-Alô é Herculan, o detetive!
- Aqui é um cliente que necessita de seus trabalhos confidenciais. Como pagarei seus honorários?
- Meus honorários são de cem dólares por dia, mais despesas.
- Nada feito somente pago em reais. Quanto custa?
- Duzentos reais por dia, mais despesas.
- Fechado, dê-me a sua conta bancária para eu fazer o passe inicial.
- Minha conta e no BB número da agência 324; conta 456987. Meus honorários adiantados é de um mil reais.
- Farei o passe de dez mil reais, os quais, no final do trabalho, serão ajustados. Seu trabalho será encontrar um cidadão de nome: Sebastião Rodrigues de Azevedo, Profissão: Escriturário, Endereço: Rua das Andorinha, 4780 – Rio de Janeiro, Endereço Ocupacional: Distribuidora de Alimentos Andrau Ltda., Telefone: 15. 476.3999. Estes dados são de 1982. Portanto há quase vinte anos.
Esse rapaz, na época serviu de laranja em um processo de lesões corporais, por um acidente de carro, ou seja, ele substituiu o verdadeiro culpado. Sua missão será descobrir quem realmente foi o culpado, onde se encontra atualmente e como poderá ser localizado. Seus métodos terão de ser sutis, não poderão criar suspeitas em hipótese alguma. Ou seja, o verdadeiro culpado não poderá saber que está sendo investigado.
- Como poderei entrar em contato com o Sr.?
- Não poderá. Eu entro em contato com você daqui a trinta dias, lhe fornecendo o número da caixa postal para o envio do relatório.
Herculan Decrois era um homem feliz. Holandês, estava radicado no Brasil desde a adolescência, pois seu pai era cônsul da Holanda. O grande detetive, pois tinha um metro e noventa e oito, seu pé calçava o nº 54 e por isso tinha que mandar fabricar seus calçados sob medida. Suas faces rosadas, com ausência de barba, mais pareciam à face de um bebê. Nariz aquilino, fazendo uma leve curvatura como o bico de um falcão. Seus olhos cinza claros eram sempre escondidos por um óculos espelhado. Pelo seu grande tamanho, caminhava arqueado, nem gordo nem magro, com uma barriga de abundante dimensão, dado ao hábito de tomar cerveja.
Tinha escritório escondido no fundo de uma barbearia, que era sempre atravessada pelos seus clientes, que não raras vezes ficavam fregueses para o corte de cabelo e barba. Herculan dizia que o local era estratégico, pois seus clientes não tinham de se cuidar ao procurá-lo, afinal poderiam apenas estar freqüentando uma simples barbearia. Emfim, não causava suspeitas.
Seu habito de vestir era o mais normal possível, calça e camisa esporte, dizia que era para não causar suspeita.
O grande detetive careca estava sentado à mesa de trabalho, um charuto entre os dentes manchados, contemplava as anotações à sua frente. Com as parcas informações que continha sabia que teria um tremendo trabalho. No entanto, estava satisfeito, pois ganhara um novo cliente. Com um mapa da cidade do Rio de Janeiro, localizou a Rua das Andorinhas, pegou o telefone e discou o nº 15. 476.3999
- Distribuidora de Alimentos Andrau, boa-tarde, em que lhe posso ser útil?
- Por favor, pode passar para o setor de RH (Recursos Humanos).
- Um momento, por favor.
- Recursos Humanos, as suas ordens.
- É possível obter o telefone do Sr. Sebastião Rodrigues de Azevedo.
- Não é nosso empregado, Sr.
- Trata-se de um velho amigo. O último contato que tive com ele foi em 1982, quando trabalhava nessa empresa. Seria possível me dizer quando ele foi desligado e se deixou um endereço?
- Terei de pesquisar. O senhor poderá telefonar daqui uma meia hora.
- Farei isso, muito obrigado.
Ao telefonar mais tarde, o detetive Decrois soube que o rapaz havia se demitido da empresa em maio de 1983, não deixando qualquer informação para ser localizado.
Só pego merda, mas se fosse fáci,l para que um detetive especializado como eu?Ele mesmo faria a busca.
Apanhara seu chapéu no cabideiro. Ao cruzar a barbearia, costumava caçoar com os barbeiros, e não raro contar-lhes, ou ouvir, as últimas anedotas.
