Uma lamentável noite
O crepúsculo estava em seu ápice, repleto das mais belas constelações que resolveram contemplar aquela noite. A tempestade inundava as ruas com uma fúria mortal. Não poderia haver ninguém nas ruas, exposto a leve correnteza que se formava próximo ao escoadouro das esquinas daquela cidade pequena. Porém, uma jovem corria. Dobrando as esquinas e esquivando dos carros que se encontravam estacionados paralelamente sob a calçada. Um carro prateado em alta velocidade, quase derrapando, parou próximo a ela. Um homem desceu do automóvel desesperadamente, mas a jovem, sem olhar para a feição de angústia e desespero que aquele homem estava, continuo correndo, sem rumo. O homem se lançou de joelhos ao asfalto e gritou:
— Lisa, por favor, eu te amo!
Com um lampejo brutal de indignação, ela parou e virou. Seu olhar era mortal e penetrante, mas ela caminhou com toda a raiva súbita que a torturava naquela noite. Ao chegar diante do homem, o desprezo e tristeza tomou posse de cada célula e fibra que se contraiam em todos seus músculos. Ela robusteceu e seu olhar se transformou em pura tristeza. Ela chorou.
— Como foi capaz dirigir essas palavras de novo a mim? — Disse a jovem cuspindo as palavras e removendo os cabelos ruivos que cobriram seu rosto devido a chuva que ainda salpicada pela cidade . — O fato de você ter me traído, Júlio, não é o pior para mim, mas é por saber que você nunca me amou.
A feição e o olhar do homem diante dela se transformavam em pura vergonha.
— Lisa, me perdoe, eu te amo, eu...
— Para! - Ela gritou, interrompendo-o e descarregando pela noite, toda a raiva que a torturava. — Se você acha que isso é amor, Júlio. Eu sinto em te dizer, mas você nunca amou ninguém.
Então ela começou correr novamente, deixando o homem onde estava. Delirante. Ela estava delirante e sem rumo. A conversa com aquele homem a deixou completamente fora de si. Chorando em um desespero agonizante e sufocante ela se abaixou e retirou os pequenos saltos e lançou-os em um lixo próximo. Correndo. Só o que ela conseguia fazer era correr, para tentar fugir dele ou da dor que a penetrava, ela não sabia. Enquanto dobrava uma esquina aleatória, pelo canto dos olhos, ela viu uma luz e ouviu um estrondo. Ela gritou.
A chuva havia quase cessado. Um turbilhão de pessoas se aglomeraram próximo ao local do acidente. A jovem havia sido atropelada por um homem bêbado que tinha acabado de sair de uma boate próxima sem prestar nenhum auxílio. Ela estava deitada imóvel na rua molhada com uma feição indecifrável. Ela soluçou de dor, não pela dor física, mas pela dor imensurável que a vida a causou em seu coração. Uma última lágrima percorria o rosto da bela jovem enquanto ela murmurava uma última palavra e olhava, com seus olhos semicerrados, para o céu antes de sufocar com o último suspiro. Júlio. Era Júlio a palavra que ela sussurrava antes de partir.