A Aldeia (XXVIII)
Ormec chegou com a lebre e entregou-a a Aulah para que ela a preparasse para Amom, uma só lebre para toda a aldeia não daria certo, e assim o fez.
Ormec depois procurou Kally e explicou-lhe as dificuldades por que passara para encontrar a erva para Auan, na primeira vez ele colheu a erva que foi consumida no tempero da capivara, na segunda vez, quando chegou perto de onde existia a erva, encontrou o Amom e teve de socorrê-lo, e na terceira vez, encontrou a vara de javalis, e estava imaginando: aqueles desvios, não seriam um sinal dos orixás de que não se devia usar a erva?
Kally era uma mulher mística, e ficou realmente preocupada com a situação, ela também havia sonhado com algo muito estranho que poderia também ser outro sinal dos orixás. Ela disse ter sonhado com um ser, que corria dentro de um milharal, com vestes de palha, e ela imaginou tratar-se de Omulu, o orixá da terra, mas que era encarregado de receber os mortos... Agora, com o retorno de Amom, não seria um retorno de quem se supunha estar morto?
Talvez estivesse na hora de procurar a velha Noah, a feiticeira, talvez ela trouxesse luz para esses sinais...
As coisas pareciam não estar bem na aldeia Van, o retorno de Amom dava a impressão de ter aberto a antiga ferida do sumiço dos guerreiros e dos jovens.
Quando todos imaginavam que seus mortos já estavam sepultados e vivendo na dimensão de Orum, reaparece Amom e por causa disto todas as guerreiras se questionavam:
- Será que meu marido também está vivo?
Não questionavam se os filhos também estavam vivos, o problema estava numa possibilidade de retorno dos companheiros... Era razoável que esta realmente fosse uma fonte de problemas, porque todas haviam arranjado um substituto, e algumas sabidamente demonstravam de público estarem muito satisfeitas com a mudança.
Kally podia ser que não estivesse tão satisfeita com o novo marido, o quanto estava com o antigo, mas por outro lado, agora ela ostentava o título de rainha, e se o seu marido voltasse, ela retornaria à condição de uma plebeia, e isso mexia com os seus já conturbados humores. Foi por isso que ela resolveu procurar Noah.
Noah era uma das anciãs, em outra época ela havia sido uma mãe de santo famosa, procurada por pessoas de outras tribos e o seu terreiro ou sua terra sagrada, como ela bem afirmava, nas noites de sessões, ficava lotada de adeptos. Mas desde que ficou viúva, ela vivia resmungando pelos cantos e diziam que seus orixás a haviam abandonado. Mesmo assim ela era vista com respeito e admiração pela maioria, e por desdém por alguns que diziam que ela não recebia entidade nenhuma, que tudo era uma grande simulação de uma mulher esperta e perspicaz.
Agora, estava sempre com seu cachimbo, ora aceso, deixando um rastro de cheiro no ar, em outras vezes apagado, mas ela continuava sempre a resmungar, chamando a atenção das mulheres, reclamando de suas composturas e quando contestada rogava pragas, jogando contra quem, com ela implicasse, as cinzas do seu cachimbo. Muitas mulheres a evitavam e tinham medo das suas pragas.
Quando Kally a procurou, antes que lhe fosse dito qualquer coisa, a velha lhe perguntou:
- Foi Omulu quem lhe mandou falar comigo?
Kally sentiu um calafrio, esse Orixá amedrontava as pessoas, todos os relacionavam com a morte. Então ela alertou Kally:
- Minha filha, não tenha medo de Omulu, ele é o regente da terra e da fertilidade, a morte só acontece com quem está vivo, não é mesmo?
- É, sim senhora...
- É ele quem cuida dos filhos de Oxalá, e quando morremos ele trata para que nos transformemos em pó e leva a nossa alma para os reinos de Orum... Sabe porque Ele usa uma roupa de palha? Não foi assim que você o viu?
- Foi, sim senhora, Kally respondeu, num misto de respeito, admiração e medo...
-Ele não queria ir à festa de todos os orixás porque se envergonhava de ter no rosto as marcas da varíola, então Ogum, que é seu irmão, penalizado por ele, confeccionou uma roupa de palha para que suas cicatrizes não ficassem à mostra. Na festa ninguém queria dançar com ele, então Yansã tirou-o para dançar, mas como ela rege os ventos, as palhas se espalharam e mostrou que debaixo daquelas vestes havia um homem formoso, lindo!
Kally ouvia extasiada a estória que nunca tinham lhe contado e perguntou-lhe:
- Minha mãe, meu marido está vivo, como o Amom?
- Todos eles estão vivos, minha filha, cabe a você reunir as mulheres e Auan para decidir o que deve ser feito, o destino deles, está em suas mãos!
A velha olhou profundamente nos olhos de Kally, deu uma baforada com seu cachimbo sobre ela e lhe disse:
- Você agora é uma rainha, faça jus o seu título...