Sua caminhonete marrom de cabina dupla representava espaço suficiente para acomodar sua enorme carcaça. Com o mapa a seu lado, rumara ao bairro que procurava, mais precisamente a Rua das Andorinhas, 4780. Lá chegando, localizara a casa, modesta, porém bem cuidada. Bate à porta, uma senhora atende.
- Boa-tarde, minha senhora. - diz Decrois, fazendo uma mesura de grande dimensão e tirando o chapéu.
-Estou procurando um amigo de um amigo meu, de nome Sebastião Rodrigues de Azevedo.
- Moro aqui há cinco anos, nunca ouvi falar desse nome.
- Pena que não o encontre, meu amigo vai ficar decepcionado, queria tanto vê-lo. Diga-me, as vizinhas que moram aqui há muito tempo, você as conhece bem? Poderá me indicá-las para que as procure?
- Sim, com muito prazer, como é mesmo o seu nome?
- Decrois, as suas ordens.
- Sr. Decrois, vou lhe indicar uma amiga minha, que mora aqui desde o nascimento. Está vendo aquela casa verde à frente. Peça pelo dona Arminda. Ela é uma ótima pessoa e lhe dará todas as informações que puder.
Palmas, palmas, o cão feroz avançava a cerca. Boa-tarde, dona Arminda, estou à procura de um amigo que morou no número 4780, ele se chamava Sebastião Rodrigues de Azevedo. O último contato que tivemos foi em 1982.
- Sim, lembro-me dele, rapaz bonito, mudou-se em 1983, parece que tirou a sorte grande.
- Sabe para onde se mudou?
- Não, mas sei quem poderá lhe informar. Há uma tia dele que mora no bairro, terceira rua paralela a esta naquele sentido.
- Muito obrigado, sabe o número da casa?
- Não, mas é uma casa de alvenaria, com a cor amarela, não tem como errar.
- Muito obrigado, mais uma vez, passe uma boa tarde.
- Decrois bate à porta, um homem velho abre.
- Boa-tarde, senhor!
Tirando o chapéu e curvando-se:
- Estou procurando Sebastião Rodrigues de Azevedo, que se mudou em 1983, sabe onde mora atualmente?
- Sou tio dele. Ele mora, atualmente, com o pai, no estado de Minas Gerais. Não o vemos há muito tempo.
- Por acaso, teria o endereço dele?
- Dele não tenho, porém tenho o de meu irmão, que é pai dele, O telefone, um momento que vou procurar. Aqui está, é 012.788.2345.
- Ajudou bastante, muito obrigado, uma boa tarde.
No dia seguinte, no escritório, o grande detetive telefona para Minas.
- Aqui quem fala é Herculan Decrois. Desejo falar com o Sr. Sebastião Rodrigues de Azevedo.
Uma voz do outro lado diz:
- Sr. Herculan, aqui quem fala é o pai do Sebastião. Meu filho mora em São Paulo, o telefone dele é 11.324.7558, ramal 244.
- Muito agradecido, meu Senhor, desejo-lhe sorte e prosperidade.
Logo a seguir:
- Desejo falar com o Sr. Sebastião Rodrigues de Azevedo.
- É ele quem está falando
- Senhor, estou falando do Rio de Janeiro. O senhor foi contemplado pela Lista Telefônica, com um radiogravador, desejamos que nos forneça seu endereço para a remessa via correio.
- Tome nota, por favor: Distribuidora de Alimentos e Logística de Transportes Ltda, rua dos Salgueiros, 4560, Bairro Catupi- S.P. Capital.
- Muito agradecido, receberá o seu prêmio nesse endereço.
- Três dias após, Sebastião, recebe um telefonema de Decrois, que lhe informa que irá cobrir o circo da fórmula um, no próximo final de semana, e que lhe entregará o prêmio pessoalmente.
O Gigante viaja a São Paulo, pela ponte aérea. Lá chegando, no aeroporto de Congonhas, aluga um táxi, que o leva até o endereço procurado. Constata que a Logística é uma empresa moderna, que representa e distribui para diversas empresas de gêneros perecíveis Grandes câmaras de estocagens compõem a empresa, bem como um terminal de cargas e descarga de congelados.
