Entre Linhas e Estações

O trem chegou ao fim da linha. Laura segurava o velho caderno marrom contra o peito, um companheiro silencioso de anos de palavras derramadas. A estação estava cheia, mas a multidão parecia uma névoa enquanto seus pensamentos a puxavam para trás, para quando ela era apenas uma garota escrevendo sobre um futuro que parecia impossível.

Há dez anos, naquela mesma estação, Laura havia dito adeus a Miguel. Ele era o tipo de pessoa que fazia o mundo parecer mais brilhante, mas que também carregava a inquietude de quem precisava descobrir seu próprio caminho. “Eu volto”, ele prometera, com um sorriso triste, antes de embarcar. Mas o tempo havia silenciado a promessa, deixando apenas um eco que Laura carregava em suas páginas.

Naquele dia, algo a fizera voltar ali, talvez uma inquietação no coração, ou uma dessas intuições que não se explicam. O cheiro de ferro e fumaça misturava-se ao perfume de flores que os vendedores carregavam entre as plataformas.

E então ela o viu.

Miguel estava parado ao lado de uma banca de jornais, um pouco mais velho, mas inconfundivelmente ele. A camisa branca, amassada pelo dia, e o sorriso que parecia nunca ter se apagado. Seus olhos encontraram os dela, e por um instante, o tempo curvou-se, deixando os dez anos se dissolverem no ar.

“Laura…” ele disse, como se seu nome fosse um segredo guardado em silêncio por muito tempo.

“Você voltou”, ela respondeu, a voz tremendo entre o choque e a alegria.

“Demorei, mas estou aqui.” Ele riu suavemente, o som como música familiar. “E você ainda carrega o caderno.”

Laura sorriu. “Sempre. Ele é minha memória de tudo que pensei que nunca mais viveria.”

Ele deu um passo à frente, hesitante, mas determinado. “Lá fora, eu procurei muitas coisas. Mas percebi que as palavras que realmente importavam estavam em você. Eu só precisava encontrar coragem para voltar.”

Ela sentiu as lágrimas queimarem os olhos, mas não as conteve. Miguel abriu os braços, e ela se deixou envolver naquele abraço que parecia juntar todas as partes quebradas do tempo.

Naquele dia, entre linhas e estações, Laura percebeu que algumas promessas, mesmo que tardem, têm o poder de florescer novamente. E que às vezes, reencontros não são apenas sobre pessoas que voltam, mas também sobre sonhos que nunca foram embora.

Raquel Bonelli
Enviado por Raquel Bonelli em 30/11/2024
Código do texto: T8208798
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