Decisão que acalma

Estava tudo perfeito. Vestido florido, daqueles que a gente guarda para momentos especiais, sandálias que não machucam, acessórios que combinam até com o humor do dia e o perfume, um toque de ousadia e frescor. Os cabelos soltavam um brilho raro e pareciam prontos para qualquer cenário, mas não tinha certeza se eu estava. Ah, andei pelo quarto de um lado para o outro, o chão quase decorava meus passos hesitantes.

Era para ser simples. Um encontro, uma novidade, uma chance. Mas o medo parecia maior que qualquer expectativa. E se ele não gostasse de mim? E se eu não gostasse dele? Ou pior, e se algo desse errado? Mil pensamentos ridículos passavam pela minha cabeça, alguns tão exagerados que me faziam rir sozinha, tentando desviar da seriedade com que o nervosismo tomava conta de mim.

“Isso é coisa de menina boba, de alguém que ainda sonha com o primeiro encontro ideal.” Falei pra mim. E eu não era mais essa menina. Não deveria me deixar abalar por inseguranças adolescentes. Era só um encontro às cegas. O que de tão grave poderia acontecer?

Fiquei refletindo. O que tanto me incomoda? Cheguei a conclusão de que nem era sobre ele. Era sobre mim, sobre essas amarras invisíveis que ainda me prendem a ideias ultrapassadas, sobre o que é certo ou errado quando se conhece alguém. Eu podia estar indo longe demais com as suposições, mas a verdade é que não conseguia decidir. Essa modernidade de conhecer pessoas pela internet, de se aventurar no desconhecido, ainda me parecia uma coisa difícil de engolir.

Talvez o tradicional tenha ficado enraizado demais em mim. Eu, com minha rotina de só ir ao mercado e minha aversão às festas, nunca fui capaz de caçar novidades. Será que estava fadada a me afastar do mundo novo por medo de sair do meu próprio quarto?

No fim, decidi me sentar. O relógio marcava a hora, e eu, paralisada entre a porta e o conforto da minha zona segura, percebi que não era o encontro que me assustava. Era o simples fato de que, dessa vez, eu precisava decidir se ia ou não e talvez essa fosse a decisão mais difícil de todas.

Permaneci ali, com tudo pronto, mas sem coragem de atravessar a porta.

Não vou. Pensei. Quem é que está me obrigando a ir? Que peso é esse que coloquei em meus ombros, quando sei que não sou capaz de suportar?

É isso. Não fui e, imediatamente, a paz voltou a reinar em mim. A tremedeira foi se dissolvendo e em seu lugar nasceu uma calmaria que há dias não sentia. Era como se uma tempestade interna cessasse, trazendo a serenidade de quem finalmente faz as pazes consigo mesma. Eu me vi em conformidade com a situação, com a escolha de não seguir o que eu mesma impus como um dever.

Afundei no colchão, respirando fundo, sentindo o peso da expectativa desvanecer. Olhei ao redor, para o quarto agora em silêncio e percebi o quanto ansiava por aquele momento do encontro, mas também do alívio de não estar tensa. Não era sobre desistir do encontro em si, mas sobre aceitar que eu poderia decidir por mim, sem sentir que estava perdendo alguma coisa. Não ir também era uma escolha, e talvez fosse a única que eu precisava fazer naquela noite.

Parei diante do espelho, ainda com os cabelos soltos e o vestido bonito. Dei um sorriso para o meu reflexo, satisfeita por me reconhecer ali, por saber que a escolha de ficar não era fraqueza, e sim uma forma de me respeitar e fazer valer meus sentimentos.

A modernidade que tanto admirava, não precisava ditar meu ritmo. Podia me aventurar no meu próprio tempo e, hoje, isso significava dizer “não”.

Tirei os acessórios um a um, com a leveza de quem tira uma máscara que já não precisa. Hoje, minha companhia seria minha própria paz e, pela primeira vez em dias, ela estava garantida.

Melhor dormir.

Bianca Baptista
Enviado por Bianca Baptista em 04/11/2024
Reeditado em 04/11/2024
Código do texto: T8189619
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