Aconteceu No Carnaval
O carnaval estava animado naquela praia em que eu estava com amigos. Saímos pra nos divertir e curtir nosso carnaval.
Mais tarde notei um cara me olhando com insistência. Era charmoso e elegante. Eu investi no flerte e pouco depois nos conhecemos. Ficamos por ali conversando e nos divertindo.
Passamos o resto do carnaval juntos. Ele era interessante e gentil. Tinha um beijo e um toque de pele que me arrepiava e fazia sonhar. A gente se deu bem e uma simpatia mútua surgiu entre nós.
No último dia, ao se despedir ele disse:
-Muito em breve vou lhe visitar. Eu me encantei com você.
-Eu também gostei você, mas dizem que amor de carnaval, só dura um carnaval.
-Mas a gente pode mudar isso.
-O tempo dirá.
-Eu prefiro fazer acontecer.
Nos beijamos e nos despedimos.
Ele morava um pouco longe de onde eu morava. Eu gostei de conhecê-lo e de estar em sua companhia, mas não levei muito a sério. Encarei exatamente como um amor de carnaval que termina quando o carnaval termina. Naquela época o telefone celular estava apenas engatinhando. Eu nem sequer passei pra ele o número de telefone que ele poderia falar comigo. Ele sabia apenas a cidade onde eu morava e o local onde trabalhava.
Cerca de quinze dias depois, numa sexta-feira, eu atendi o telefone no trabalho:
-Vanessa?
-Sim.
-Sabe quem está falando com você?
-Se identifique, por favor.
-Não reconhece minha voz?
-Qual é o assunto?
-Desculpe. Você está no trabalho. Aqui é Marcelo.
-Marcelo? Que surpresa. Mas não foi difícil conseguir o número daqui não é?
-Não, não foi. Difícil é chegar aí. Você mora bem longe, hein?
-Depende do ponto de vista.
-Sim. Verdade. Estou quase chegando aí. Parei aqui numa cidadezinha pra ligar antes que você vá embora e eu não consiga lhe encontrar.
-Você está brincando…
-Não. Eu não disse prefiro fazer acontecer?
-Você é louco. Você não pode estar falando sério. Você está vindo pra cá?
-Sim. Daqui a pouco eu chego.
Eu nem sabia o que dizer. Na verdade, eu nem imaginava que ele tinha levado aquele encontro casual a sério.
E ele veio. Chegou cheio de amor e carinho. Como se me conhecesse há muito tempo.
Ele parecia fazer as coisas sem pensar muito. Vivia intensamente e tomava atitudes sem pensar no depois.
Ele se mostrava um homem carinhoso e apaixonado. Mandava flores, cartões, conversávamos por telefone com frequência. E assim eu fui me apaixonando por ele e em pouco tempo estávamos num namoro sério e eu encantada por ter encontrado um homem tão especial e que estava trazendo pra mim um mundo novo e cheio de emoções
Ele foi me envolvendo e cada vez mais se mostrava apaixonado.
Como sempre fazia tudo sem pensar e ponderar, resolveu se transferir para minha cidade e se mudou, vindo morar perto de mim.
Eu me deixei levar pela inconsequência de seus atos e decisões.
Pouco mais de um ano depois daquele carnaval, nos casamos.
Eu estava feliz e me sentia realizada por estar casada com um homem que me parecia quase perfeito.
No princípio do nosso casamento tudo era um sonho. Ele fazia tudo pra me agradar, faltava adivinhar meus pensamentos.
Mas com o tempo comecei a sentir que na realidade ele tinha uma certa dificuldade de demonstrar seus sentimentos. Não sei se ele mudou ou se depois do casamento mostrou quem realmente era. Ele tentava demonstrar seu amor com presentes e coisas materiais. E eu me ressentia disso. Apesar de ser independente e racional eu também sempre fui romântica e queria carinho, atenção e não presentes.
Ele sempre me dizia que teve uma educação muito rígida e que foi criado para ser um homem racional, que nunca lhe foi permitido demonstrar emoções.
