TENTANDO MUDAR O PASSADO

 

 

Aquele desbotado retrato em preto e branco, encontrado em meio a papéis e guardados antigos, foi determinante para que Hélio se empenhasse numa tarefa de certo modo muito difícil e até arriscada. Mas ele tinha que tentar, não custaria muito, apenas reviveria emoções que de certa forma até seriam agradáveis. Ele tomou essa decisão depois de repetidos sonhos que deixaram sua mente confusa. Havia saído de um casamento fracassado que durou pouco mais de cinco anos e que resultou num único filho, que atualmente está com sete anos, mas vive com a mãe. Hélio morava sozinho em um pequeno apartamento que foi herança de sua mãe e trabalhava em uma empresa de construção civil. Não era uma pessoa de posses, mas tinha uma vida tranqüila, apesar de amargar um pouco de solidão.

 

Sem pensar mais tomou a decisão, um novo sonho o levou a fazer o que o seu subconsciente pedia, bem cedo pegou o trem que o levaria àquela cidadezinha do interior que ele bem conhecia, onde morou durante toda a sua juventude, numa viagem que durou pouco mais de três horas. Conhecia tudo ali, mesmo o tempo tendo se encarregado de efetuar algumas transformações. A antiga vila onde fôra menino agora estava incorporara a cidade, algumas ruas estavam asfaltadas, o progresso pedia passagem e o comércio se propagava. Desceu do trem se mostrando surpreso, muita coisa havia mudado ali, caminhou um pouco observando a nova aparência do lugar, fazia muito tempo que por ali não aparecia. Sentou-se em um banco de praça e do bolso tirou o retrato desbotado daquela que conheceu ainda uma menina, namoraram por certo tempo e prometeram nunca se separar. Vieram imediatamente as lembranças, onde estaria Rosinha agora? Estaria morando no mesmo lugar? Teria se casado? Seria viva? Afinal já haviam se passado longos anos e ele com cincoenta e um anos, Rosinha era três anos mais nova que ele. Não fosse aquela decisão arbitrária do pai dela estariam hoje casados. Ele praticamente obrigou a filha a casar-se com um rapaz com quem ele simpatizava interesseiramente. Fábio era um rapaz pobre, mas havia ganho um bom prêmio de loteria e isso despertou a avareza do velho. Rosinha ficou "em cima do muro" e levada pelos conselhos paternos acabou cedendo. Desiludido Hélio acabou aceitando a situação. Com o passar do tempo seus pais foram morar na cidade grande em busca de melhores condições de vida e para ele foi ótimo, pois conseguiu um emprego com um bom salário.

 

A casa onde Rosinha morou era a mesma, praticamente do mesmo jeito, apenas algumas pequenas reformas. De cara ele vislumbrou a figura da mãe dela. Foi até lá tentando ver se ela o reconhecia. Com efeito, ela o reconheceu e sentiu uma tristeza imensa, o que despertou a curiosidade de Hélio, que surpreso perguntou se tudo estava bem. A velha senhora deixou rolar algumas lágrimas e contou toda a história da filha.

 

Rosinha, a princípio, não queria esse casamento imposto pelo pai (a mãe até foi contra, mas prevaleceu o desejo do pai), depois do enlace matrimonial ela continuou morando ali numa bela casa comprada pelo marido. Viajaram muito, correram mundo e se divertiram, porém durante esse período o seu pai adoeceu e acabou falecendo. Seu marido, levado pelo desejo de ostentação terminou gastando todo o dinheiro do prêmio ficando somente com a casa de alto padrão, sendo obrigado a vendê-la para comprar outra de menor valor, mas mesmo assim não foi suficiente para continuar com o mesmo tipo de vida. Levado pelo desespero o marido de Rosinha enveredou-se pelo caminho do alcoolismo e teve um fim triste. Depois de alguns meses de internamento por conta do uso indiscriminado de álcool faleceu. Rosinha então ficou só, sem filhos e triste. Quando avistou Hélio teve uma grande surpresa, não esperava que ele aparecesse e todo aquele passado foi voltando e deixando-a extasiada. Era uma mulher ainda em forma, estava com quarenta e oito anos e viu no antigo namorado uma forma de recompor sua vida depois de saber que ele não fôra feliz no casamento. Todo aquele passado parecia voltar, aqueles sonhos repetidos, a lembrança de Rosinha, tudo contribuiu para que ele fosse em busca da felicidade que lhe esperava.

 

Moacir Rodrigues
Enviado por Moacir Rodrigues em 23/05/2023
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