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SONHOS...
Vera dava voltas e mais voltas na cama, insone… desde que se cruzara com Gonçalo e chocara com ele, distraída, entornando o café sobre a sua camisa, que não conseguia esquecer o episódio… Pediu desculpa, muito atrapalhada e saiu sem sequer beber novo café…
Durante o dia seguiu a sua rotina diária, quando de tarde entrou na cafetaria, olhou ansiosa à volta, procurando-o mas nada…
Sabia que na rua também só por grande sorte tal aconteceria, entre milhares de pessoas… Mas aqueles olhos verdes, aquele rosto de menino que logo a maravilhara, marcara-a, não conseguia varrê-lo da ideia.
Ao final da tarde lembrou-se dos seus compromissos e envergonhou-a tais ideias… ela namorava há uns meses com o Gustavo, um moço sossegado que escutava seus desabafos e com ela passeava ao fim de semana no jardim, quando não estava a chover, caso contrário iam ao cinema.
Nessa noite sonhou com ele, encontravam-se num cenário maravilhoso, um coreto iluminado com mil e uma cores, ao centro uma mesa e duas cadeiras, dois flutes e um champanhe a gelar no frapê.
Vera sorriu quando ele lhe ajeitou a cadeira para ela se sentar e depois se sentou em frente. Não conseguia despegar os olhos dele… Somente o olhar, ainda não tinham pronunciado uma única palavra… Para quê, se o olhar dialogava com o coração e ambos o tinham a mil batimentos…
Às tantas ele pousou a mão sobre a mão dela e de repente Vera acordou na sua cama, ofegante… Mal imaginava que a alguns, poucos quilómetros dali, Gonçalo também acordava sobressaltado pois tivera o mesmo sonho…
Ambos passaram o dia com o pensamento um no outro e ansiaram desesperadamente para que a noite chegasse e voltassem a estar juntos, mesmo que em sonhos…
À noite, Vera deitou-se cedo, não sem antes se maquilhar, depois reconheceu ser uma tonteira, mas mesmo assim não tirou o batom nem a sombra suave que pusera nos olhos…decerto melhoraria o seu aspeto…
Em casa, Gonçalo adormecera a ver um filme clássico na TV… de súbito encontrou-se num cenário de nevoeiro mais ou menos denso… e do nada ela surgiu, esplendorosa, magnífica…
Gonçalo sentia que a amava de forma apaixonada, seu coração pulsava desordenadamente e quase que lhe faltava a respiração… imberbe em coisas do amor, para ele era um sentimento novo… o amor em toda a sua plenitude…
Por sua vez Vera há dias que nem se lembrava do namorado… Este jovem tinha-a fascinado, sentia-se preso a ele por fortes sentimentos, não conseguia tirá-lo do pensamento.
Aproximaram-se um do outro e ela tocou-lhe no ombro, depois deixou que seus dedos deslizassem pelo rosto de Gonçalo. Ele a medo fez o mesmo, Vera estremeceu perante esse toque de meiguice e de repente tudo se esfumou… Ambos acordaram nas respetivas camas, como que despertando de um sonho lindo…
No terceiro dia, no trabalho, Vera recebeu uma chamada de Gustavo, desesperado por ela não lhe atender as chamadas. Condoída, ela acabou por aceitar o convite dele para jantar.
Nessa noite, Gonçalo voltou a deitar-se cedo, adormeceu e viu-se numa praia deserta… caminhou pela areia, desgostoso porque à frente apenas o oceano e uma ou outra duna… procurou-a durante duas horas, ela não apareceu… Será que a magia tinha acabado? Adormeceu com o coração transbordando mágoa...
Vera, agastada porque decerto preferia encontrar-se com o seu príncipe encantado em vez de estar perante aquele moço tímido e demasiado calado para o seu gosto, olhava à volta, desesperada com medo de não voltar a ver o seu amado. Por fim, deixou o prato quase repleto, pouco havia comido, e alegando uma indisposição, despediu-se do rapaz e foi para casa.
Teve medo de se deitar logo e sentou-se num sofá a ler um livro… Leu um pouco de HORIZONTE PERDIDO, de Milton, mas às tantas, o sono e o veemente desejo de voltar a ver o seu ídolo amoroso fizeram-na adormecer…
Foi com desespero que constatou que ocorrera um desencontro, naquela praia vazia onde acordara, ninguém a não ser o doce marulhar das ondas morrendo na areia…
Depois pegou no sono mas de manhã acordou com grandes olheiras, as colegas no trabalho até se meteram com ela, a saber se havido passado por uma noite turbulenta…
Vera não reagiu aos chistes e foi para o gabinete tentar trabalhar… mas não conseguia…
Às tantas começou a chorar…
Alda, uma colega mais intima e que conhecia a história dela, estimulou-a com palavras de incentivo, nada estava perdido, quando menos esperasse, voltaria a encontrá-lo. Mas Vera não queria viver num sonho sem sentido… Queria realidade…
Alguns dias depois, em que tentou esquecer aquele homem que confundira completamente a sua vida, encontrou-se com o namorado e pôs fim à relação. Percebera que não o amava e sentia-se vil ao amar outro e ainda manter esse relacionamento.
Gonçalo vivia no limbo, triste, sem vontade de comer ou trabalhar… os sonhos tinham deixado de acontecer, nunca mais vira a sua princesa, nem em sonhos, muito menos na realidade…
Passando pela cafetaria onde tinham esbarrado da primeira vez, ele teve uma ideia repentina e numa florista ao lado, que tinha uma grande variedade de flores, comprou um ramo de rosas em botão e depois entrou na mesma cafetaria do encontro fatal, sentou-se e pediu um café. Sorveu o líquido aromático e como já estivesse bastante atrasado saiu à pressa, esquecendo-se das flores sobre a mesa.
Passados alguns minutos, Alda e Vera entraram nessa mesma cafetaria com o intuito de comer qualquer coisa, pois tinham pouco tempo antes de pegar ao trabalho.
Vera estremeceu ao ver o bouquet esquecido sobre uma mesa e sentiu instintivamente um baque no coração, Sem perceber porquê, apenas por intuição, olhou ansiosa à volta, depois correu para a porta mas nem de um lado nem do outro viu quem procurava, somente a multidão do costume.
Passaram-se uns dias, tanto um como o outro suportavam tempos tristes, Gonçalo considerou mesmo ir trabalhar para outra cidade.
Casualmente, Vera recebeu da amiga um convite para ir a uma exposição de pintura moderna, e depois de muito pressionada, acedeu ao convite.
Nessa tarde, um sábado, três semanas após aqueles encontros em sonhos, Alda e Vera percorriam as salas onde estavam expostas obras-primas vanguardistas, a segunda olhando distraidamente para os quadros, quando ao virar a esquina de uma sala, tendo-se desviado de um casal que abraçado caminhava com segredinhos, pouco ligando à exposição, deu de caras com Gonçalo, que distraidamente também visitava essa galeria.
Alda olhou a amiga e pela expressão da outra percebeu tudo, que ele era o tal. O olhar de fascínio, o modo como lhe pegou nas mãos, depois o abraçou e beijou não lhe deixavam dúvidas. Ele era sem dúvidas o sonho dela.
Gonçalo devorava-a com beijos, Vera chorava, feliz e convenceu-se que nunca mais se largariam. Seria para sempre dele…
-Olá, eu sou a Vera. E tu?
- Eu sou o Gonçalo. - E beijaram-se de novo, apaixonadamente.