Herculan Decrois desce do táxi, com o rádio gravador na mão. E fica a observar mais atentamente o complexo logístico a sua frente: - Que merda, como vou fazer para arrancar informações desse cara? Certamente, após o término do caso, recebeu uma recompensa pelo trabalho sujo. Por isso que a dona Arminda se referiu que teria ganhado na loteria. Conveniente seria para o verdadeiro culpado que ele trocasse de emprego, de preferência para outro estado. É Sr. Decrois, pegou merda com as mãos. Mas vamos em frente.
- Bom-dia, em que lhe posso ser útil? - perguntou a recepcionista.
- Sou da Lista Telefônica. Desejo entrevistar o Sr. Sebastião Rodrigues de Azevedo, ele recebeu o décimo prêmio do concurso “Usar a lista dá prêmios”.
- O Sebastião termina seu expediente às catorze horas. Poderá esperá-lo, pois durante o expediente será impossível recebê-lo.
- Senhorita, pode me dizer o que faz o Sr. Sebastião, qual é a sua função?
- O Sebastião é o encarregado da recepção e expedição de produtos.
- Por onde sairá o Sr. Sebastião, quando terminar o expediente?
- Sairá nesta portaria.
- Posso esperá-lo às 14 horas?
- Sem dúvidas, esteja à vontade.
- Deixa ver! Aqui tem um bombom pela sua gentileza.
Às 14 horas o arqueado detetive, oferecia balas à recepcionista, dispondo-a a conversar. Às 14 horas e quinze minutos, surgiu na porta de saída um senhor. calvo, com aparência atlética, aparentando quarenta anos, aproximadamente, com altura de um metro e setenta aproximadamente. A recepcionista o chamou:
- Sebastião, faz favor!
O homem se aproximou, estando Decrois encostado no balcão, logo se pôs atento.
- Este é o senhor......
- Decrois. Herculan Decrois.
- Sr. Herculan, este é o Sr. Sebastião.
Os homens se cumprimentaram com um aperto de mãos.
- Sou o promotor de eventos da Lista Telefônica. Entrei em contato com o senhor, há poucos dias. E como prometi, vim entregar-lhe o seu prêmio. Aqui está! Agora, em continuação, devo lhe entrevistar. Se o senhor me der o prazer, gostaria de lhe convidar para bebermos uma cerveja, em um lugar que preferir, para que possa realizar a entrevista.
- Bonito prêmio. No entanto, não entendi como pude ser contemplado!
- Asseguro-lhe que tudo será explicado, durante a entrevista.
Herculan e Sebastião foram até uma cervejaria, nas imediações da empresa.
O pé grande, como era chamado carinhosamente pelos amigos, explicou ao seu novo convidado, que o concurso “Usar a lista dá prêmios”, procura contemplar os usuários. Por isso, entram nos sorteios os ramais, quando é usado o sistema PABX, com diversos ramais. O próprio usuário é contemplado, sem a necessidade de inscrição ou envio de cupons. Concorrem todos os que estão na lista.
- No seu caso, o seu ramal é que foi sorteado.
Decrois, como um bom bebedor de cervejas, as tomava uma após a outra, tomando, no mínimo, o dobro do que Sebastião tomava. Dessa forma, não haveria a desconfiança de que queria lhe embriagar. Após uma demorada explicação sobre o sistema de Listas Telefônicas, o face de bebê, como lhe chamavam alguns amigos, iniciara propriamente a entrevista.
- Sebastião a lista telefônica quer saber: A sua educação e formação profissional?
- Tenho formação secundária. Comecei a trabalhar cedo, aos dezessete anos, trabalhava como feirante. Aos vinte iniciei a trabalhar na empresa Distribuidora de Alimentos Andrau Ltda, onde permaneci até 1983, passando, logo após, a trabalhar na Distribuidora de Alimentos e Logística de Transportes Ltda, onde estou até hoje.
- Conte-me sobre as recordações da escola, uma pessoa especial do seu tempo de estudante?
- Recordo que fui apaixonado por uma professora, quando no primário. Tinha apenas nove anos, a paixão era tão forte que chegava a chorar por ela, à noite. Lembro que não queria passar de ano para continuar aluno dela. Até hoje recordo dela com um imenso carinho.
O pé de esqui, como carinhosamente lhe chamavam alguns amigos, continuou a perguntar coisas triviais, enquanto tomavam cerveja. Já estavam na sexta cerveja, Sebastião enrolava a língua, Decrois fingia o mesmo, embora tivesse tomado o dobro de cerveja.
