Todo homem precisa de um bom hotel

- Está livre?

George Mitchell quase deixou cair o cigarro que segurava entre os lábios quando percebeu que Herbert Haddock dirigira-se a ele. Não deveria ter se surpreendido, aliás, pois estacionara o táxi o mais próximo que pudera da saída do Pier 59.

- Pois não, senhor! Para onde? - Respondeu rapidamente, abrindo a porta traseira do automóvel.

- Broadway 1284, Alpine.

Mitchell quase não pode conter um sorriso ao instalar-se atrás do volante. Estava sendo mais fácil do que pensara.

- Você não vai girar a manivela? - Perguntou o passageiro com suspeição.

- Senhor? - Mitchell virou-se para o banco de trás.

- A manivela. Você não girou a manivela - explicou Haddock.

- Senhor, este é um Cadillac Modelo 30. Ele utiliza um novo dispositivo chamado "motor de arranque". Manivelas são coisa do passado...

- Incrível! - Exclamou o passageiro.

Mitchell ligou o taxímetro e deu a partida. Desceram a 13ª Avenida, mergulhando no tráfego pesado de tílburis, bondes e carroças no anoitecer de um dia útil. Entraram na 10ª Avenida e depois dobraram na rua 34, seguindo por baixo do elevado. Finalmente, o táxi entrou na 5ª Avenida e em seguida desviou para a rua 33, onde pararam após algumas centenas de metros, na esquina com a Broadway.

- Chegamos. Um dólar e cinquenta, senhor - anunciou Mitchell.

Haddock puxou uma nota de dois dólares da carteira e entregou-a dizendo:

- Fique com o troco!

- Bondade sua, senhor!

E abrindo a porta para o passageiro desembarcar:

- Tenha uma boa estadia em Nova Iorque!

Ainda ficou algum tempo parado, observando Haddock entrar na recepção do apart-hotel Alpine. Depois, estacionou ao lado de um parquímetro mais à frente na própria rua 33 e voltou à pé para a esquina da Broadway. Esperou o trânsito diminuir, atravessou a avenida e entrou na elegante recepção do Alpine.

- Pois não, senhor? - perguntou o atendente por trás do balcão da recepção, medindo-o de cima a baixo. Obviamente, ele não estava vestido como um cliente regular.

- Boa noite - respondeu Mitchell. - Eu sou taxista, deixei aqui um cavalheiro, oficial da marinha, faz uns dez minutos...

- Sim, o capitão Haddock - respondeu o atendente. - O que quer com ele?

Mitchell enfiou a mão num bolso do sobretudo e puxou um dólar de prata. Exibiu-o entre o polegar e o indicador direitos.

- Creio que ele deixou cair isso ao sair do meu táxi. Quando percebi, voltei para devolver.

O atendente olhou para os lados, como que para certificar-se de que não havia ninguém por perto.

- Bem... não creio que ele vá recebê-lo. Deixe comigo que eu entregarei a ele.

Mitchell balançou o dólar de prata, sem fazer qualquer menção de entregá-lo.

- Não sei se devo... ele está hospedado aqui? O capitão Haddock?

O atendente fixou o olhar em Mitchell, mãos apoiadas no balcão.

- Na verdade, não. Ele veio ver um amigo, o senhor Charles Delaney.

- Vou confiar em você - respondeu Mitchell, colocando a moeda sobre o balcão.

Com um gesto rápido, o atendente a fez desaparecer num bolso das calças.

- Talvez eu volte aqui amanhã, - emendou Mitchell - para saber se o senhor Delaney precisa de um táxi. A sua atenção será recompensada, naturalmente.

Tocou na aba do boné em despedida e saiu para a noite da Broadway, as estrelas obscurecidas pelos luminosos que piscavam nas fachadas e no alto dos prédios.

[21-09-2013]