Das Noites Insones

     Enquanto a cidade dormia ela aproveitava mais uma vez, como em tantas outras, para ouvir os sussurros daquela noite escura e divinamente estrelada.

Bem ao longe alguns pássaros noturnos emitiam sons agudos, como gritos desesperados ou anúncio de que nunca estamos sozinhos.

     As luzes das casas se apagavam uma a uma, os passos silenciavam lentamente, os transeuntes já se despediam da rua melancólica e solitária. Um ou dois casais passavam rindo, de mãos dadas, pareciam ignorar completamente a atmosfera nostálgica em que a ruazinha de tijolos maciços estava envolta. O vento soprava devagar fazendo as folhas esvoaçarem, provocando um frio sereno e aconchegante.

     Lua em mais uma noite insone, ouvia uma música e degustava seu vinho branco favorito. Tudo lhe fascinava, os pequenos ruídos, a bruma contrastando com alguns pontos de luz nos postes da rua, a atmosfera amena, as folhas dançando acompanhando o ritmo da brisa, a doçura do vinho e a sensação de estar na sua própria companhia. Era tudo tão perfeito. Rios de lembranças iam e vinham em sua mente, que em certos momentos, se tornava tão deserta quanto aquela rua.

     - Eu poderia escrever alguns versos- pensou!

     A noite é a grande dama, a grande inspiração, a amante dos poetas, a companheira dos solitários, é como se ela fosse capaz de compreender cada suspiro silencioso que sai do mais profundo do nosso ser. Perdida nesses devaneios, não escreveu, mas sentiu cada minuto como se fosse uma eternidade.

     Pensou nos “amores” que viveu, nas relações que ficaram pelo meio do caminho, no caos desses tempos loucos, nos amantes a quem entregou seu corpo, mas nunca sua alma, suspirou fundo e mais uma vez se deu conta do quanto era bom estar sozinha, do quanto está consigo mesma lhe fazia bem, que a solidão da noite fazia-lhe entrar em sintonia com o que há de mais profundo e mais belo em sua essência.

     Nas noites insones tudo se torna mais intenso. Porém, não havia espaço para tristeza ou arrependimento, apenas uma necessidade pujante de pedir perdão pelas vezes em que deixou de ser ela mesma por medo de perder pessoas ou para se enquadrar em determinados padrões sociais.

     - Todas as vezes que me perdi foi tentado deixar de ser eu mesma- sussurrou em voz alta.

     Mas, naquela noite estrelada, sozinha na sua varanda, com seu vinho e sua música, olhando a rua silenciosa, deserta e melancólica, Lua sentiu que realmente havia se reencontrado e que amar alguém pode ser uma forma de ser feliz, porém não é a única.

 

Josy Matos
Enviado por Josy Matos em 31/01/2023
Reeditado em 01/02/2023
Código do texto: T7708327
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