- Fale-me sobre seu primeiro emprego, algo de excepcional, amigos, promoções, chefes, ou fatos que o tenham marcado.
- Nada de mais, a não ser que tive a oportunidade de ajudar a um amigo e ganhar um bom dinheiro.
- Quer falar sobre o caso?
- Não, isso não pode aparecer na entrevista.
- Se você quiser contar, eu prometo que não tomarei nota de nada, afinal estamos bêbados mesmo.
CAPITULO VII
A NARRATIVA DE SEBASTIÃO:
- Eu tinha um amigo de farras. Ele era boa gente, porém não conhecia o Rio de Janeiro. Conhecemo-nos no trabalho, pois a empresa da família dele era cliente da distribuidora para quem eu trabalhava. Quando saíamos, ele custeava todas as despesas. Só que trocávamos de posição: quem pagava a conta nas boates era eu, pois ele tinha medo de ser raptado. Também trocávamos de carro, quando ele ia para os motéis, embora andássemos juntos, quando pegávamos mulheres, nunca era em conjunto.
Um certo dia, fomos a uma boate, dançamos e bebemos. Ele saiu com uma garota, a qual já havia saído por diversas vezes. Saíram no meu carro, com a minha documentação. Eu saí com uma outra rapariga, no carro dele, com a documentação dele. Meu amigo, naquele dia, tinha bebido um pouco a mais do que o normal, dirigia meu carro em disparada. Numa curva, perdeu a direção, derrapou e bateu de lado, em um poste. A garota que estava com ele, se acidentou feio e foi levada para um hospital. O rapaz nada sofreu. No dia seguinte, ele me procurou, e disse:
- Meu amigo, temos um problema grave para resolver.
- Contou-me o sucedido. Fiquei sem saber o que dizer, portanto nada disse.
Alguns momentos se passaram e ele falou:
- No momento que chegou o socorro, a garota foi levada para o hospital, a polícia fez o levantamento do acidente e solicitou meus documentos. Eu tinha apenas os teus, e os apresentei, junto com os documentos do carro. O policial não notou a diferença de fotografia. A ocorrência saiu no teu nome.
- Fiquei mais embasbacado, ainda, quando ele disse:
- Não se preocupe, nós faremos um negócio. Eu te dou um carro novo e mais uma quantia equivalente ao valor do carro.
- Sinceramente, eu teria aceito se ele nada me desse, pois nós tínhamos uma boa amizade. Passado alguns dias, recebi uma intimação para comparecer na delegacia, para responder a inquérito policial sobre o acidente. Telefonei para o meu amigo e lhe informei sobre o que estava acontecendo. Ele, muito gentil disse que eu não me preocupasse, pois ia contratar um bom advogado para me defender. No final de tudo, me daria uma quantia muito boa. Respondi todo o processo e no final fui recompensado. Não sei como, mas ele comprou um bilhete premiado e me deu. Foi como eu tirei na loteria
- Decrois, que ouvia atentamente, pensava: - Bosta, sempre que se referiu ao homem que procuro usou chamá-lo de amigo. Tenho de mudar de tática, não posso perguntar simplesmente a identidade da pessoa que procuro? O que é que tu vais fazer seu bosta?
- Sebastião! - disse Decrois – Amanhã, eu tenho de cobrir a fórmula um, não conheço muito bem São Paulo, você não quer me fazer companhia?
- Com muito prazer, Sr. Herculan, que horas nos encontramos. - Onde tem um hotel aqui por perto?
- Neste bairro não há hotel, estamos em área industrial. Você terá de ir ao centro.
- Dê-me o número de seu telefone celular, nos encontraremos no circo. Às 11 horas, eu lhe telefono, dizendo onde nos encontraremos.
– Muito bom. - respondeu Sebastião.
O detetive paga a conta e se despede de Sebastião, com um efusivo aperto de mão. Acena para um táxi, apanha-o, e se afasta, abanando para Sebastião.
Enquanto o táxi se movimentava pelas ruas de São Paulo, o Gigante pensava.
