Olaf e Oleg: Os Velhos Berserkers – Um conto de Old Norse
Trago ainda na boca o hálito de sangue e metal da última pilhagem, e o Mar do Norte, gélido e cinzento, clama em meus ouvidos por mais uma jornada. Como posso resistir se o espectro da velhice ronda está carcaça e a glória do Valhalla exige o sacrifício do guerreiro?
PRÓLOGO
Em uma taverna imunda num canto qualquer do Norte gelado, uma dupla de guerreiros narram seus feitos e lastimam a sua falta de sorte.
- ...Perdi minha mão nas presas de um dragão do mar, que acredito ter sido a própria Jörmungander. Estava sozinho num pequeno barco a deriva em pleno mar infinito, sob uma tempestade cujos trovões pareciam vir da ira de Thor martelando as cabeças ocas dos gigantes. A escuridão era total, somente rasgada pela violência dos intensos raios. O vento uivava insano como saído das entranhas do grande lobo Fenrir. Parecia o início do Ragnarök...
No auge de sua história épica, Oleg, é interrompido por seu irmão Olaf.
- Deixe de conversa! Eu lhe disse para não enfiar a sua mão naquele maldito buraco, seu velho teimoso.
- Achei ter visto uma lebre que daria um bom almoço. – Responde Oleg, um pouco desconcertado, e tomando a ofensiva de forma irônica. – Mas sobrou o bastante do meu braço para sustentar um escudo. E quanto a você seu caolho de merda?! Pelo menos eu não fiquei resmungando feito uma mulherzinha, como “Olaf o invencível”, quando um estilhaço vazou um dos seus olhos em batalha.
- Lembrou-se bem, ao contrário de sua mão, meu olho se foi em combate. Além do mais, o poderoso Odin também é cego de uma das vistas e mesmo assim é chefe do clã dos deuses. – Contra-argumenta Olaf, prosseguindo. - Eu sim me recordo de uma vez, em que enfrentei de mãos nuas um troll que invadiu um vilarejo ao pé das montanhas do Oeste. Durante dois dias e três noites inteiras me atraquei com a criatura, o bafo parecia a latrina do inferno, mas no final a vitória coube a Olaf, o grandioso.
- Agora sou eu que me lembro bem! Você bebeu todas naqueles dias e se enfiou num celeiro com uma meretriz que realmente a feiura, aí sim, não deixava a desejar a nenhum monstro da montanha ou da floresta. – Disse Oleg, gargalhando a todo os pulmões, enquanto Olaf esbravejava e ordenava ao taverneiro que enchesse novamente as suas canecas.
- Oleg, maldito seja Loki e suas artimanhas. Todos esses anos de pilhagens, estupros, batalhas e bebedeiras e ainda não encontramos nem desafio nem oponente que nos agraciasse com a morte gloriosa.
- Pois é Olaf, nossas barbas já se mancham de cinza e nossas rugas nos fazem parecer cascas de carvalho. Anseio cada vez mais o encontro com as valquírias, poder me fartar em festins regado a hidromel em Asgard, e lutar junto aos deuses no Ragnarök.
- Irmão, se depender da habilidade desses guerreiros que temos encontrado em nossas andanças vamos viver até o fim dos tempos. – Lamenta Olaf, e vocifera. - Jamais me entregarei por doença ou velhice sob o julgo de Hel!
- Concordo com suas palavras. Se não buscássemos uma morte que nos honrasse frente à Odin, e que pudéssemos nos vangloriar nos salões do Valhalla, terminaríamos nossos dias cravando nossas espadas estripando um ao outro. - Retruca Olef.
O taverneiro ao repor as bebidas, e tento escutado o diálogo entre os bárbaros, resolve arriscar um palpite.
- Tenho ouvido muitas histórias de um hábil guerreiro que tem realizado proezas dignas dos cantos dos bardos. Dizem que aqueles que o enfrentam encontram a morte certa, e mesmo os que caminham ao seu lado não tardam a ter o mesmo destino. Seu nome me é desconhecido, chamam-no por vezes de “a fúria do Norte”, ou simplesmente “o urso”. Os últimos relatos vêm dos lados do litoral. Talvez ele possa, como direi, “ajudá-los”!
- Olaf, não seria um dos seus bastardos? - Oleg ri.
- Como saberei Oleg, são muitos e em tantos lugares! Ouça taverneiro, se todos que tiveram contato com esse tal guerreiro morreram qual infeliz ecoa seus feitos?
- Bem... Disso eu não sei dizer. Eu só repasso os rumores que circulam em minha taverna.
- Então mais uma rodada de bebidas, que nós iremos confirmar suas histórias.
Glossário
Asgard: Reino ou a morada dos deuses na mitologia nórdica.
Berserkers: Guerreiros que se lançavam em batalha em uma espécie de “transe”, uma fúria assassina.
Fenrir: Lobo monstruoso que foi acorrentado pelos deuses, até o advento do Ragnarök.
Hel: Monstro encarregado de reinar sobre os infernos.
Hidromel: Bebida alcoólica fermentada à base de mel e água.
Jörmungander: Serpente monstruosa que circunda Midgard.
Loki: Deus da astúcia, maldade, humor e trapaça.
Odin: Deus principal da mitologia nórdica.
Ragnarök: Final dos tempos, quando haverá a luta definitiva entre a Ordem e o Caos, será o fim do mundo dos deuses e dos homens.
Thor: Deus do trovão.
Troll: Criaturas antropomórficas, gigantes horrendos, do folclore escandinavo.
Valhalla: Majestoso salão situado em Asgard, para onde os Einherjar, os guerreiros mortos em batalha, são levados pelas valquírias.
Valquírias: Belas jovens que, montadas em cavalos alados e armadas com elmos e lanças, sobrevoavam os campos de batalha escolhendo os mais bravos guerreiros mortos.
Escrito por Carlos Torres e Wagner Torres.