O Menino e o Lobo
Terra era um garoto esperto. Uma espécie de Joãozinho da vida, do tipo que dá nó até em pingo d'água. Como vinha de família pobre era preciso ser mais esperto ainda para sobreviver. Estava sempre inventando alguma coisa para ganhar alguns trocados, mas seu sonho era mesmo ficar rico, só não sabia como.
Um dia, decidiu que queria ser padeiro. Foi até a padaria da cidade pedir emprego. O dono da padaria vendo aquele menino, com apenas 12 anos de idade e cheio de entusiasmo, resolveu colocá-lo como entregador de pães. Naquela época, os pães eram entregues em casa, saiam vários homens montados em bicicletas com cestos de pães oferecendo às pessoas, cada um recebia de acordo com a quantidade de pães vendidos.
Terra gostou da ideia e no dia seguinte chegou bem cedinho para seu primeiro dia de trabalho. Como primeira missão recebeu a incumbência de vender pães para o padre da cidade. O padre não era de Deus, reclamava de tudo e de todos, era o verdadeiro representante do mau humor na terra.
Tinha o hábito de escorraçar qualquer um que aparecia para lhe oferecer alguma coisa, ainda dava um sermão chamando todos de falsos católicos porque não iam à missa. Depois de ouvir todas as histórias dos colegas sobre o padre, Terra já foi apelando para tudo quanto era santo para que o ajudasse. Pensou logo em fazer uma promessa, porém não conseguia lembrar o nome de algum santo que ainda não tivesse prometido alguma coisa, pois prometer era fácil, difícil era cumprir a promessa e sabia que estava mais sujo que poleiro de galinha com os santos.
Lembrou-se do Divino, para esse ainda não tinha prometido nada. Mas prometer o quê? Não mentir para a mãe? Não, isso era difícil de cumprir. Talvez algo mais fácil, do tipo: ir à missa aos domingos? Também não! Estava sem sapatos e o padre já tinha dito que era feio andar descalço o que ocorreu na última vez em que foi à igreja, quando o prego do cabresto da sandália tinha saído e teve que abandoná-la no meio do caminho. Sem definir o que prometer, nem percebeu que já tinha tocado a campainha da casa do padre.
O padre abriu a porta, e com as pernas e voz trêmula, terra perguntou: - Padre quer comprar Padre? O Padre respondeu: - Você quer dizer comprar pão, não é meu filho? E emendou: Com certeza foi Deus que te enviou para trazer esses pães tão quentinhos, acabei de passar um café delicioso! Que maravilha! Vou comprar sim.
Terra não acreditava no que ouvia. Aquilo era um milagre! Lembrou-se do Santo, o que tinha prometido mesmo? Não se lembrava, sabia apenas que seria mais uma promessa sem cumprir. Depois disso, ganhou moral na padaria. Mas o que ganhava mal dava para o pão e não via a hora de ficar rico. Tinha o sonho de comprar uma casa para a mãe e uma “boneca que fala” para a irmã Kelly.
Um dia quando voltava para casa viu um moita se mexendo, quando foi verificar era um cachorrinho pequeno e bastante machucado, ficou consternado, levou-o para casa. Sua mãe brigou horrores porque era mais trabalho e gasto, mas também tinha coração mole e deixou-o ficar até que se recuperasse.
Depois que o cachorro se recuperou perceberam que se tratava de um lobo. Uma espécie de lobo Guará. Ele cresceu e sua natureza era dócil, além de ser muito obediente ao garoto Terra. As crianças da vizinhança adoravam ir vê-lo brincar com seu dono, sem nunca machucá-lo. A história do menino que criava um lobo, logo se espalhou na cidade.
Diante dos boatos e da procura pelo lobo, Terra, depois de ir ao circo, teve uma idéia brilhante, imaginou que com essa ideia ficaria rico. Começou a levar o animal para a praça da cidade, lá ele mostrava o lobo para as pessoas e ainda fazia alguns truques, como fazê-lo levantar a pata, enquanto isso, as pessoas contribuíam com alguns trocados. Assim, todos os domingos ia para a praça com o lobo, não só pelos trocados, pois gostava mesmo era da diversão. Àquela altura, o lobo era seu melhor amigo, apesar de sua mãe sempre alertar que um dia o lobo iria mordê-lo.
No entanto, alegria de pobre dura pouco, dias depois, chegaram uns homens em sua casa e levaram o lobo, alegaram que era proibido criar lobos em casa, queriam até prender seus pais. Aquele foi um dia de muita tristeza para todos da família, que já estavam apegados ao lobo.
Terra cresceu, mas ainda hoje sonha com seu amigo lobo, nos seus sonhos, ele esta livre e feliz vivendo com seus muitos filhos na região do Jalapão em meio a tantos outros animais. Contudo, sempre que passa no morro do céu, em Goiânia, ao invés de ver a "mulher de branco" que assusta os motoristas, ele vê os olhos do lobo que sem palavras diz: estou te olhando, meu amigo.