- Boa gente esse Sebastião, pena que não me deu o nome do seu amigo. Vamos ver o que já tenho de concreto. O nosso homem, no mínim,o é um filho de empresário, cliente da logística. Quando a coisa ficou preta, no Rio, ele mudou de representante, e também de cidade. Porém, para não perder o contato com o Sebastião, lhe arrumou um emprego na nova representada. É isso aí. Tenho de conseguir uma relação das empresas que trabalhavam em oitenta e três, com ambas as representadas, ou uma que migrou do Rio para São Paulo. Amanhã, verei se arranco mais algumas informações do meu amigo, Sebastião, após mais uma cervejada.
O CIRCO DA FÓRMULA UM:
Após jogarem conversa fora, na oitava cerveja, o astuto detetive diz:
- Uma coisa eu não entendo, como é que você deixou o Rio de Janeiro para trabalhar em São Paulo. Nada contra São Paulo, mas aqui o pessoal só pensa em trabalhar, no Rio não, também pensamos em diversão, praia e mulheres.
Sebastião, querendo justificar sua mudança, disse:
- Não tive escolha, o meu amigo trocou de representante e quis que eu mudasse para São Paulo.
- Ah, sim, quer dizer que o seu amigo quis você tratando dos interesses dele em São Paulo. Seu amigo tem transportadora decerto?
- Não, ele tem indústria.
ARAQUÉM NÓRTON:
Passado trinta dias da contratação do detetive Herculan Decrois, Araquém liga ao detetive e pergunta se obteve progressos e se tudo estava dentro do combinado. Decrois pede o número da caixa postal, para envio de uma foto, a fim de ser confirmado se era a pessoa procurada. Araquém fornece o número e fica no aguardo. Passada uma semana, vai ao correio examinar a caixa postal. Abre a porta da caixa e vê que Decrois cumprira com o combinado. Lá estava um envelope com a foto de um desconhecido. Araquém procura Júlia, que reconhece na foto o homem que, por imprudência, tinha lhe aleijado. O homem que dissimulara e produzira uma farsa para fugir da responsabilidade do ato cometido. O homem que gastara uma pequena fortuna para não assumir seu infortúnio, deixando a vítima à mercê de sua desgraça. E, como a justiça é cega nada viu. Araquém telefona para Herculan e confirma o reconhecimento da foto. Trinta dias são passados, quando Araquém recebe o relatório final de Herculan Decrois.
O INVESTIGADOR HERCULAN DECROIS.
30 de março de 1997, as 13 horas e trinta minutos, circuito de Interlagos, setenta e duas voltas de 4.292 metros, Grande Prêmio Brasil. Roncam os motores, Herculan com seu telefone celular na mão, procura falar: - É o Sebastião? Onde você está?
- Estou próximo, logo estarei junto de você.
Assistiram à corrida, que foi ganha por Jacques Villeneuve, correndo com carro Williams.
Decrois convida Sebastião para limpar a goela. Ambos se dirigem para uma tenda onde vendem bebidas e sentam-se a uma mesa. Herculan pede uma cerveja e dois copos. Comentam a corrida, enquanto bebem cerveja. Já na quinta garrafa, Decrois estimula Sebastião a voltar para o Rio de Janeiro, fazendo alusão às praias, ao clima e às farras que a cidade propicia. Chega ao exagero de dizer que não sabe como ele consegue, depois de viver no Rio, aturar São Paulo. Sebastião diz que tem de estar onde há trabalho. Decrois lhe diz:
- E o seu amigo, aquele do acidente, não pode lhe ajudar, ele não é influente proprietário de empresa, por que não o leva para trabalhar na sua própria empresa?
Sebastião fica pensativo e diz:
- Não, para ele é mais conveniente que eu trabalhe em uma logística, em que a empresa dele é cliente e assim eu posso cuidar dos seus interesses. Foi assim que nos conhecemos e fizemos amizade. Pelo interesse que ele tinha que eu, dentro da empresa que trabalhava, antes no Rio, e agora em São Paulo, cuidasse dos interesses dele.
Decrois pensa: Tenho de descobrir nem que seja o nome da empresa desse cara. Arrisco uma pergunta à queima-roupa ou não?
- Garçom, mais uma cerveja. Mas Sebastião, esse seu amigo, lhe dá alguma coisa até hoje?
- Não, no entanto tenho o meu emprego garantido por ele, que tem grande influência na empresa em que trabalho. Mas Decrois, fale-me sobre você.
Merda, tenho de inventar alguma coisa.
