Deitado é que penso nela
Talvez uma cama vazia seja um dos piores locais para uma mente apaixonada. Precisamente porque a falta de qualquer distração faz a mente pensar sobre aquilo que se releva sem pudor a todos sentidos: a falta do ente amado por perto. Eu me encontro assim e, pelas circunstâncias, julgo minha situação muito ruim, pior mesmo do que de outros amantes por aí, que pelo menos tem o luxo de serem amados. E é isso mesmo, ser a amante e ao mesmo tempo ser amado é um luxo, pois dá para ser um sem ser outro. Deitado numa cama vazai é que penso nisso e não só penso como sofro.
Não escondo, pois, que sou uma dessas mentes apaixonadas! O objeto da minha paixão exerce uma força que poderia ser equiparada a gravidade de dez mil estrelas, sou puxado a todos instante; sigo ela, com os olhos, com o corpo e com a mente. Minha mente é tragada, não passo dois minutos sem pensar onde ela está, pois a quero do meu lado, nem que seja para um risada ou um "oi". Um "oi" que vale mais que cem palavras trocadas com um colega, mais que cem canções de amor com os mais belos acordes. Cada palavra trocada com ela me causa arrepios e medos, pois temo dizer qualquer coisa que a afaste, um medo viciante, que parece inofensivo.
Sofro daquele tipo de paixão que turba meus sentidos, que me faz falar coisas que não falaria se não tivesse enevoado por esse sentimento. Um sensação que me faz agir estranhamente, que força meu olhar a se desviar, para não ser notado, enquanto eu desejo incessantemente por isso. É estranho! Nem sei mesmo se gosto dessa sensação... contudo, meu gosto não importa, justamente porque ela me puxa contra minha vontade - e eu me deixo ser tomado por isso.
Talvez a paixão não caiba em um verbete de dicionário. Talvez não, eu tenho certeza. Só conseguirei descrever o que sinto por ela descrevendo esses impulsos. E quiçá seja isso mesmo a paixão, penso agora, um impulso, mas não um qualquer. Um impulso corporal, que faz com que duas pessoas se atraiam, desejem-se, queiram consumir-se. Há algo de perverso nesse sentimento, note, pois tudo que não se controla pode ser perverso, é perigoso e agora provo - e eu, de novo, me deixo ser tomado por isso.
De qualquer modo meu caso é específico, e talvez por isso, pelos poucos precedentes que já conheci de tipos assim, eu tenho mais dificuldade de resolvê-lo. O fato é que eu gosto dela e ela não gosta tanto assim de mim. Eu quero namorá-la, tê-la ao meu lado e já disse tudo isso para ela e, ao contrário da maioria que recebe um sim ou um não, uma resposta para os anseios (mesmo que negativa), eu recebi uma terceira opção. Para ela seríamos melhor não termos nada, mas mantermos alguma coisa, um beijo aqui e outras carícias ali. Mas isso é ter algo, ou não? Não tenho certeza, e é por isso fico deitado aqui pensando. Talvez eu não chegue a uma resposta, ou talvez tudo tenha se resolvido e eu penso sobre algo que não existe, quem sabe?
Eu sei! Sei de algumas coisas pelo menos. Sei que aceitei os termos e me submeti a carícias esporádicas, sei que ainda a quero e sei que ignoro o que ela quer de mim enquanto ela querer ficar comigo. Mas também admito que não sei algumas coisas. Não sei até quando vou aguentar isso sem falar que quero toda ela, não sei aguento mesmo seguir sem me sentir mais pressionado pela incerteza e pelo medo do pouco que temos acabar. Talvez eu não saiba mesmo é nada sobre tudo isso que disse saber e não saber, só há dúvidas e elas sufocam.
Pensando bem, talvez eu deva seguir em frente. É o mais lógico. Se tudo não vai dar em nada, é melhor terminar o que temos aqui, assim eu sofro menos, ou sofro por menos tempo - assim fica melhor. Mas não, que bobagem, poderia alguém verdadeiramente apaixonado aceitar o fim sem lutar, sem nada tentar? parece um antinomia, o apaixonado desistir. Estar apaixonado é correr atrás, negar o não, e querer a certeza na incerteza. Mas que faço então eu nesse caso?
Depois de ter pensado muito, tenho que concluir (ou não também, talvez o sono chegue antes). Mas concluir o que, se sempre soube a resposta? A verdade é que a paixão é mais forte que eu, e farei o que ela quiser enquanto conseguir saciar esse impulso que me arde por dentro. E assim vou tocando a vida, né. Sinto por sentir. E deitado numa cama vazia é que penso nisso, não só penso como sofro.
Amanhã irei de encontro com ela (de novo), a saciarei numa noite calorosa e continuarei insaciado, pois assim é que é. De novo, ignoro o que ela pensa, contanto que esteja do meu lado. E talvez um dia ela termine tudo isso, mas eu não o posso; não porque não quero, mas porque a paixão não deixa.