CÉLIA, A GAROTA DA PRAIA

 

 

   A praia estava deserta, na verdade eu nem sabia o que fazia ali, acho que foi a ressaca do ano novo que me levou até aquele local. Não sei se dormi ali, se fui com alguma pessoa, algum amigo, sei não. Só sei que do meu lado, sobre a areia, tinha uma garrafinha de cerveja ainda gelada, ou quase gelada, dava prá tomar. E eu tomei. Minha visão estava um pouco enevoada, quer dizer, meio embaçada, também depois do pileque do réveillon não podia ser de outra maneira.

   As imagens que eu via na minha frente começaram a ficar duplicadas, o ano ainda ia romper, isso foi há uns vinte anos, podem acreditar. Eu estava com um copo na mão, não sei que danado eu bebia, mas tenho a impressão de que era whisky, o cheiro de água de coco denunciava. Ouvi quando alguém me disse:

 

- Olha, os fogos já começaram, não vai ver?

 

- Vou ver - disse, procurando disfarçar para que não percebessem que eu estava quase de pileque. As luzes coloridas no céu realmente anunciavam que o ano estava virando e eu virando o copo. Fui até o jardim e... quem estava lá? Célia, uma morena da hora, uma garota que eu admirava demais, toda produzida, um mimo. Me encantei, pois não esperava que ela estivesse ali no meio da minha turma, da minha família. Ela me abraçou desejando feliz ano novo e eu aproveitei para sentir aquele prazer que gostaria de sentir em outros momentos. Na verdade eu gostava dela, queria namorá-la, tinha essa vontade, mas parece que ela não queria, sei lá! Mas nessa hora do rompimento do ano ela mudou, me entregou de bandeja seu corpo e isso me fez "acordar" e não mais tomar aquele whisky deixando o copo de lado, me interessava nessa hora era Célia. Quase não soltava ela, ia terminar os fogos e eu ali agarrado naquele belo corpo dentro de um vestido longo branco. Pelo jeito ela estava gostando, tanto é que lhe dei um beijo na face e ela nem reagiu. A cabeça rodava mas eu continuava firme, me fazendo de sóbrio, porém Célia deve ter percebido, então eu pensei, ela deve estar se aproveitando de mim. E ali ficamos como um casal de namorados, de vez em quando rolando um beijo na face, no ombro, foi quando eu decidi beijá-la na boca, naquela boca carnuda, cheia de batom. Pronto, foi tudo que eu queria.

   Ficamos namorando, só que esse namoro durou só alguns dias, ela mudou de cidade e nunca mais a vi, sumiu mesmo. Senti muito sua falta, estava bem interessado na Célia, que espetáculo de garota. E eu perdi. Nessa época eu tinha uns vinte anos, por aí, tinha acabado um namoro fazia uns três meses e imaginei que Célia seria a minha nova companhia amorosa. Me enganei. Ainda tentei descobrir seu paradeiro, mas foi em vão, nunca tive sucesso, para mim foi como ela deixasse de existir.

   O tempo passou, eu arranjei uma namorada e com ela me casei depois de dois anos. Não tive sorte nesse casamento apesar de ter durado quase vinte anos. Nos separamos, eu e Cláudia, tivemos dois filhos que tinham 16 e 17 anos, os mesmos ficaram com a mãe e eu me mudei para a casa de minha mãe onde me instalei no antigo quarto de solteiro, ainda disponível.

   Mas voltemos a praia onde eu estava, disse isso logo no começo, "tão" lembrados? Pois bem, lembro vagamente que era noite de 31 de dezembro, o ano ia romper e eu estava bebendo alguma coisa, foi aí que me veio a lembrança de Célia, lembram dela? Falei sobre ela numa situação quase igual a essa. Era noite em que o ano ia romper e eu estava quase de pileque. Nem vi o ano novo direito chegar, pois estava concentrado nessa garota cujo nome era Célia e que eu admirava demais, tinha vontade de namorá-la e até consegui, só que ela me escapou, entende? E agora me veio essa lembrança e eu nas mesmas circunstâncias, só que dessa vez não tinha Célia nenhuma. Tomei minha cerveja, o ano novo chegou, me lembro que vi os fogos pipocando no ar, um colorido sensacional, mas depois disso tudo não lembro de mais nada, só me vejo aqui nessa praia deserta ainda com o pensamento em Célia. Era de manhãzinha, o sol ainda não tinha dado sua graça, ninguém por perto e eu ali, digo aqui, na esperança de ver Célia surgir do nada e vir me abraçar e a gente começar tudo de novo. E não é que o destino me presenteou com isso! Vi claramente uma garota caminhando pela praia deserta molhando os pés descalços nas ondas que se quebravam na areia branca. Era Célia sim, aquele mesmo corpo moreno, aquele mesmo sorriso, aquele mesmo jeitinho de me olhar. Ela se aproximou lentamente, chegou bem perto e disse:

 

- Oi! Lembra de mim?

- Claro que sim, como ia esquecer.

 

Ela se abaixou e sentou na areia, não parecia ter mudado, continuava sendo aquela morena de antes, sensual, linda, sorridente, o tempo não mexeu com a sua juventude, continuava sendo aquela menina que aparentava ter uns vinte, no máximo uns vinte e dois anos. Fiquei surpreso, já que eu havia envelhecido um pouco, estava com 42 anos, mas não liguei para esse detalhe, o que importava era que Célia estava ali do meu lado, me fazendo companhia. E nesse momento não resisti e a beijei. Célia se deixou beijar, eu continuei, não parei, no entanto minha cabeça começou a rodar, tive então a impressão de que estava sonhando, mas sonho ou não eu não queria que aquele encontro fosse interrompido, tentei segurá-la com mais força e tudo terminou ali, como da primeira vez ela sumiu, desapareceu sem deixar vestígio e eu continuei ali, sozinho, eu e o mar, cujas águas já começavam a molhar os meus pés.

 

 

Moacir Rodrigues
Enviado por Moacir Rodrigues em 03/01/2023
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