917-TRANSFORMAÇÕES- A Ampulheta- 6a. parte

Ao acordar da hipnose, Mario ramos sentiu-se como que aliviado. Parecia que um grande peso havia sido tirado de seus ombros. A cabeça leve, de bom humor.

— Sinto-me tão bem como nunca me senti na vida! — disse ao doutor Guilherme Dourado.

O psiquiatra estava silencioso. E Mário notou aquela atitude.

— Que foi? Revelei algo de errado? O senhor parece preocupado.

Após alguns minutos de mutismo e olhos baixados, o médico disse:

— Sinto muito o que vou dizer: não posso ter o senhor como meu cliente.

— Mas... que aconteceu? Eu não me lembro de nada do tempo em que estava dormindo aqui no divã! Será que falei algo comprometedor, algo que não devia revelar?

— Não posso dizer nada sobre o tempo em que esteve sob hipnose. Só posso dizer que não o quero mais como cliente.

— Mas... mas... eu mereço uma explicação!

— Não, senhor Mário, não há explicações a dar.

— o senhor não pode fazer isso! Talvez eu lhe tenha revelado algo comprometedor e agora o senhor... nem sei o que vai fazer com o que eu disse. Temos que continuar o tratamento.

— Não, não temos. Agora, por favor, queira se retirar do meu consultório.

As palavras eram ditas em tom sério e com firmeza. Mario levantou-se e gritou:

— O senhor me traiu. Vou sair sim, mas vou processá-lo.

— Não há por que me processar, senhor Mário. Estou apenas libertando-o para consultar outro psiquiatra. Eu não posso mais tratar do senhor.

De nada adiantaram novos gritos e ameaças. Mario acabou saindo do consultório, tremendo de raiva.

O doutor pegou o telefone.

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Mario saiu, tomou um taxi e deu o endereço de seu apartamento.

Idiota — pensou — quem ele pensa que é? Devo ter contado alguma coisa que aconteceu no durante a guerra. Mas o que importa? Já lá se vão tantos anos, o que passou, passou.

A irritação passou ao almoço; à tarde voltou ao trabalho; e à noite, sentindo-se bem, foi a um cinema em um shopping. Ao voltar ao apartamento, era evidente a sensação de bem-estar.

Naquela noite dormiu completamente relaxado e não teve um daqueles pesadelos que o atormentara por muito tempo.

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A ausência dos pesadelos operou notável transformação em Mário, no seu trabalho e nas suas relações pessoais. Tornou-se menos tenso e o chefe notou a diferença. Trabalhava no escritório de uma grande empresa de compra e exportação de cereais. Em pouco mais de seis meses, foi indicado para o cargo de inspetor de armazéns. Seu serviço passou a ser bastante diferente, pois tinha de viajar constantemente para verificar os grandes armazéns que a exportadora mantinha em diversos locais do país. Bem como acompanhar a construção de novas unidades de armazenamento, pois o crescimento das exportações de cereais demandava mais e mais armazéns.

Melhorou o relacionamento com pessoas, conheceu Marilda e começaram a sair juntos. Em diversas ocasiões ela o acompanhou nas viagens a serviço e tudo indicava que logo, logo, estariam casados.

— Querido, adoro esse seu jeito de ser discreto, sempre cuidadoso no falar. Às vezes penso que você tem segredos para mim.

— Ora, meu amor, o que teria eu para lhe esconder? Minha vida é um livro aberto.

— Não estou implicando, não. Disse que gosto de você assim: sério, sem palavras desnecessárias. Te amo assim como você é.

Um dia foi chamado pelo diretor geral.

— Mário, quero encarregá-lo de uma missão especial. Preciso que você viaje até São Carlos, quero que você vá examinar um novo tipo de elevador de cereais, que a Rural-Engenharia está construindo. Nossa empresa está precisando de mais elevadores em nossas novas unidades, por isso quero que você vá lá, examine com cuidado e detalhes, e faça um relatório dizendo se devemos ou não comprar os novos elevadores.

Mario estava sempre disposto e imediatamente respondeu:

— OK, chefe. Hoje mesmo embarco no trem noturno para São Carlos.

ANTONIO ROQUE GOBBO

Belo Horizonte, 22 de outubro de 2015

Conto # 917 da Série 1.OOO HISTÓRIAS

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 29/03/2016
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