Truque da memória
Nós somos uma criação engenhosa da nossa memória, e não o contrário. Tudo que fazemos e nos tornamos devemos a ela. Nossa vida gira em torno dela. É na memória que estão gravados todos os nossos registros e, segundo os cientistas, esse processo, super sofisticado, se inicia quando ainda estamos na fase intrauterina. Eles acreditam que essa nossa busca incessante por amparo e proteção resulta das lembranças daquela fase.
Mais adiante, nomes, rostos, histórias, lugares, valores, sabores, dores, odores, traumas, cores, paixões etc. começam a preencher esse fenomenal arquivo que, apesar do seu tamanho reduzido e de trabalhar no mais absoluto silêncio é capaz de armazenar dados num volume ainda desconhecido.
Portanto, arrisco afirmar que é a memória que dita nosso comportamento.
É ela que nos dá identidade, direção e razão. Nossas opiniões dependem dela. Nossas paixões precisam de lembranças que necessitam de memória. Medos, desejos e rancores, também.
Especialistas acreditam que as nossas falhas de memória não acontecem à toa. Recebemos muitas informações e para que não sejamos sufocados por elas simplesmente esquecemos algumas. Ou seja, nossa memória, às vezes, “se perde” para nos proteger, para que tenhamos uma vida equilibrada.
Que maravilha!
Seria bom se nós pudéssemos utilizar esse truque do “esquecimento” de maneira voluntária e consciente, selecionando e apagando de nossa memória os momentos ruins. Nos “perderíamos” e esqueceríamos as mágoas, as decepções e as tristezas e deixaríamos espaços livres em nossa memória para a alegria e o entendimento. Protegeríamos nossos parentes e amigos, de quem tanto dependemos e nem sempre sabemos como tratá-los, e viveríamos bem melhor.
É provável que parte de nossas experiências no que diz respeito a relacionamentos se apague também. Afinal, às vezes, é em nome delas que sofremos e fazemos sofrer. Mas não terá importância, saberemos encontrar uma maneira mais saudável de acumular conhecimentos. Até porque, melhor do que recordar rigorosamente de tudo é poder esquecer com facilidade aquilo que não nos faz bem.
Augusto Serra