EM ALGUM LUGAR DA SIBÉRIA
Antes dos MUNDOS PARALELOS ® entrarem em colisão...
Ano 1973.
Enquanto isso, em algum lugar da Sibéria...
Dois sinistros agentes do Komityet Gozhudarsveni Bezopasnosti (Comitê de Segurança do Estado), a temível KGB; tinham Martin Juan Sarrazin amarrado numa cadeira, dentro de uma sala escura; que fedia a cigarro e vômito rançosos. A luz branca de um pequeno refletor feria seus olhos.
–Agora fique quieto – disse um deles, o mais mal-encarado.
–Ia nye govoryu! – disse Sarrazin em tom desafiante.
–Não perguntei nada – disse o outro agente, o que parecia mais sociável.
De repente, bateram à porta. O primeiro agente, o mal-encarado disse:
–Deve ser o camarada Lubakov.
–Abra a porta, Ivan Vasilievitch – disse o outro.
Em seguida, entrou um homem de meia idade, bem vestido e sorridente.
–Camarada Iván Vasilievitch! Como está? – disse o recém chegado.
–Muito bem camarada coronel.
O recém chegado então se dirigiu ao outro e o beijou em ambas faces:
–Yuri Alexeievitch! Quanto tempo!
–Seja bem-vindo, Anatoly Ivanovitch.
–Vocês têm chá?
–Há um samovar, na outra sala, camarada – disse Ivan – vou buscar.
–Ótimo – disse o recém chegado tirando o pesado capote e o gorro de pele.
Assim que Ivan saiu, Yuri disse:
–Vou buscar mais uma cadeira, camarada. Fique à vontade.
–Spacibo – disse Lubakov tirando o paletó que pendurou no cabide da parede, sem olhar o prisioneiro.
Em seguida tirou a gravata vermelha que pendurou junto com o paletó e arregaçou as mangas da camisa listrada de branco e azul, deixando a mostra as mangas compridas de uma grossa camiseta branca de algodão.
Sarrazin estava cada vez mais apreensivo.
Sem dizer palavra, Lubakov deu um soco de direita no estômago do prisioneiro, e sem intervalo, um soco de esquerda que o fez cair para trás com cadeira e tudo. Sarrazin ficou sem ar e sem forças para gritar. Apenas estrebuchando, apavorado.
Ivan entrou portando uma bandeja com xícaras de porcelana e uma chaleira.
–Ah! – Lubakov desentendeu-se de Sarrazin no chão, amarrado na cadeira e retorcendo-se de dor, e serviu-se chá que bebeu com deleite.
Ivan pareceu não perceber que o prisioneiro estava no chão, e disse:
–O chá é novo, Anatoly Ivanovitch. Quer um pedaço de bolo de maçã?
–Quero, sim, camarada. Acredita que não tive tempo de almoçar?
–Deve estar com fome, camarada coronel. Vou buscar bolo e alguns brioches.
–Por favor.
Ivan saiu e novamente o prisioneiro ficou sozinho com o sinistro Lubakov, que pareceu se transformar numa máquina de produzir dor. Lubakov endireitou a cadeira do prisioneiro apavorado que gritou:
–Está bem, pare! Pare! Ia govoriu...! Ia govoriu...!
–Não perguntei nada – disse o coronel desferindo um potente soco de direita no estômago de Sarrazin, que gemeu de dor – e não autorizei você a falar.
Um soco de esquerda no peito do prisioneiro o fez cair para trás. A porta abriu-se e entraram os agentes. Lubakov desentendeu-se de Sarrazin estrebuchando no chão e serviu-se mais chá, pegando um brioche da bandeja.
–Delícia – disse, saboreando e demonstrando prazer com os olhos bem abertos.
–Os brioches chegaram uma hora atrás – disse Ivan – mas o bolo é de ontem.
–Deve estar ótimo. Bolo do dia anterior sempre é mais gostoso.
Enquanto Lubakov bebia chá e comia brioches e bolo, os agentes endireitaram a cadeira do prisioneiro, que gemia de dor pela surra, cordas apertadas e quedas.
-Precisamos que ele diga onde os mercenários vão atacar e quanto armamento e de que tipo eles possuem, camarada Anatoly Ivanovitch – disse Yuri.
–Assim que acabar meu lanche, camaradas, vocês podem me deixar sozinho com ele, que vou fazer-lhe algumas perguntas. Agora vamos falar de amenidades. Por onde andou nos últimos seis meses, Yuri Alexeievitch? Como está a família?
–Estive em Riga, camarada. E tenho mais um filho.
–Isso é ótimo! Parabéns, camarada!
Dolorido, Sarrazin assistiu uma conversa de compadres por dez minutos, até Lubakov acabar seu lanche, acender um fedorento cigarro russo e dizer:
–Agora saiam camaradas, que vou conversar com esse moço.
–Nyet! – gritou Sarrazin –Não me deixem aqui sozinho com ele!
–Vi govorítye? – Perguntou Ivan.
–Da! Da! Ia govoriu!
–E quem garante que vai dizer a verdade? – acrescentou Yuri.
–Tem razão, camarada. Saiam por trinta segundos, que vou convencê-lo.
Ivan e Yuri saíram antes que Sarrazin gritasse de novo.
Lubakov desferiu seu soco de direita e logo o de esquerda; e quando a cadeira caiu, aplicou dois pontapés no estômago do prisioneiro. Em seguida endireitou a cadeira e esbofeteou várias vezes o rosto de Sarrazin, que encontrou forças para gritar com voz rouca:
–Pare! Ia govoriu!... I Speak! Ich spreche! Je parle! Parlo! Hablo! Falo!
A porta abriu-se e entraram os agentes, para alívio do prisioneiro.
–Pode perguntar, camarada – disse Lubakov – ele parece disposto.
–Primeira pergunta – disse Ivan – você acha que acreditaríamos que você é tão mole a ponto de ceder após meia dúzia de socos e pontapés?
–Nyet... – disse o prisioneiro num acesso de tosse.
–Em efeito. Não acreditamos – disse Yuri.
–Por isso passaremos a usar meios técnicos – disse Lubakov – choque elétrico, cirurgia de pele e testículos, manicure, e outros itens que temos na gaveta, isto no caso de não termos Pentotal, o soro da verdade, mas por acaso temos.
–Neste caso seria bem melhor – disse Ivan.
–Não queremos que você se machuque... muito – disse Yuri – estragaria sua aparência, tovaritch, e não é o caso.
–Se quiséssemos matar você depois; isso não importaria – disse Ivan.
–Acabou! – disse Lubakov – acendam as luzes!
As luzes foram acessas e Sarrazin encontrou-se num palco, com quarenta mercenários assistindo à aula de tortura.
Yuri desamarrou as cordas do infeliz, que se levantou cambaleando, tossindo e apoiou-se na mesa para não cair de joelhos; com vontade de vomitar; totalmente abalado pela dor, mas conseguiu sorrir amarelo para a estarrecida platéia:
–Camaradas, não acham que mereço pelo menos um aplauso?
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PRÓXIMO: A DERROTA
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O conto EM ALGUM LUGAR DA SIBÉRIA - forma parte integrante do romance inédito HISTÓRIA DE MARTIN ® – Volume II, Capítulo 17; páginas 48 E 49.