O Brilho Das Estrelas
Foi ali, tendo o tapete de folhas por colchão e as árvores por testemunhas que eles de entregaram.
Lígia, menina-moça de dezesseis anos entregou sua pureza, sua inocência num ímpeto de paixão e desejo.
Benito, rapaz de dezessete anos, apaixonado, recebeu a dádiva e em troca entregou todo o carinho, delicadeza e amor que um homem pode oferecer a uma mulher.
Depois, olhando o céu por entre as árvores, a tarde caindo, a noite chegando trazendo o brilho estrelas, juraram amor eterno e fidelidade intocável.
Quando se conheceram ele tinha quinze anos, ela quatorze. A linda garota perdeu os pais precocemente e sem ter pra onde ir, foi morar com a avó, cozinheira na casa dos pais de Benito.
Logo se apaixonaram. Os pais dele nem desconfiavam que estavam enamorados.
Depois da primeira vez, eles sempre se deitavam sob as árvores.
Até que foram surpreendidos. Uma tempestade se armou. Os pais jamais iriam admitir seu único filho de chamego com a neta da cozinheira. A avó da garota cobrava a reparação. Nos idos de 1940, uma mocinha se perder era uma tragédia. Ficava falada e marcada pra sempre. Não conseguia se casar e ter uma vida digna.
Os pais de Benito resolveram mandá-lo estudar longe dali e por precaução mantiveram a garota e cozinheira por perto para serem vigiadas.
Pouco mais de um mês após a partida de Benito, Lígia descobriu que estava grávida. Foi um Deus nos acuda. Os pais queriam a todo custo tentar um aborto. A avó não admitia nem falar nisso. As duas acabaram sendo expulsas da casa.
Benito mandava cartas para Lígia e seus pais não deixavam que chegasse às suas mão. Ele sem resposta e sem notícias de sua amada se sentia triste e deprimido. Ela, sem receber nenhuma palavra estava sempre triste e com a gravidez foi ficando cada dia mais fraca. Sua avó tentava cuidar e consolar, mas ela não conseguia reagir.
Um ano depois, quando Benito chegou para a temporada de férias, não encontrou Lígia. Seus pais disseram que ela já estava com outro e tinham até um filho. Magoado ele chorou e jurou pra si nunca mais procurar aquela falsa. Ela, sabendo que seu amor estava na cidade e não a procurou pensou que ele não a queria mais, que a abandonara com o filho.
O tempo passou e Lígia criava seu filho com dificuldade. Tinha que trabalhar para garantir o sustento. Ela e a avó faziam o que podiam.
Depois que se formou médico, Benito voltou e se estabeleceu em um consultório. Não conseguia esquecer seu antigo amor, mas como ainda estava muito magoado e pensando que ela estava com outro não a procurou.
Lígia sabendo da volta dele resolveu que ia procurá-lo, mostrar o filho e dizer o que estava atravessado em sua garganta pelo abandono covarde. Sua avó foi contra, mas ela dizia que não podia mais aturar tanto desprezo.
Ela chegou ao consultório perto do horário da última consulta. Aguardou até todos os clientes saírem e entrou. Benito empalideceu quando a viu com o filho.
—O que faz aqui? Não basta o tanto que me fez sofrer?
—Eu te fiz sofrer? Eu sempre estive aqui. Você foi embora e nunca deu notícias.
—E todas as cartas que mandei? Por que nunca respondeu nenhuma?
—Nunca recebi uma carta sua. Quando seus pais souberam que eu estava grávida quiseram que eu fizesse um aborto, como minha avó não aceitou, fomos expulsas.
—Você me esqueceu muito rápido. Engravidou de outro sem nenhuma consideração comigo.
—Que absurdo é esse que está falando? Nunca tive outro. O meu filho é seu filho. Por que seus pais iriam querer que eu abortasse o filho de outro homem?
—O que meus pais me contaram é que você estava grávida de outro.
—E você acreditou? Faça as contas. Nosso filho nasceu sete meses depois que você foi embora. Olhe pra ele. Veja se você pode negar que é seu filho. Não percebe as semelhanças com você?
Ele se calou. Engoliu seco. Olhou para o garoto. Depois disse:
—Sete meses depois da minha partida? É verdade?
—Você pode comprovar quando quiser. Eu nunca te traí. E você? Já tem outra?
—Não tenho ninguém. Nunca te esqueci. Durante todo esse tempo eu me senti profundamente traído e machucado. Então meus pais mentiram o tempo todo? Como puderam ser tão cruéis? — como se perguntasse pra si mesmo.
—Lembra quando, sob o brilho das estrelas, juramos amor e fidelidade? Ao anoitecer, sempre olho as estrelas e pergunto como pode ter esquecido seu juramento.
—Eu nunca esqueci. Sempre pensei a mesma coisa. Eu amo você! Mas além da mágoa que estava sentindo, pensava que você esteve todo esse tempo com outro.
—Seus pais renegaram e tentaram impedir o próprio neto de nascer. Eles sempre souberam que o bebê que eu estava esperando era seu filho.
Ele baixa a cabeça. Depois olha mais uma vez o menino. Os olhos dele têm o mesmo tom de azul que os seus. O rostinho lembra o seu. Ele não tem dúvida que deixou Lígia grávida e pensa no quanto ela deve ter sofrido. Uma garota solteira com um filho nos braços sem a sua presença para protegê-la. Pensa no amor que viveram e no quanto ela se entregou e confiou nele.
—Venha comigo. Vamos à casa de meus pais. Quero desmascará-los.
—Tem certeza?
—Certeza absoluta.
Eles chegaram. Os pais de Benito olham assustados.
—O que significa isso? — diz a mãe.
—Eu que pergunto. O que significa isso? Vocês souberam o tempo todo que Lígia estava grávida de um filho meu e nunca me contaram. Mentiram, caluniaram. Tentaram matar meu filho antes de nascer. O que posso esperar de pais como vocês? Sabiam que eu estava sofrendo.
Eles não negaram nada e ele soube que realmente Lígia dizia a verdade.
—Esta mulher e este bastardinho não são pra você. Não vê que merece coisa melhor — diz o pai.
—Não chame meu filho de bastardinho.
—Queríamos o melhor pra você. Esta mulher engravidou pra te dar um golpe.
—Esta mulher é a minha futura esposa e o meu filho tem um pai que vai reparar todos os erros que vocês cometeram. Eu estou saindo desta casa pra sempre. Não consigo mais olhar para os senhores, meu pai, minha mãe. Vocês agiram como monstros.
Eles saíram daquela casa.
Casaram-se sob o brilho das estrelas. Renovaram os votos de amor e fidelidade.