Sem título porque ainda não terminei
"Ainda havia sobre a mesa, esquecido de seu lugar, os seus óculos sem as lentes. Abandonado entre talheres plásticos sujos de manteiga, farelos de pães espalhados na toalha manchada de café de outros momentos, o molho de chave do quintal dos fundos dava um toque peculiar àquela bagunça cotidiana familiar. O par de xícaras coloridas ensaiava uma saudade doída de fome e ausência que, às vésperas do último dia em que se viram, só fazia aumentar.
Ao fundo, o ruído da televisão ligada afim de preencher o silêncio angustiante, irritava - a mais do que consolava. A propaganda enfadonha abafada pelo miado impaciente da gata faminta despertou nela qualquer sentimento impotente. Uma tristeza esquisita permanecia companheira enquanto ela dissimulava costume, mesmo até apreço. Lembrou de uma frase: "É preciso certo cuidado em se deixar sentir. É perigoso demais também!" Talvez tivesse medo. O inferno não são os outros, não...
A rede vermelha vazia. O lado da cama daquela parte faltante. Ausente. O cheiro doce daquele perfume enjoado. As bicicletas encostadas na parede da garagem que semanas atrás competiam inconscientes o quente asfalto de uma cidade desbravada entre sorrisos e pausas, suores, saberes de vida comum compartilhados na trivialidade daqueles passeios turísticos onde o tempo firme e o sol constante a pino serviam como obstáculo a ser superado"...
Papillon sans vent 🦋