1018-NA ALDEIA DOS KUIKUROS -

O Desparecimento do Coronel Fawcett - 6a. parte

Ao chegaram à taba, noite fechada, Fawcett, Jack e Raleigh quase nada puderam observar á parca luz da fogueira que era mantida acesa no centro os terreno.

Foram praticamente jogados, ainda de mãos amarradas, no escuro antro de uma pequena oca, cuja única abertura, que se podia chamar de porta, foi coberta por uma pesada esteira.

No escuro conseguiram aconchegar-se para se aquecerem na madrugada fria. Às apalpadelas, tentaram desamarrar aos pulsos uns dos outros, mas estavam fortemente amarrados com tiras de couros, que haviam sido umedecidas, e que apertavam cada vez mais os pulsos, ao se secarem.

Amanheceu. Já antes do sol aparecer por entre a densa folhagem, a movimentação na taba era grande. Os prisioneiros foram arrastados para a praça ao redor da qual se erguiam mais de uma dezena de cabanas redondas, de paredes de barro e cobertas de capim. Em um extremo, havia uma cabana duas ou três vezes maior que as demais.

Estavam na taba dos Kui-Kuros, entranhada no meio da densa floresta, num remotíssimo sítio do Inferno Verde.

No centro, onde os brancos tinham visto uma pequena fogueira na noite agora havia uma tranqueira de galhos, troncos e muitas folhas secas.

Estendidos perto do monte de galhos e paus encontravam-se os corpos dos três índios mortos na embosca da tarde anterior.

Enquanto eram desamarrados, Fawcett falou com Jack e Fawcett:

— É uma fogueira para queimar os corpos dos índios.

— Todos são queimados, quando morrem? — indagou Fawcett.

Fawcett, que conhecia os rituais das tribos amazônicas, esclareceu:

— Não, só os que morrem em batalha. Os que morrem de velhice ou por

morte natural são colocados num local sagrado sob montes de pedras.

Os pulsos, livres das tiras de couro, sangravam. Os pés doíam pela longa caminhada na véspera. Tiveram de permanecer de pé, como todos os índios e índias que rodeavam praça. Um índio com cocar de penas pretas e colares de muitas voltas no pescoço, o corpo tinto de vermelho e negro – o pajé – fez uma dança ao redor dos corpos e foi seguido por mais meia dúzia de índios, pintados de vermelho e amarelo nas faces, nos peitos, e nos braços.

Terminada a dança, a fogueira foi acesa e quando as labaredas atingiram grande altura, os copos dos índios nela foram lançados. Imediatamente começaram a queimar, duma fumaça escura e de um fedor insuportável.

— Os corpos foram untados com gordura e resinas, para que se queimem rapidamente. — Novamente a experiência e o conhecimento de Fawcett era passada ao filho e ao amigo.

Queimados os corpos, restou um redondo de cinzas ainda fétidas, em torno do qual os índios se sentaram. Os brancos foram instados a se sentarem, fazendo parte de um grande círculo.

Em seguida, as índias trouxeram gamelas com frutas e comida. Outras vieram com enormes folhas de bananeiras, que envolviam peixes abertos e cortados em pedaços, os quais foram postos a assar sobre as cinzas e brasas da fogueira.

Todos comiam as frutas e quando os peixes começaram a assar, beliscavam a carne, misturando-as com outras comidas das gamelas, levando-as à boca com aparente deleite e conversando entre eles. .

Fawcett aconselhou aos amigos:

— Vamos comer como eles fazem. De outra forma, se nós não comermos, eles não vão gostar.

Comeram com as mãos, imitando os índios. A princípio, as estranhas frutas de sabores vários; depois beliscaram os peixes, tirando lascas de carne já assada, misturando com uma espécie de farofa muito ardida.

— Afinal, ponderou Jack, a comida até que está boa. O ruim e este cheiro das cinzas.

— Bem, estamos vivos e alimentados. Quanto a cheiros, vamos ter que nos acostumar com eles,

Terminada a comilança, os três foram empurrados de volta para dentro da pequena oca.

— Esta cabana é muito pequena prá nós três. – Disse Raleigh. — Mal dá para nos estirarmos no chão.

— E parece que faz tempo que não é habitada. Essa quantidade de folhas secas no chão e a poeira...

Enquanto falavam, a esteira-porta foi jogada sobre abertura única, tapando a claridade do sol tropical, que já avia despontado e lançava seus raios quentes sobre a taba e a floresta infindável.

Ficaram na semi-obscuridade, tentando descansar.

Jack observava pelas frestas da cabana, a movimentação de índios e índias pela taba.

Raleigh, com a ferida da perna novamente aberta, exposta, sem nenhum tratamento, sofria sem um lamento de dor.

Fawcett, também se aproximando de uma fresta mais larga, por onde entrava uma boa claridade, procurou sua sacola com o mapa e com papeis e lápis, e se pôs a escrever o seu diário e marcar os dias decorridos.

O mapa estava perfurado em dois locais, ode as lanças dos índios haviam machucado Fawcett, mais ainda permitia ser consultado.

Lá estavam as indicações de locais cujo acesso estava se tornando cada vez mais difícil.

ANTONIO ROQUE GOBBO

Belo Horizonte, 4 de julho de 2017.

Conto # 1018 da Série 1.OOO HISTÓRIAS PLUS

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 24/08/2017
Reeditado em 24/08/2017
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