1022-PRISIONEIRO DOS CANIBAIS

Capítulo 10 de "O Desaparecimento do Coronel Fawcett"

Escondido nos galhos mais altos das gigantescas árvores da floresta amazônica, ou “Inferno Verde” e impossível de ser percebido por quem caminhasse no chão, escondido, Xan-Kiorá, o “índio invisível” seguia a pequena expedição desde a saída da taba de seu pai. Sua curiosidade pelos movimentos dos homens brancos era muito grande. Quando rumaram para as terras do Kala-Paios, desviando-se por caminhos ínvios, teve certeza que os seus inimigos não os deixariam passar.

Não lhe passou pela cabeça que poderia avisar a pequena expedição do perigo que corriam, pois, no seu modo independente de viver, enfrentando ele mesmo todas as situações de perigo, pensava que os brancos e índios sabiam do que viria pela frente. .

Acompanhou-os dia e noite, só se afastando para caçar e comer a carne de pequenos animais. Viu de longe os Kala-Paios movimentando-se sorrateiramente e assistiu ao ataque. Nada pode fazer, devido ao grande numero dos atacantes.

Os prisioneiros foram marrados pelos pulsos e atados à uma grossa corda de fibras, ligando uns aos outros. De tal forma que a caminhada se tornava exaustiva, já que tinham de acompanhar a marcha rápida dos seus captores,

Pelo caminho, Fawcett, apesar do cansaço produzido pela marcha forçada, foi observando os seus captores.

— Tenho certeza de que fomos pegos pelos índios Kala-Paios. — Cochichou a Raleigh. — Sim, são eles! Selvagens muito cruéis. Não sei o motivo de não nos terem matado quando nos viram.

Fawcett não podia seque imaginar o terrível destino que estava lhes reservado.

Mas Xan-Kiorá que tudo observava do alto de uma árvore, sabia qual o futuro dos dois homens brancos prisioneiros e indefesos, e os cinco índios que os acompanhavam.

O índio invisível seguiu-os até que chegaram á taba dos canibais. As mulheres e crianças se aproximaram e conversavam entre si. Pareciam medrosas ou receosas, pois elas jamais tinham visto homem branco.

Foram levados para a taba com choças maiores do que a taba dos Kui-Kurús. Ao redor, num amplo circulo exterior, longas e muitas varas de bambu, ostentando pequenas cabeças.

Um arrepio frio fez o corpo de Fawcett estremecer.

— São cabeças de macaco? Perguntou Raleigh.

— Não, cabeças de gente, mumificadas. — Fawcett sabia dessa prática do Kala-Paios. — Devoram seus inimigos e “curam” as cabeças, de forma que vão diminuindo de tamanho. Veja como os cabelos são compridos. Eles não encolhem.

Os dois brancos e os cinco índios Kui-Kurús foram amarrados nas diversas estacas cravadas no chão do terreiro redondo, entre as ocas de tabocas, cobertas de palha. As mãos presas ao alto, os pés fortemente atados em baixo, forçavam os prisioneiros a se manterem de pé. O inclemente sol tropical da tarde luminosa era mais um tormento para os prisioneiros. A fumaça ardida da fogueira central, que nunca se apaga, era levada por vezes para o local das estacas, e os homens tossiam e sufocavam-se.

Os índios a tudo suportavam silenciosamente. Raleigh e Fawcett se queixavam mutuamente da posição, das câimbras, do sol, da sede e da fome.

O entardecer foi longo para os prisioneiros. O movimento da taba se intensificou: uma grande porção de galhos secos foi amontoada no centro do terreiro, ao lado da fogueira. Índios e índias entravam e saiam das ocas, preparando o terreno para algo que os prisioneiros não entendiam, ou, se entendiam, fingiam não saber. Chuços foram aparados e encostados a um a estaca com forquilha. Uma enorme vasilha de barro foi colocada numa armação acima da fogueira. E muitas vasilhas de barro, de diversos tamanhos, apareceram ao redor da tranqueira de galhos e da pequena fogueira.

Ao anoitecer teve inicio o festival de horror. Uma o fogo foi ateado na galhada, produzindo uma grande fogueira. Ao som de dois tambores rústicos, teve inicio uma dança de muito índios: os corpos brilhando, pintados de vermelho e negro.

Com gestos e meneios significativos, macabros, os índios, entre pulos e gritos, procuravam mostrar o que iria acontecer ali, naquela noite de terror. Quando os índios pararam a dança, os corpos ainda mais brilhantes devido ao suor escorrendo nos corpos lambuzados de tinta, o pajé entrou em cena.

Aparatado de modo bizarro, com cocar de penas negras no meio da quais uma caveira exibindo um sorriso tétrico e longas tiras de contas, sementes e dentes dependurados no pescoço.

Vinha vestido para um sacrifício.

ANTONIO ROQUE GOBBO

Belo Horizonte, 13 de julho de 2017.

CONTO # 1022 da Série MILISTÓRIAS-PLUS

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 10/01/2018
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