corra por sua vida
Sabe, eu pensava em todas as mil maneiras que eu poderia me perder, e nunca imaginei que me perderia em um olhar ou em um toque de mãos.
Lembro até hoje, a primeira vez que entrei na sua casa. O ar frio de uma madrugada de São Paulo fazia meu rosto doer e arder, mas a emoção da aventura e da fuga não me deixava sentir frio. Você poderia chamar isso de amor, mas eu nunca disse o que realmente era, talvez a vergonha de não ter coragem de dizer que uma aventura sempre será apenas uma aventura. Mas lá estávamos, correndo as escadas em silêncio para não acordar sua mãe, nos escondendo debaixo das cobertas para minhas mãos ficarem quentes, trocando carinhos e carícias entre beijos que não tinham tantos sentimentos assim. Mas eu estava lá, rezando para o frio da noite não ser meu, e para que a realidade da manhã não chegasse nunca. Eu pedi, eu implorei para que o ar frio largasse meus pulmões, para que eu pudesse finalmente respirar, mas aqui estamos, dois anos depois eu prometi nunca mais voltar a sentir aquele ar gelado da madrugada paulistana no meu rosto novamente, e não sentir a vergonha também, nem mesmo o desejo por uma fuga repentina.
Mas eu ainda consigo me lembrar de quando eu peguei minhas coisas na sua casa, tão certo de ir embora, e você sabe que consegue se lembrar da sensação, de como tudo era aquecido pela fúria e raiva que nutrimos um pelo outro, e então nós não lembramos mais como era o cruel frio da madrugada de São Paulo.
Mas no final, eu consigo lembrar de tudo muito bem. Desde seu rosto sorridente quando me viu descer do ônibus pela primeira vez, desde meu rosto dolorido pelo frio ansioso por um beijo que não me traria amor, até a textura da coberta que nos escondia da luz da manhã, e dos carinhos em meus cachinhos mal arrumados.