- Quando jovem, eu queria ser jogador de basquete. Não levei jeito, pois sempre gostei mesmo era de praia, vida mansa, muitas mulheres, bastante bebida, farra todas as noites. Até que meus pais morreram em um acidente de carro, em dois anos, terminei com a herança que me tinham deixado. Aí tive que trabalhar para me manter, tive diversos empregos, até ser contratado pela lista e aqui estamos. Garçom, mais uma cerveja. Mas Sebastião, qual é o seu projeto de vida para o futuro?
Sebastião conta sobre suas ambições e perspectivas de futuro, tudo dentro do trivial, como troca de carro, melhora no apartamento e outras coisas mais.
Agora, sim, já está no ponto, posso fazer a indagação, esse merda nada vai notar.
- Garçom, mais uma cerveja. Na verdade, Sebastião, estou querendo sair da Lista, e arrumar um novo emprego. Será que você não pode me dar uma força com esse seu amigo empresário. Ao menos dar uma indicação para que eu possa mandar um currículo, mencionando que sou seu amigo. Eu trabalho bem em propaganda e eventos.
- Não, as empresas dele são sediadas no interior, em pequenas cidades oceânicas, ele trabalha com pescado, você não quer trabalhar no interior, quer?
- Não.
– Nem eu.
Filho da puta, não fala mesmo. É mais liso que sabão encharcado, vou terminar com esse enrosco.
- Garçom, a conta.
- Foi um prazer conhecê-lo, Sebastião.
Os dois homens se despediram. Decrois pegou um táxi e foi para o aeroporto de Congonhas. Durante o vôo, Decrois, com os olhos fechados, pensava: O negócio é obter uma lista de clientes da empresa na logística do Rio, no ano de oitenta e três e uma na logística de São Paulo. A que trabalha com pescado que constar nas duas relações será a que procuro.
Ao chegar ao Rio de Janeiro, Decrois vai direto para a Internet, entra no site da empresa logística do Rio de Janeiro, consulta a lista de clientes e encontra trinta e sete clientes cadastrados: três são do ramo da pesca. Consulta a de São Paulo, quatro são do ramo da pesca, única coincidente: Pesca Oceânica Ltda. Nunca foi tão fáci.,Essa é a empresa que procuro, vamos ver o que diz o site? O colosso humano: procura o site da empresa Pesca Oceânica Ltda. O detetive viajou para a cidade de Porto Velho. Vestia um terno de linho, chapéu Panamá, com seu tradicional óculos refletivo, falando com um sotaque holandês, sua origem. Chega à Pesca Oceânica. A recepcionista o atende.
- Que deseja senhor?
Decrois, falando com sotaque holandês, diz:
- Falar com o responsável por exportação.
- A quem devo anunciar? sou Herculan Decrois, cidadão Holandês, tenho diversas representações no meu pais de origem que estão interessadas na importação de produtos.
- Queira me acompanhar, por favor. Este é o Sr. Homero Lampert, gerente de exportações da Pesca Oceânica Ltda. Este é o Sr. Herculan Decrois, representante comercial para importações da Holanda.
Homero expõe, a Decrois um ligeiro histórico da empresa, seus principais produtos tipo exportação, informa que se trata de uma empresa familiar, herdada pelo Sr. Renato Corso, com grande habilidade, tanto comercial como industrial e de um grande espírito de empreendedor. Decrois fala das empresas holandesas que representa. Com brevidade, Homero comenta o infortúnio sofrido por Renato Corso, com a perda de sua esposa, em um acidente de carro, em dezembro de 1990, e que, atualmente, se dedica de corpo e alma aos negócios. Herculan, no dia seguinte, vai à biblioteca municipal.
Um prédio de três andares, onde na entrada se lia: - Biblioteca Municipal Paulo Setúbal, expediente das 8:30 às 12:00 e das 13:30 às 17:00. O imenso corpo vence dois lanços de escadas, uma porta envidraçada, com duas partes móveis, com um aviso: Mantenha fechada, ar condicionado. Sentada atrás de uma escrivaninha, tendo a sua frente um microcomputador, uma jovem levanta as vistas e se assusta com aquela robusta presença, que lhe diz:
- Bons dias, minha jovem, estou interessado em tomar conhecimento das obras disponíveis, também em jornais e revistas locais.
A atendente, esboçando um simpático sorriso, aponta para um dos corredores e diz:
- Esta é a seção de livros, todos separados por gênero e escritores. Ao fundo, estão as revistas e jornais locais. Caso queira copiar, há na direita do setor de jornais, uma máquina de reprografar, custa dez centavos por cópia.
