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CUSTA MUITO DIZER ADEUS...

 

 

Anoitecera há algum tempo. 

Sentados num banco em frente ao rio Hudson, ambos contemplavam o calmo deslizar de pequenos fragmentos de lixo sobre as águas, que ao mesmo tempo refletiam as inúmeras luzes da cidade que nunca dorme.

Peter olhava-a de soslaio, ponderando o que deveria dizer a seguir. Decerto que Catherine estava com a mesma preocupação. Por fim, ele quebrou o silêncio.

- Sabes? Pensamos que temos tudo, possuímos bens materiais e vivemos sem problemas, para além daqueles comezinhos, triviais. Mas há um momento na vida em que surge uma luz, uma estrela resplandecente que nos ilumina, que nos faz compreender o sentido de tudo. Por vezes custa a interpretar mas depois tudo se torna mais claro, mais óbvio. É alguém que através do amor nos mostra o verdadeiro sentido da existência. É ter a companhia desse alguém que nos traz bem-estar e conforto em cada situação, nos apoia em momentos menos bons, nos escuta e nos envolve com um doce e natural carinho. E isso dá-nos confiança. 

Tossiu um pouco, clareando a voz e depois continuou:

- O escasso tempo que estivemos juntos, em que trabalhámos no mesmo projeto, senti algo de diferente. Eras uma companheira de trabalho, empenhada, que nunca regateou esforço ou sacrifício de tempo em prol do projeto que desenvolvemos. Foste a minha parceira, um exemplo de profissionalismo. Então compreendi que da minha parte havia algo mais forte que a simples simpatia ou amizade. Era uma dependência por tudo aquilo que tu representavas para mim. Mas sabendo-te casada e com uma filha fez-me cair a ficha, percebi que na realidade nunca temos o que mais desejamos – e olhou para a outra margem, mas um olhar vazio, pleno de tristeza.

Catherine pousou a mão no antebraço dele e olhou-o fixamente, tentando ler tudo aquilo que ia no coração de Peter. 

- Não és só tu que sentes isso, podes crer… Se fosse fácil lidar com esta situação… - e começou a chorar baixinho. Olhou-o de novo, o seu rosto molhado encostou ao peito dele. 

- Abraça-me por favor – sussurrou ela.

Peter abraçou-a docemente e assim ficaram, um pouco esquecidos do tempo.

Ela representava tudo aquilo que ele mais ansiara toda a vida mas era um fruto proibido, pertencia a outro. Acariciou-lhe o rosto, o amor que sentia por ela via agora com surpresa que era integralmente correspondido. E uma imensa alegria invadiu-lhe o coração, pelo menos até constatar que de pouco lhe serviria.

- Daqui a nada tenho de ir para La Guardia, o avião parte às 23h00, querido. Por favor, diz algo que me faça ficar…

Peter, emocionado, tentou controlar-se e por fim disse, a voz trémula com a emoção:

- Perdoa-me, meu amor, mas a tua família, sobretudo a tua filha, esperam-te, e apesar do muito que desejo ficar contigo, seria o maior canalha se te separasse deles. Vai, meu amor. Nunca te esquecerei… Desculpa não te acompanhar ao aeroporto. Detesto despedidas, fico de rastos e por isso prefiro fazê-lo aqui. E decerto que quando ouvires a nossa canção te lembrarás de mim…

Catherine tocou-lhe a face uma última vez, depois abraçou-o intensamente e beijou-lhe os lábios. De seguida, deu meia-volta e afastou-se em passo lento.

Peter ficou a vê-la caminhar até que, por fim, a sua figura esguia sumiu no fundo do parque. Então voltou-se para o rio e olhou de novo aquelas luzes que davam vida à cidade, uma miríade de pontos multicores que pulsavam e envolviam os seus habitantes. 

 

 

 

Ferreira Estêvão
Enviado por Ferreira Estêvão em 15/09/2023
Reeditado em 17/09/2023
Código do texto: T7886205
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