Eu e você
Era assim, nós duas de mãos dadas o tempo todo, acariciando o cabelo uma da outra e descansando o nosso cansaço, deitadas no chão de cimento da escola. O cabelo da Livia era preto e comprido, bem negro mesmo e toda vez que ela deitava o cabelo dela se espalhava parecendo um leque; e o meu cortado curto, um pouco para baixo da orelha não tinha, nem de longe, a beleza que o dela possuía.
Todas as vezes que eu ficava triste lá estava ela para me acalentar. Um abraço apertado, um beijo no rosto, até um sorriso ou uma piada fora de hora era suficiente para me fazer sorrir. E ela conseguia, com o jeitinho dela, melhorar meu dia.
Quando a escola acabou nos afastamos um pouco. A Livia foi morar em outra cidade, ganhou uma bolsa de estudos para estudar medicina no interior do Estado. Eu permaneci na cidade, fazendo cursinho a noite, porém, durante o dia, trabalhava de recepcionista em um escritório de advocacia. O dia a dia dentro daquele lugar me fez pegar gosto pela profissão e com a ajuda dos meus chefes e árduos anos de estudo me formei advogada.
Só fui reencontrar a Livia em um momento não muito bom da minha vida. Após um longo ano de batalha, perdi minha mãe para um câncer maldito. Coitada, ficou magrinha, caíram-lhe os cabelos, e o sorrido dela desapareceu de uma hora para outra.
Enquanto meu mundo desmoronava, ela surgiu na minha frente, o cabelo negro e comprido, o batom pintando-lhe os lábios, um vestido preto no corpo e um abraço forte, caloroso e reconfortante, igual dos tempos de escola. Dessa vez não teve piadas. Livia me consolou, me falou palavras de carinho e do jeitinho dela acalmou meu coração.
Quando tudo acabou trocamos telefone, marcamos um encontro, só nos duas, para relembrar os velhos tempos. Chegando ao local eu a vi deslumbrante, tão linda; nos abraços e em seguida nos sentamos. Jogamos conversa fora, dessa vez rimos a beça, choramos um pouquinho também. E foi ali, no meio daquele restaurante, rodeado de mesas, de gente falando alto, que percebemos que nós éramos almas gêmeas.
A relação entre mim e a Livia é a melhor possível, com o tempo fomos nos acostumando com a distância, ela no interior, médica de sucesso, e eu na cidade, uma advogada bastante requisitada na firma. O tempo foi passando até que decidimos, na verdade, eu decidi sair da cidade e ir morar junto com ela, larguei minha vida aqui, meu emprego e abri um pequeno escritório na mesma cidade onde ela morava.
Hoje moramos juntas, cercados de cachorros, uma piscina enorme e uma televisão quase do tamanho de uma tela de cinema e todo dia tem pipoca, carinho e abraços...FIM...