E quando ele queria me dizer que me amava ele me dava uma jóia ou algum mimo que sabia que eu queria. E cada vez que eu queria sua atenção, seu carinho, seus gestos de amor e não recebia eu me sentia mais magoada.
-É um par de brincos lindo. Você sabe que eu amo brincos.
-Você sabe que eu gosto de lhe presentear.
-Mas eu não preciso disso. Eu trabalho, eu sou independente, eu posso comprar o que preciso. Mas eu não posso comprar carinho, atenção, amor, gestos de consideração.
-Mas eu não estou lhe demonstrando tudo isso nesse presente?
-Não. Todas as vezes que eu espero que você seja mais carinhoso comigo na cama, no dia a dia, que não me deixe sozinha, sem atenção e não recebo consideração, você me magoa, você mata um pouco do amor que sinto por você.
-Você me cobra muito e eu não percebo que faço isso. É o meu jeito. Eu sou assim.
-Cada vez que eu quero sua atenção, que eu preciso de um abraço, de uma palavra e que eu não recebo, eu me sinto desprezada.
-Talvez eu seja um pouco sem jeito, um pouco desligado, mas eu não quero nunca lhe deixar triste.
Eu não disse mais nada, sabia que não adiantaria.
Aos poucos nosso casamento foi desandando. Tínhamos várias discussões. O amor que eu sentia por ele foi se perdendo em meio ao que eu julgava ser descaso da parte dele.
A nossa paixão já não existia mais, nossos momentos mais íntimos e prazerosos foram se perdendo. Parece que para ele era tudo mecânico e racional.
Numa de nossas discussões ele me disse:
-Eu não sei ser como você quer. Eu fui criado pra ser assim, meus pais sempre cobraram atitude e postura de mim. Pra eles, um homem tem que ser forte, frio e não demonstrar sentimentos. Nem quando eu era criança, podia chorar ou me emocionar.
-Seu pais estão mortos. Você não precisa mais obedecê-los. Eu estou aqui ao seu lado. Eu sou sua esposa, é comigo que você vive. E eu não sei viver com um robô. Eu quero viver com um homem que saiba amar e demonstrar sentimentos.
Neste momento ele me abraçou:
-Mas eu amo você.
E pela primeira chorou em meus braços. E eu me arrependi de ter sido tão dura com ele.
Eu tentava manter aquele casamento pelo amor que ainda existia, porque ele sempre dizia que não sabia mais viver sem mim, que me amava e porque era muito sozinho e só tinha a mim. Mas parecia que era só da boca pra fora que dizia que me amava.
Eu pensava que talvez nosso casamento tivesse sido um erro, que foi precipitado e impensado.
Eu tentava não me transformar em um poço de mágoas com as atitudes dele, mas era difícil e eu não estava sabendo conduzir o casamento sem me sentir infeliz.
Por fim, para ambos, o casamento se tornou um fardo. Uma pessoa infeliz não tem como fazer a outra se sentir feliz.
Depois de onze anos de casamento nós resolvemos nos separar. Não foi uma decisão fácil.
Não tivemos filhos e portanto não tínhamos nenhum vínculo. Cada um seguiu sua vida.
Depois de resolvida toda a mágoa que foi acumulada durante o nosso casamento, voltamos a nos falar e nos tornamos amigos. E eu descobri nele um homem incrível, que estava sempre disposto a ser um confidente, a oferecer cumplicidade e lealdade. Ele não foi um bom marido por não corresponder às minhas expectativas. Mas se tornou um amigo adorável.
Ele namorou outras mulheres, eu namorei outros homens, mas nem ele e nem eu tivemos outro casamento. Fizemos viagens juntos, passamos horas conversando, até muito mais do que quando estávamos casados. Agora sabemos que entre nós o que funciona é a amizade.
Eu não me arrependo de nada do que fiz. Era exatamente aquela a vida que eu precisava ter. Aquele carnaval ficou marcado na história da minha vida. Eu vivi muitas emoções com ele, cresci como pessoa, aprendi muito e tivemos bons momentos que valeram muito mais que todos os maus momentos. E ainda ganhei o melhor amigo que a vida poderia me dar.