Janeiro do Suspense
Pois então, janeiro chegou. Até poderia ser apenas mais um mês, se não viesse acompanhado de um gosto diferente pra saborear. Isso mesmo, a cirurgia que há muito fora programada às escondidas, afinal não queria que soubessem pra não ter motivações outras. Pra evitar energias estranhas. Pra não levantar preocupação. Pra não incomodar. Medo... talvez.
E os pre operatórios são realizados rapidamente e marcada a data da cirurgia. Segredo total.
Chega o dia, logo cedo enfrenta um trânsito que é o cenário da atualidade vivida, muitos carros e poucas e estreitas ruas e estradas pra suportar. Tudo atrasa! E a ansiedade aumenta ainda mais, tempo pra divagar, pra fugir do pensamento, pra olhar o infinito e não absorver o que sente. Um mix de vontade de acabar logo, com desistir. Não poderia mais voltar, afinal tudo fora acertado. Ainda que poucos soubessem, o compromisso foi assumido:hora marcada, médico aguardando, hospital agendado, anestesiologista a postos.
Chegando ao hospital começam os percalços. Uma amiga acompanha bem de perto toda essa armação.
Depois de muito esperar eis que surge alguém que a leva para uma sala gélida, recoberta por alumínio ou aço escovado. Silêncio total. Ali apenas os profissionais da saúde ou da doença, não sei, ordenavam. Como não obedecer! Contestar com algum procedimento, nem pensar, daqui a pouco estará embebida em dose cavalar de anestesia pra submeter-se a um transe total. Tudo pode acontecer.
Não mais recorda o que acontece, senão os erros cometidos ao pulsionarem suas veias que já não suportam mais tanto serem maltratadas.
Acorda mais tarde já em outro ambiente, cuja luz fraca quase não permite identificar quem a assiste, quem cuida dela. Também não importa, o que a faz alegrar-se é saber que venceu uma etapa tão temida. Dai a pouco estará num quarto pra recuperar-se por vinte e quatro horas. Só então contará para os seus o que havia feito sigilosamente.
Alguns amigos e colegas de trabalho enviam-lhe mensagens. responde sucintamente pra não gastar muita energia.
Noite longa, muitas vezes interceptando o sono da amiga pra ajudá-la em suas necessidades. Dia seguinte, como desejou tanto recebe alta hospitalar. Voltar para casa, sensação maravilhosa. Poder contar aos filhos, amigos e colegas de trabalho, que havia atravessado a linha tênue daquele momento da cirurgia.Agora basta o repouso pra recuperar-se.
Ao telefonar pra comunicar o feito é recebido de formas diversas. Reações amenas, aborrecidas, chateadas, egoístas. Alguns a condenam, outros buscam entender. Interessante, que ninguém pergunta-lhe se está bem, se transcorreu tudo bem. Assim mesmo, seri esperar muito, havemos de evoluir muito.
Os dias são longos, e tem tempo pra refletir sobre ela, quem é, o que quer, o que faz, como quer viver adiante.
Deixa pra outra hora contar essa...