Ormec chegou com a lebre e entregou-a a Aulah para que ela a preparasse para Amom, uma só lebre para toda a aldeia não daria certo, e assim o fez.
Ormec depois procurou Kally e explicou-lhe as dificuldades por que passara para encontrar a erva para Auan, na primeira vez ele colheu a erva que foi consumida no tempero da capivara, na segunda vez, quando chegou perto de onde existia a erva, encontrou o Amom e teve de socorrê-lo, e na terceira vez, encontrou a vara de javalis, e estava imaginando: aqueles desvios, não seriam um sinal dos orixás de que não se devia usar a erva?
Kally era uma mulher mística, e ficou realmente preocupada com a situação, ela também havia sonhado com algo muito estranho que poderia também ser outro sinal dos orixás. Ela disse ter sonhado com um ser, que corria dentro de um milharal, com vestes de palha, e ela imaginou tratar-se de Omulu, o orixá da terra, mas que era encarregado de receber os mortos... Agora, com o retorno de Amom, não seria um retorno de quem se supunha estar morto?
Talvez estivesse na hora de procurar a velha Noah, a feiticeira, talvez ela trouxesse luz para esses sinais...
As coisas pareciam não estar bem na aldeia Van, o retorno de Amom dava a impressão de ter aberto a antiga ferida do sumiço dos guerreiros e dos jovens.
Quando todos imaginavam que seus mortos já estavam sepultados e vivendo na dimensão de Orum, reaparece Amom e por causa disto todas as guerreiras se questionavam:
- Será que meu marido também está vivo?
Não questionavam se os filhos também estavam vivos, o problema estava numa possibilidade de retorno dos companheiros... Era razoável que esta realmente fosse uma fonte de problemas, porque todas haviam arranjado um substituto, e algumas sabidamente demonstravam de público estarem muito satisfeitas com a mudança.
Kally podia ser que não estivesse tão satisfeita com o novo marido, o quanto estava com o antigo, mas por outro lado, agora ela ostentava o título de rainha, e se o seu marido voltasse, ela retornaria à condição de uma plebeia, e isso mexia com os seus já conturbados humores. Foi por isso que ela resolveu procurar Noah.
Noah era uma das anciãs, em outra época ela havia sido uma mãe de santo famosa, procurada por pessoas de outras tribos e o seu terreiro ou sua terra sagrada, como ela bem afirmava, nas noites de sessões, ficava lotada de adeptos. Mas desde que ficou viúva, ela vivia resmungando pelos cantos e diziam que seus orixás a haviam abandonado. Mesmo assim ela era vista com respeito e admiração pela maioria, e por desdém por alguns que diziam que ela não recebia entidade nenhuma, que tudo era uma grande simulação de uma mulher esperta e perspicaz.
Agora, estava sempre com seu cachimbo, ora aceso, deixando um rastro de cheiro no ar, em outras vezes apagado, mas ela continuava sempre a resmungar, chamando a atenção das mulheres, reclamando de suas composturas e quando contestada rogava pragas, jogando contra quem, com ela implicasse, as cinzas do seu cachimbo. Muitas mulheres a evitavam e tinham medo das suas pragas.
Quando Kally a procurou, antes que lhe fosse dito qualquer coisa, a velha lhe perguntou:
- Foi Omulu quem lhe mandou falar comigo?
Kally sentiu um calafrio, esse Orixá amedrontava as pessoas, todos os relacionavam com a morte. Então ela alertou Kally:
- Minha filha, não tenha medo de Omulu, ele é o regente da terra e da fertilidade, a morte só acontece com quem está vivo, não é mesmo?
- É, sim senhora...
- É ele quem cuida dos filhos de Oxalá, e quando morremos ele trata para que nos transformemos em pó e leva a nossa alma para os reinos de Orum... Sabe porque Ele usa uma roupa de palha? Não foi assim que você o viu?
- Foi, sim senhora, Kally respondeu, num misto de respeito, admiração e medo...
-Ele não queria ir à festa de todos os orixás porque se envergonhava de ter no rosto as marcas da varíola, então Ogum, que é seu irmão, penalizado por ele, confeccionou uma roupa de palha para que suas cicatrizes não ficassem à mostra. Na festa ninguém queria dançar com ele, então Yansã tirou-o para dançar, mas como ela rege os ventos, as palhas se espalharam e mostrou que debaixo daquelas vestes havia um homem formoso, lindo!
Kally ouvia extasiada a estória que nunca tinham lhe contado e perguntou-lhe:
- Minha mãe, meu marido está vivo, como o Amom?
- Todos eles estão vivos, minha filha, cabe a você reunir as mulheres e Auan para decidir o que deve ser feito, o destino deles, está em suas mãos!
A velha olhou profundamente nos olhos de Kally, deu uma baforada com seu cachimbo sobre ela e lhe disse:
- Você agora é uma rainha, faça jus o seu título...