O grande visitante, em sinal de agradecimento, fez uma mesura e se dirigiu ao setor de livros, onde examinou alguns compêndios, como o de J.J. Benitz Operação Cavalo de Tróia. E, finalmente, chegou onde estavam os jornais. Procurou nos jornais locais o de dezembro de 1990. Na página frontal, um retrato com a seguinte manchete: “Morre Margarita Corso”. Herculan tira diversas cópias, de outros jornais, e no centro coloca o retrato da vitima. Ao sair, apresenta as cópias em número de doze, paga, R$1,20, agradece à senhorita e se retira.
ARMANDO FERRI (Arman)
Araquém manda chamar seu fiel escudeiro, o Sr. Armando Ferri. O caro Arman, como carinhosamente lhe chama Araquém. Ao chegar, Arman toma conhecimento de todo o caso Júlia, examina o dossiê Decrois e diz:
- Araquém, estou ao teu dispor para o que desejares.
- Contava com isso, caro amigo. Inicialmente, quero que me ajudes a arquitetar um plano, para que, no final, possamos dar uma indenização em espécie para a Júlia, digamos, em torno de um milhão
de reais. E que o homem pague pelo que fez.
- Acho a missão de difícil realização, haja visto que o alvo é uma pessoa de grande projeção no cenário nacional e também no exterior.
- É, de fato, teremos de agir com muita cautela. – assentiu Araquém.- No entanto, já tenho um plano que, com o seu auxílio, poderá ser melhorado.
Araquém expõe o plano a Arman, ambos discutem-no demoradamente por uma semana, examinando todas as suas fases, nos mínimos detalhes. Ao final, dão-no como exeqüível. Pela complexidade de sua realização, duraria, no mínimo um ano, com um custo aproximando de um milhão de reais.
Arman chega ao Cristal Shopping, na grande Rio, à procura de um artista que grafita caricaturas de pessoas ou de retratos. Lá estava um jovem sentado em uma cadeira de rodas. Ao seu redor, havia diversos trabalhos, todas as encomendas já prontas para entrega.
- Bom-dia, meu rapaz! - diz Arman. Alcança-lhe uma página de jornal interiorano, que expunha uma foto. Quero que me faça uma caricatura dessa foto, quanto tempo demora?
- Será breve, basta o senhor dar uma volta no shopping, e logo estará pronta.
- Vou esperar aqui mesmo, apreciando seu trabalho.
É impressionante a idéia de Araquém, O artistas capta os traços mais fortes da pessoa, quando faz a caricatura,de todas as pessoas que possuam estes traços. Bastam os detalhes como cor e o modo de posicionar os cabelos, cor dos olhos e jeito de falar, para que uma pessoa se pareça com a outra.
Passados alguns minutos, o trabalho estava pronto, Arman pagou o rapaz e se retirou.
CAPITULO VII
À PROCURA DE UMA ATRIZ:
Araquém manda imprimir centenas da caricatura, contendo também as regras para o concurso, intitulado “à procura de uma Atriz”. A candidata teria de se parecer com a caricatura, falar mais de uma língua estrangeira, e ser, obrigatoriamente, uma artista da noite, com idade entre 21 e 35 anos. A escolhida teria um contrato milionário para uma única representação. Currículos com fotos deveriam ser enviados à Caixa Postal, nº 224, Rio de Janeiro, agência Centro.
Arman e Araquém recebem centenas de candidatas. Escolhem dez finalistas, e as convidam para uma entrevista, individual, em dias diferentes. Eles próprios iam à origem para a entrevista. Ao final, por unanimidade, foi escolhida a candidata. Uma jovem de 23 anos. Arman toma a incumbência de preparar a atriz para a grande encenação. Em regime de trabalho de oito horas diárias, a atriz recebe aulas de comportamento social, etiqueta social e aperfeiçoamento nas línguas alemã, inglesa e Francesa. Araquém se dedica ao estudo de seu novo personagem. Um ano se passa, os atores, acompanhados de Arman, fazem uma viagem à Europa, passando diversos dias, em Paris, outros tantos em Londres e finalmente em Berlim. Ao retornarem ao Brasil, fazem uma reunião para costurarem os últimos detalhes.
