Lutas e Mulheres
-Bom dia, Sr. Carlos, o pão está quentinho e torrado, do jeito que o o sr. gosta!
-Obrigado, Suzane, quero três pães, por favor.
Suzane tem as feições, o sorriso e lembra a primeira e grande paixão da sua juventude, a companheira Rosa Zasulich, russa de nascimento e revolucionária por convicção, conhecera em Paris, onde estudava e ela melhorava o seu francês e, claro, analisava aquele quadro conturbado dos anos 30. Ao olhar Suzane vê Rosa em sua frente, em poucos segundos relembra tudo que passaram juntos.
-Obrigado, Suzane.
-Volte sempre, seu Carlos!
-Bom dia, Sr. Carlos, trouxe o tecido?
-Trouxe, dona Teresa, a cor é essa, fica melhor a cor escura, combina melhor comigo.
-Claro, seu Carlos!
Teresa cheia de vida, costureira e como lembra Mercedes Sosa, espanhola, mulher de uma inteligência e grande carisma, impressionava a todos, um coração dedicado à luta contra as injustiças, lutaram na guerra civil espanhola, enfrentaram nazistas e fascistas, compuseram poesias e amaram freneticamente, como eram apaixonados!
-Ah, seu Carlos, vai ficar muito bonita essa roupa no senhor.
-Obrigado, dona Teresa, bondade sua.
-Boa tarde, seu Carlos! Sempre na hora certa em? O almoço está do jeito que o senhor gosta. Carmem, arrume a mesa do seu Carlos.
-Tudo bom, seu Carlos? Já arrumei sua mesa.
-Obrigado, Carmem.
Carmem tinha cabelos castanhos escuros, pele branca, mediana, muito bonita, como se assemelhava a Carolini Lafond, sua companheira de combate Francesa, no período que combatiam as tropas nazistas, no que ficou conhecido como Resistência, lutamos e sabotamos o exército alemão, criando dificuldade nas suas posições. Carolini era de uma coragem e perspicácia e ao mesmo tempo de uma doçura e ternura a flor da pele, solidária ao extremo, que mulher apaixonada e apaixonante! Que sorriso, e como sabia amar!
-Obrigado, Carmem, até amanhã.
-Por nada, seu Carlos, volte sempre!
Carlos Odessa suavizava sua vida com esses pequenos momentos que lhe faziam recordar suas lutas, suas paixões, nesses momentos sentia que seu tempo passou, que nada mais restara, a não ser as lembranças de um tempo, onde muitos deram suas vida por um mundo melhor e solidário. Retornando a sua casa, tira sua siesta de costume, à noite como é de costume veste o seu melhor terno, olha-se no espelho e vê todo o peso do tempo no seu corpo, tenta simular um sorriso, arruma a mesa com sua melhor toalha, os talheres, as taças, o vinho e guardanapos, tudo perfeito, todos os anos, nessa data ele cumpria esse ritual e homenageava sua esposa e companheira, que conhecera na Argélia, quando lutava por sua emancipação política, se libertando do colonialismo francês. Ela se chamava Violeta Torres, era Cubana, mais jovem, linda de doer, de uma delicadeza e compreensão politica e de economia que lhe chamou sua atenção, cruzaram olhares e a paixão nasceu, passaram longos anos juntos até sua morte prematura através de atentados, já em Cuba, onde morava. Esses atentados eram patrocinados pelos E.U.A, em um hotel cubano, mercenários plantaram uma bomba para matar turistas que visitassem a ilha, com intuito de sabotar o turismo e causar pânico nos turistas estrangeiros, foram vários atentados, em um deles, lhe tiraram a vida. Carlos retornou ao Brasil com um único filho dessa união, um menino de nome Carlos Torres. Sentou-se à mesa, a sua frente uma cadeira vazia, colocou a música preferida de ambos, "Nuesto Juramento", a música que marcara seu relacionamento com Violeta Torres, assim, ouvindo e brindando à memória do seu grande amor, foi encontrado morto de ataque cardíaco, com um lindo e jovial sorriso.