EU, O CURRAL E O VAQUEIRO.
Zé Campo era um homem calado, sempre com uma barba por fazer, homem de poucas palavras e muita atitudes, só tinha uma pessoa que acordava antes dele, eu, eu mesmo, Frederico como dizia minha vó, pois mal amanhecia o dia eu já estava lá, trepado na cumeeira da porteira, mais parecia um macaco, macaco não, um soin, pois eu era muito pequeno, tinha uns seis anos, e adorava currais, gados e cavalos, esse era meu mundo, não nessa ordem necessariamente. De cima da porteira eu avistava o sol, saindo por trás da serra, fazendo a silhueta das copas das árvores. De lá eu ouvia as esporas e o picarro do velho vaqueiro, ele vinha com uma panela na mão, na outra um pequeno tamborete e uma pêia. Fumava um cigarro de palha,a cinza era imensa e nunca caia, caricaturando o vaqueiro solitária. Ele não falava comigo, olhava para mim e sorria, era um cumprimento que eu adorava. O gado dentro do cural ficava inquieto, como à anunciar a sua chegada. A bezerrada espertava, como anunciando que algo ia acontecer. Ela não dava atenção para ninguém, vinha somente em direção a porteira, por instante parava, como se a contar os pequenos, depois voltava a caminhar até a porteira, só resmungando......
-- ou, ou, ou, nonossilábicamente.
Abria os dois paus debaixo, pegava à pêia e chamava..
--- ande, ande, ande, ou, ou, ou
E o bezerro que ele queria, entrava no curar, a mãe dava dois berros no meio da vacada e o bezerro corria em sua direção, Zé Campo fechava os paus e adrentava no seu palco, onde ele era rei. No caminho até a vaca ele dava uma espiada no restante, como se fosse um medico, ou um engenheiro observando sua obra, levandava um rabo dum, pegava na perna de outro, alisando um aqui, resmungando com outra ali.....
- - mimosa, mimosa, ou, ou, ou....
Quando chegava na vaca, falava com ela, passava a mão pelo pescoço e puxava o bezerro, amarrando-o na pata de trás da mãe, com a pêia, depois pegava a panela, tirava uma folha grande de não sei o quê, sentava no tamborete, passava a folha nas tetas da vaca, dava duas ou três batidas pra cima no úbere da mesma e começava o ritual, lá de cima da porteira eu só ouvia o som metálico do fiapo do leite na panela e o galo Campina no sabiá.
POVO MARCADO. É POVO FELIZ
FRED COELHO/2018