O Peso do Tempo
Talvez seja tarde quando ler estas palavras. Você sabe o enigma do tempo: o tempo não espera por ninguém. Avança implacável, a caminho da finitude de tudo enquanto sua infinitude se estende, a roubar momentos preciosos e a deixar sombras de memórias felizes. Essas que enfeitamos por conta do simulacro da realidade, pois a tristeza e a melancolia são as últimas cartas deixadas pelo baralho da vida.
Na incerteza do futuro, cada segundo que passa é uma oportunidade perdida. Um sonho desfeito.
Escrevo tais palavras a observar o céu nublado, à espera de uma chuva que não cairá, sob um vento frio que sibila palavras e infortúnios ao vento. Onde é que você está neste momento que tanto te espero? Embora as flexões estejam no presente, é muito certo que na hora de sua lida, todas estas palavras tornar-se-ão quase adágios.
Lembra-se daquele beijo sob as folhas secas de uma árvore outonal? Lembro-me daqueles gestos que nos permitimos e ali selamos talvez o início de uma paixão que não vingou. Como ramos de flores mortas e ressequidas que insistem em permanecer com suas raízes em vasos rotos.
O relógio bate as horas em que mais uma vez sua ausência dá-se como presente. A angústia em meu peito me aperta, sofregamente, a me querer findar tal existência sem sentido.
Lembra-se das poesias que líamos em voz alta? A vida é sempre assim: cheia de perdas e danos. Recordo-me quando pegou suas malas e pela última vez me disse adeus. Pensei que seria mais uma de tantas outras. Mas aquela foi a derrocada. A titubear, embriagada que estava daquele vinho californiano, não esperou pela chegada do elevador.
Súbito, tornou-se ausência. Essa que tanto me invade e me perturba como um espectro zombeteiro. A sua ausência. Talvez eu não estivesse a esperar tal ponto final. A vida, muitas vezes, tem suas reticências. Contudo, me fez perceber que às vezes as coisas se findam com uma exclamação.
Lugubremente, ensaio aqui a minha despedida, pois não tenho mais aonde ir. Pego-me a pensar no último sorriso que me deu: insosso, melancólico. Porém, melífluo. Talvez ainda enxergasse ternura na sua tristeza. O coração me apertava. Discutíamos algum filme ruim que havíamos visto. E foi só.
Ora, escrevo porque não tenho mais onde transpor todos os sentimentos que sinto. Tampouco o ímpeto de exprimir o que sinto existe.
A umidade que encharca a minha camisa branca – que você costumava a apertar minha gravata – é resultado de lágrimas póstumas.
Dessa forma, rogo ao universo para que, além de você, leia tais palavras. E que, se for de sua vontade, faça-me tornar também uma ausência perene algum dia.