Sentimentos

Quem pode definir o amor e seus desdobramentos?

Pode o amor ser eterno mesmo sem se realizar?

O que leva alguém a morrer em vida por um amor frustrado?

Pensando no passado as lembranças o sufocavam, a saudade apertava seu coração.

Vivendo o presente era um sucesso na vida profissional e um fracasso na vida pessoal.

Para o futuro não esperava muita coisa, a mesma vida sem sentido e solitária.

Acostumou-se com a solidão, chegava em casa e às vezes o silêncio tocava sua alma. Tinha por companheiras a música e a leitura. Muitas vezes sonhava com ela. Acordado e dormindo. E então a tinha em seus braços e se sentia feliz. Nunca mais quis namorar, pensava que as mulheres eram falsas. Nunca esqueceu aquela que se aninhou em seu coração.

Foi naquele ano de 1968, naquele dia vinte de setembro que que ele a viu pela primeira vez. A noite estava agradável, uma brisa suave tocava seu rosto. Era um jovem de dezoito anos, cheio de sonhos, de fantasias e anseios de felicidade e sucesso. Naquele instante ela entrou em sua vida, em seu coração e em sua alma como alguém que invade e faz morada, que se apossa e escraviza.

Depois de muitas investidas e ela se fazer de desentendida e desinteressada, começaram a namorar. Apaixonaram-se e fizeram muitos planos para o futuro. Seguiram namorando por quatro anos. Tudo parecia perfeito. Seguiriam juntos pela vida afora.

Um mal entendido os separou. Tudo indicava que ele a traíra. Ela não perdoou a traição, Ele, inocente, não perdoou a desconfiança da amada.

Quando ela começou a namorar outro ele se sentiu morrer por dentro. Amava aquela mulher mais que tudo. Vê-la com outro era demais. Mas seu orgulho não permitiu que ele tentasse uma reaproximação para desfazer o mal entendido.

Ela entrou no salão. Estava deslumbrante em seu vestido preto decotado, moldado ao seu corpo escultural. Cabelos e maquiagem perfeitos acentuavam sua beleza. Todos os olhares se voltaram em sua direção. As mulheres a olhavam com inveja, os homens com cobiça.

Procurava em festas, roupas caras e outras futilidades a felicidade que não conseguia ter. Tentava encontrar em outras bocas o beijo que um dia teve, procurava em outros homens o amor que perdeu, mas que não esqueceu jamais, nem durante o tempo que foi casada. Em suas longas noites de solidão sonhava com seu passado, com o único homem que amou.

Estava viúva há dois anos. Ficou casada por dezesseis anos até a morte de seu marido que era quinze anos mais velho que ela e que morreu em um acidente aéreo. Nunca foi totalmente feliz em seu casamento. Faltava o primordial que era amor de sua parte. Ele, apaixonado, fazia todas as suas vontades e não entendia quando a via triste. Tinha tudo o que uma mulher podia querer e ele se entristecia por não poder dar a ela a felicidade.

Ela não amava o namorado. Seu coração ainda pertencia àquele que a traiu. Ainda assim casou-se. Nunca iria perdoar uma traição. Queria se vingar dele casando-se com outro. Seu marido era um homem rico e sofisticado e ela aprendeu a ser elegante e sofisticada com ele. Frequentavam festas e eventos da sociedade. Ela se sentia vazia e fútil nessas ocasiões, mas esquecia sua insatisfação diante da vida que levava. Pensava que seria feliz se estivesse com o homem que amava, mas o destino a levou por outros caminhos.

Acostumou-se com o luxo e tornou-se viciada em comprar. Comprava o supérfluo e caro como se isso pudesse preencher o vazio que trazia no coração e na alma. Muitas vezes pensava no que estava fazendo de sua vida. Não era assim e não se sentia feliz.

Um tempo depois de ficar viúva se encheu de coragem e decidiu procurar seu antigo namorado. Sabia que ele estava sozinho e infeliz. Decidiu que tentaria perdoá-lo pela traição. Afinal tantos anos já haviam se passado. E se não conseguiu esquecê-lo é porque havia amor o suficiente para um gesto de perdão. Conversaram e ele a tratou com a mesma frieza com que levava sua vida. Ela não entendia porque ele a tratava assim e seu coração se encheu de mágoa.

—Eu venci todas as minhas barreiras pra te procurar e marcar este encontro e é assim que você me trata? Fui eu a traída.

—Se não acredita na minha inocência, se não veio me pedir perdão pelo que me fez, não devia ter vindo.

—Eu pedir perdão? Foi você que me magoou, foi você que me traiu com outra.

—Sabe que não te traí. Sabe o quanto eu te amei.

—Mas nunca provou que não me traiu.

—Como queria que eu provasse que foi uma armação?

—Ela nunca confessou que foi uma armação. Sempre afirmou que estava ali porque vocês dois queriam.

—Você era minha namorada, tinha que confiar em mim.

—Diante de todas as evidências?

—Diante do amor e da confiança as evidências caem por terra.

—É fácil falar. Mas se você estivesse no meu lugar iria acreditar que não houve traição?

Ele se calou. Depois disse:

—Eu não te traí e sua desconfiança me magoou muito. Eu queria poder escolher o que sentir, mas não me foi dada esta opção. Eu te amo, mas não te perdoo. Acho que nunca vou perdoá-la.

—Eu vim aqui disposta a perdoar e nos dar uma chance, mas se é assim que você quer, não há mais nada a dizer.

Ela se virou e saiu. Ele tentando manter a frieza ficou ali parado.

Muitas outras vezes se encontraram por acaso ou quem sabe nem tanto por acaso. Mas nunca conseguiram vencer a barreira da mágoa e do orgulho e sempre terminavam brigando.

Seguiram separados. O orgulho era maior que o amor. Ou talvez era o orgulho que os fazia viver, muito mais que o amor poderia fazer. Talvez as brigas alimentassem os sentimentos. Ou quem sabe o destino queria assim, que se amassem à distância.

Nádia Gonçalves
Enviado por Nádia Gonçalves em 26/06/2024
Reeditado em 26/06/2024
Código do texto: T8094367
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