O NEVOEIRO QUE NOS UNIU

 

Hoje ando aprendendo a viver melhor, a encontrar o meu rumo, a guiar o meu barco em função das minhas marés, a não lutar contra a corrente a menos que ela me leve para onde não quero ir. Pensando bem nisso, um rio sereno, coberto de nevoeiro, ligeiramente silencioso, e lá estamos nós, dois barquitos á deriva que por acaso se cruzam no meio do nevoeiro sem que nada o fizesse prever. Tu disse qualquer coisa do género: “ainda bem que apareceste, andava aqui sozinha, completamente á deriva” qual donzela em apuros, ao que eu, como bom cavalheiro que sou, respondi: “bem, eu também ando um pouco perdido, mas anda comigo. Eu faço-te companhia, já não estás sozinha e entre os dois haveremos de encontrar o caminho certo”.  Uma bela imagem, sem dúvida digna de um belo romance, se algum dia escrever um. Tu e eu, naquele barco perdido no tempo, apaixonadamente á deriva, sem uma única preocupação no mundo, sem necessidade de rumo ou destino. Mas  é apenas uma bela imagem. Um precioso “mas”, que nos puxa de novo á terra e impede de andarmos constantemente a sonhar, de outra maneira andaríamos sempre á deriva, seja na imaginação, seja no quotidiano. És uma das mulheres com mais garra e determinação que já conheci. Não tive duvida que encontramos nosso rumo. É certo que essa candura esconde assim como eu alguma insegurança e solidão, mas é quase imperceptível, não te preocupes. Poucas pessoas além de mim  devem perceber sua inocência iluminada. É a tua maneira de sobreviver, de procurares o teu rumo. Nem certa nem errada, simplesmente a tua, é tudo. No entanto isso não te detém de perseguires os teus sonhos, tens-me ensinado um pouco do que não aprendi no passado sobre viver e sobreviver. Por isso, em jeito de tributo, vou contar-te um segredo, ensinar-te uma arma contra esses dias menos serenos. Quando o nevoeiro estiver um pouco mais denso na tua vida, quando andares um pouco mais perdida e á deriva, fecha os olhos e vai por alguns instantes aquele rio distante onde nos encontramos e as nossas almas vagueiam apaixonadamente á deriva. Eu estarei lá á tua espera, o teu porto seguro onde podes descansar e sentir-te protegida. E depois, quando te sentires de novo restabelecida, regressas ás tuas batalhas diárias que travas com tanta garra, mais forte por saberes que não estás sozinha nesse teu barco da vida. Quanto a mim… Bom, alguns de nós estão condenados a remar eternamente sozinhos... Não conheço o destino da minha viagem ou sequer se algum dia lá chegarei. Mas não fiques triste por mim. De tempos em tempos, vislumbro o teu rosto por entre a névoa, como ele é, sorrindo carinhosamente, dando alguma cor e luz aos meus dias cinzentos. E enquanto isso acontecer, será mais fácil enfrentar as tempestades. Se algum dia deixar de te ver… Chorarei as minhas lágrimas silenciosas, mas continuarei a remar. Porque agora não estou mais sozinho,  nunca desisti, como sempre fiz em toda minha vida. Não foi por acaso que remamos lado a lado... Resta-nos viver um dia de cada vez, o melhor que pudermos e soubermos, neste nosso canto acolhedor.  Eu e Você transpassamos o nevoeiro e juntos lembramos esse encontro inesquecivel...