O CIRCO CHEGOU

O Circo Mundo Fantástico havia armado estádia na cidade de Água Branca, em Alagoas. Não era um circo muito conhecido, mas trazia grande alegria pelas cidades que passava.

Os artistas deste circo não eram numerosos, havia apenas dois palhaços, um malabarista, um apresentador e um domador de bichos. Para ajudar na armação das lonas, na manutenção e segurança durante os espetáculos, o circo contratava moradores locais. Geralmente pagava uma mixaria.

Um carro, com o palhaço Junco em cima, passeou pelas ruas de Água Branca, anunciando a atração da noite. As pessoas, curiosas, olharam pelas janelas, saíram às ruas, observando o carro passar. As crianças correram atrás do veículo.

O megafone do carro anunciava:

“Venham, venham todos assistir a grande atração desta noite. O Circo Mundo Fantástico fará apresentações espetaculares. Venham ver os palhaços Nanico e Junco fazerem suas atrapalhadas. Venham, venham todos.”

Enquanto o carro passava, uma moça chamada Aninha, parou de varrer a casa e ficou observando o anúncio. Seus olhos se fixaram no palhaço que estava em cima do automóvel.

Aninha ficou imaginando como deveria ser divertido viver na estrada. Conhecer lugares novos. Ela já tinha dezenove anos e tudo que conhecera até agora, foram as ruas de Água Branca. Ela não era estudada, vivia para cuidar da casa e da mãe, enquanto o pai saia cedo para trabalhar e voltava apenas quando o sol descia lá longe.

Assim que o carro já tinha ido embora, Aninha foi até a mãe:

— Mamãe, vamos ao circo hoje?

— Deixa de ser besta, menina! Não temos dinheiro para essas coisas! — repreendeu a mãe.

Aninha ficou chateada, mas ela daria um jeito de ir.

Quando a noite pousou sobre seu trono celeste, Aninha deu boa noite aos pais, disse que deitaria mais cedo, pois estava muito cansada.

Em silêncio, ela saltou pela janela do quarto e sumiu, escondida pelo manto noturno.

Ao chegar à entrada do circo, ela foi barrada, pois não tinha o ingresso.

— Por favor, quero entrar! — Aninha implorou, com a cara mais piedosa que conseguiu.

— Sem ingresso ninguém entra. — O porteiro foi taciturno.

Aninha continuou a bater o pé, e o porteiro continuou a dizer não. Porém, ela não iria desistir.

Quando os espectadores entraram e as portas da bilheteria foram fechadas, Aninha deu a volta até encontrar uma brecha. Ela achou o que procurava e, sem pensar duas vezes, entrou. Procurou um lugar e sentou, quietinha.

Aninha ficou maravilhada com o espetáculo. Ela nunca havia visto o circo, tudo ali era mágico para ela.

Quando a apresentação acabou, o apresentador disse:

— Obrigado a todos que apreciaram este espetáculo. Quem quiser um autógrafo dos artistas, podem fazer fila e vir aqui no picadeiro.

Um a um, os espectadores foram receber autógrafos. Aninha deixou a massa diminuir; quando poucas pessoas restavam, ela se dirigiu ao palhaço Junco, pois ele fora o primeiro artista que ela vira na vida.

— Eu te vi em cima do carro. — Ela disse para o artista.

O palhaço Junco ficou enamorado da bela moça a sua frente. Ele demorou um pouco para responder.

— Ah! É verdade. Era eu. — Ele sorriu e deu um autógrafo para Aninha.

— Como é? Conhecer as cidades?

— É como ser um pássaro. Voar livremente.

Aninha ficou maravilhada, queria ser livre, voar por aí.

— Você vem no próximo espetáculo? — perguntou o palhaço Junco.

— Não. — Aninha disse e começou a rir. — Eu não tenho dinheiro.

— Como pagou a entrada de hoje? — Junco indagou.

— Eu não paguei.

O palhaço e Aninha riram.

— Garota esperta!

— Não sou de fazer essas coisas, mas eu queria conhecer o circo.

— Vou te ajudar. — O artista se retirou por alguns momentos e voltou com cinco ingressos para a garota. — Pronto, agora você não precisa mais entrar sem pagar. Estou te dando ingressos para todos os outros dias. — Disse por fim.

— Vocês ficarão só mais cinco dias?

— Sim, somos poucos; e as apresentações logo ficam saturadas.

Aninha quis perguntar o que era “saturadas”, mas teve medo do artista a achar estúpida, então somente concordou.

Durante os cinco dias, Aninha fugiu pela janela de seu quarto para ir assistir ao espetáculo. Ao fim de cada show, ela conversava com Junco. Ela descobriu que o nome verdadeiro do palhaço era Gabriel.

Era o último dia de espetáculo, e Gabriel acompanhou Aninha até perto de sua casa, pois eles ficaram até tarde contando histórias junto com a trupe.

— Amanhã vou embora, — falou Gabriel, um pouco melancólico.

— O tempo passa rápido quando a gente se diverte. — Respondeu ela, também melancólica.

Gabriel pôs a mão no rosto de Aninha, gentilmente a beijou nos lábios.

A princípio, Aninha ficou sem reação; nunca ninguém a beijou. Contudo, conforme foi passando a surpresa, ela retribuiu o beijo.

— Vem comigo? — pediu Gabriel.

— Embora? Não posso deixar meus pais.

— Vem viver a vida comigo, Aninha. A gente volta para ver seus pais, quando pudermos.

— Eu não posso. — Aninha falou, — tenho que voltar para casa.

Aninha passou a noite em claro. Ela queria se aventurar pelo mundo, mas como deixar para trás sua mãe, a quem tanto amava? Ou o pai, que tanto lutava para pôr o alimento na mesa?

Ela estava tentada a se aventurar, ela gostou de Gabriel. Mas ela sabia que seus desejos e seu sentimento pelo artista não eram suficientes, ela não era corajosa o suficiente.

Quando amanheceu, os olhos de Aninha estavam inchados.

— Que cara é essa, menina? — perguntou a mãe.

— Não consegui dormir direito, mamãe. — Aninha foi sucinta.

— Arrume essa cara, temos muito o que fazer!

Aninha ajudou a mãe com os afazeres.

Quando já era tarde, e o pai já havia voltado, ela foi para o quarto, nem mesmo quis jantar.

Quando a lua já estava alta, Aninha pulou a janela do quarto e foi ao local onde o circo havia estado no dia anterior. O que ela viu foi um espaço vazio.

O circo foi embora. Gabriel foi embora.

Aninha deixou as lágrimas caírem. Ela se lamentou; a vida era dura, e o amor exigia sacrifícios.

Felipe Pereira dos Santos
Enviado por Felipe Pereira dos Santos em 11/07/2022
Código do texto: T7557396
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