Suas Estrelas da Sorte

Voltar para Belo Horizonte reavivou memórias e sentimentos enterrados. As ruas, cinzentas e frias, acolhiam minha solidão e saudosismo. Cada esquina trazia à tona lembranças de Nicole, aquela figura constante do passado, que representava um emaranhado de emoções e incertezas.

Nos dias nublados, quando o céu parecia um lençol de chumbo, eu andava pelas ruas de mãos nos bolsos, cabeça baixa, absorto em pensamentos sobre minha vida e suas escolhas tortuosas. Nicole, sempre presente em meus devaneios, tornava-se uma figura de interrogação: teria ela interesse em nossa amizade? Em nossa história?

De volta à cidade, considerei evitar encontrá-la. Poderia alegar compromissos inexistentes, fugir de revisitar sentimentos complexos. Contudo, algo em mim ansiava vê-la, olhos nos olhos, buscar uma resposta no seu semblante.

Naquele dia, a encontrei encostada em uma parede, distraída com o telefone. A imagem dela me trouxe uma sensação de déjà vu, um quadro renascentista que evocava memórias e pulsões de adrenalina. Era como se cada instante ali se repetisse eternamente.

Aproximei-me com a naturalidade de quem encontra um velho amigo. Nicole me olhou de cima a baixo, um sorriso breve desenhou-se em seus lábios.

— Quanto tempo, hein? — eu disse, tentando soar casual.

— Pois é. — Ela respondeu, guardando o telefone e me oferecendo um sorriso enigmático.

Conversamos pouco, mas a sinestesia dos nossos olhares comunicava mais do que palavras poderiam. Entramos no cinema e ficamos numa sala escura, onde a luz do projetor dançava em uma tela branca. Saímos elogiando o filme, mas sem muita vontade de prolongar a conversa.

— Talvez devêssemos ver um filme de terror na próxima, — sugeri, meio de brincadeira.

— Má ideia, — ela concordou, rindo.

Nicole era esguia, com cabelos negros e sardas que salpicavam seu rosto. Seus olhos brilhavam com uma sagacidade que sempre admirei. Enquanto passeávamos pelos corredores do shopping, ela parecia uma sombra, um fantasma elegante que vagava sem propósito claro.

Seguimos juntos, eu a um passo atrás, observando-a. Era fascinante como ela se movia, seus cabelos dançando com cada movimento do rosto. Passeamos entre lojas e pessoas, observando cabeças se perderem em sonhos inalcançáveis.

Na saída, sinalizei o metrô enquanto ela se dirigia ao ponto de ônibus. Havia algo de incompleto em nosso encontro. Nenhum abraço, nem beijo, apenas um rápido toque de punhos. Ela deu dois passos e sumiu na multidão. Fiquei parado, questionando se aquele distanciamento era tudo que restava entre nós.

Quando me virei para ir embora, notei que ela vinha em minha direção. Sem palavras, apenas me acompanhou até a estação do metrô.

— Não vai se despedir direito? — perguntei, meio rindo, meio sério.

— Você sabe que não sou boa com despedidas. — Ela respondeu, com um brilho nos olhos.

Passei pela catraca, imaginando que ela desapareceria de novo, mas Nicole surpreendeu, acompanhando-me até a linha final, mesmo que isso significasse perder seu ônibus.

Enquanto esperávamos pelo trem, o silêncio entre nós era confortável. Finalmente, ela quebrou a quietude:

— O que você vai fazer agora?

— Continuar andando, eu acho. — Respondi, olhando para o horizonte da plataforma.

— Sempre foi assim com você, não é? — ela disse, e havia uma suavidade em sua voz que fez meu coração doer um pouco.

O trem chegou, e nos olhamos pela última vez antes de eu embarcar. Quando as portas se fecharam, percebi que, apesar de tudo, nossa conexão permanecia intacta. O trem partiu, e através da janela, vi Nicole desaparecer, mas desta vez, o sentimento de incompletude havia se transformado em uma certeza tranquila. Mesmo na distância, ela continuava sendo uma parte essencial da minha vida.