Tomando a palavra, disse Araquém Nórton:
- Eu vou representar o papel de um oceanógrafo, Sr. Ricardo Branda. No último ano, estudei tudo sobre cadeia alimentar e sobre pesquisa relativas a tais cadeias. Eu me encontro plenamente preparado para a ação. Madalena Junqueira fará o seu próprio papel, usará o seu próprio nome, e será tratada como a senhora Branda. Madalena! Não esqueça, você não cederá aos assédios, sem antes terem comunicado ao Sr. Branda, ou seja, a mim. Arman fará o papel de Alexandre Masoc, um motorista e amigo do Sr. Branda.
Alguma pergunta final?
- Eu tenho uma pergunta? - disse Madalena! - E, se eu não gostar do homem para casar?
- Isso será uma decisão de foro íntimo! A missão estará finda no momento em que obtivermos a indenização para a vítima, no caso, Julia Menezes Pereira. No final, ninguém mais falará em Ricardo Branda, afinal ele nunca existiu.
ARAQUEM NÓRTON:
Arman estaciona o carro, Araquém Nórton desce e se dirige à porta principal da modesta casa de Júlia Menezes Pereira. A campainha é tocada, a porta se entreabre, a voz no interior da casa determina que entrem. Araquém e Arman adentram na modesta casa. Júlia sorrindo, movimenta a cadeira de rodas na direção dos dois homens e lhes estende ambas as mãos. Arman pega a mão esquerda de Júlia e Araquém, à direita, e quase que ao mesmo tempo ambos beijam-lhe as mãos. Arman diz:
- Muito prazer em conhecê-la Júlia, permita que me apresente: Sou Arman, amigo e colaborador do Sr. Araquém Nórton. Araquém por sua vez, diz:
-Minha cara, Júlia! Damos por encerrada a nossa missão e viemos lhe trazer os resultados.
- Júlia convida-os a sentar nas poltronas, à sua frente. Araquém Nórton conta-lhe nos mínimos detalhes, todo o desenrolar da trama. Ao final do relato, Júlia enxuga as lágrimas, que lhe corriam pelo rosto. Araquém, ao final lhe diz, segurando-lhe ambas as mãos:
- Júlia, eis o resultado final. Tirados todos os investimentos, você terá uma indenização, da parte do Sr. Renato Corso, seu agressor, na ordem de R$ 1.235.000,00, que está depositado em uma conta pessoal, em seu nome, no Banco Norte-americano de Investimentos.
De volta ao sítio, Arman acabara de ler a correspondência e diz a Araquém:
-Temos novidades. Madalena escreveu e está realmente apaixonada por Renato Corso. Já programam a concepção de um herdeiro, e estão de partida para um cruzeiro ao redor do mundo. Aqui tem outra carta, que diz contar com sua ajuda. Trata-se de uma jovem de trinta e oito anos que deseja ser recebida por você, para lhe expor o seu problema pessoalmente. No entanto, diz que se trata do desaparecimento de sua filha. Ah, aqui tem outra, que parece ser bem interessante. Um homem chamado Manfred Murdoc diz que quer lhe vender uma fábrica de tecidos.
- Responda à Madalena, para que sejam felizes para sempre, pois eles merecem, e um feliz cruzeiro. Para a jovem de trinta e oito anos, que perdeu a filha, que procure a polícia. Ao tal Manfred, diga que não estamos interessados em adquirir fábrica de tecidos.
Nesse momento, toca o telefone, Arman atende uma voz que diz:
- É da residência do Sr. Araquém Nórton?
- Sim, Arman falando.
– Posso falar com o Sr. Araquém?
– Quem deseja?
- Sou um ancião de oitenta e cinco anos de idade, moro sozinho com minha neta. Estou enfermo, não posso me levantar, minha neta trabalha para uma das casas do Sr. Araquém ou que foi do Sr. Araquém.
faz três dias que minha neta não volta para casa, minha situação é periclitante, faz dois dias que nada como, apenas bebo água ,que fica à minha disposição, para tomar os remédios. Tenho certeza de que minha neta não me abandonou; algo teve ter acontecido com ela. A única referência que tenho é o telefone do Sr. Araquém, a quem ela disse que eu deveria recorrer, quando em extrema necessidade.
– Sr., dê-me seu endereço, nos lhe procuraremos.
Ah, Sim, essa é uma outra estória. Até breve.