Um papel amassado e em branco
Sentiu o cheiro da chuva que se avizinhava e sua pele arrepiou-se ao sabor do vento úmido. Pensou no sol que ardera o dia todo e deu de ombros pensando que aquele céu de hoje não foi de azul sincero, estando agora de um cinza cumulus nimbus.
Qual a palavra certa? Buscava de memória tudo que construiu aquela história, para iniciar uma carta, já que não queria dizer nada de alta voz. Cartas de próprio punho são como documentos assinados e, por tal, incontestáveis.
Almejava escrever com espontaneidade desconcertante e lucidez inequívoca, mas não escrevera além do local, data e cumprimentos iniciais de praxe. Nenhuma palavra que pensava satisfazia-lhe a alma.
Sentimentos nostálgicos a engolfaram em ondas e a chuva começou a cair, trazendo outro arrepio. As luzes da cidade iluminavam o papel quase em branco, já que temia violentá-lo com as palavras inexatas.
Saiu à janela a contemplar a chuva e sentiu-se como num conto de seus autores preferidos, que sempre relia como se fosse a primeira vez, mas não encontrou inspiração para escrever nada.
Olhou novamente o papel. Amassou-o. Abriu-o novamente e escreveu: eis o que significas para mim…