HADES UTERINO (o sentido do olhar)
Esta é a minha mãe no chão seminua
Seu sangue se mistura com o asfalto da rua
O motorista não parou, acelerou
E fugiu, deixando gritos de pavor
Alguém mexe na bolsa dela e tira os pertences
Outros rodeiam para ver se a reconhecem
Ainda há almas caridosas... É verdade
E levam-na para a maternidade da cidade
Ela está grávida de mim, e teme me perder
Ela transpira o que eu sentira quando tento me mexer
Ela ilude a fraqueza, mas nada faz sentido
Enquanto aguarda a certeza de um parto induzido
A indução dói mais que um parto normal, a priori
Sussurram as médicas enquanto ela geme de dor
Doi saber que dois seres podem morrer
Um mal começou e o outro nem sabe se vai viver.
Pobre da minha mãe! Que dia cinzento?!
Pessoas questionando tal acontecimento
Nasci, mas sem o choro comovido
Apenas um silêncio que a feria os ouvidos
Eu mal me mexia, infelizmente
Doi ver a perda do fruto do próprio ventre
Admirado, vejo pessoas chorando por mim
Não sabia que ja era tão amado assim
Sei que todo filho é uma dádiva divinal
Sei que todo filho é um fruto sem igual
Se eu seria um bom homem, não sei responder!
Vou deixar cada um opinar o que poder
Cada um tem uma história de guerra ou de paz
Mas a minha termina aqui não diferente dos demais
Minha mãe chora forte e, reclama
Não sabe que a morte não separa os que se amam.