Quando um Palhaço Chora
Quando um Palhaço Chora
Caminhava pelo centro da cidade, quando vi um homem sobre um pequeno palco, suas roupas eram coloridas e alegres, com grandes figuras geométricas, alternado nas cores amarelo, verde, vermelho, azul e um alaranjado brilhante.
Vestia uma calça folgada, bufante com suspensórios, sobreposto à uma camisa branca de cetim de mangas fofas e uma grande gravata borboleta na mesma cor que das calças.
Usava uma peruca com grandes e soltos cachos amarelos.
Ainda distante da figura que de longe chamou minha atenção, aparentemente, se tratava de algum artista levando entretenimento aos transeuntes, arrecadando fundos à alguma instituição ou, até mesmo, para si. Nesses tempos de miséria, não se duvidaria.
Chegando mais próximo àquele homem vestido de palhaço, percebi que ele usava de mímica expressando sua retórica, a qual não pude conter minha paralisia e comoção.
A maquiagem que ele usava, não era nada comum aos muitos palhaços que eu já tinha visto em toda a minha vida.
O trajeto de uma lágrima deixava claro que aquele palhaço havia se maquiado com tristeza em sua alma. A expressão em sua face e o modo como serrava seus punhos, estendia suas mãos, as leva ao alto da cabeça, batia em seu peito, agarrava algo no ar e puxava para si, atuava tentava convencer alguém sobre algo. Mesmo sendo bastante observador e sensível, não pude captar sobre o que se tratava a sua performance, aguçando minha imaginação.
Toda aquela alegria em cores naquela figura, esperava-se encontrar uma apresentação alegre e cômica onde todos pudessem rir de sua atuação. Mas, olhando a minha volta todos que ali paravam para vê-lo, estavam como eu, atentos e comovidos.
Nada naquele palhaço parecia engraçado, a alegria das cores de suas roupas, ao olhar seu rosto e seus movimentos, se apagavam em tons neutros de solidão e tristeza.
Era indescritível e surreal a expressão naquela maquiagem, junto àquela atuação de mímicas, em seus gestos, pude entender que ele contava a sua dor. Mas que dor? Me perguntava: o que poderia ter acontecido em sua vida pessoal ou seria só mais uma ato teatral.
Passei a criar várias hipóteses em minha mente, seria a dor de quem perdeu um ente querido, um grande amor ou, só estava tentando fazer o público refletir sobre a dor do outro, para que tivéssemos mais empatia, fazendo com que nos colocássemos como personagens naquela peça? Ou seria algo mais profundo e real onde precisasse ecoar seu grito silencioso de um coração partido? Sim, para mim que já havia sofrido por amor, era o motivo que mais me convencia.
Sua máscara de muitas alegrias, agora, borrada de tristeza, comove a todos que o assistiam. Algumas pessoas que se retiravam do local, partiam carregam em seus rostos um pouco da tristeza daquele ator e aos que chegavam pensando em rir de suas graças, tipica dos palhaços, saiam dali com muito a refletir, que nem todo palhaço é feliz ou te faz rir.
Me despedi, curvando minha cabeça com as duas mãos no peito, logo estendendo as mãos ao alto, gritando em silêncio, um "Bravo!" ao artista.
Segui ao meu destino com a imagem daquele ator em seu último ato. Com os punhos fechados batendo em seu peito, estendendo logo em seguida suas mãos como se estivesse pedindo para alguém não partir. Visto que a partida foi inevitável, se deixa cair ao chão em posição fetal, contorcendo-se em dor como uma criança ferida.
Não pude evitar algumas lembranças do passado, escorre uma lágrima na minha face, porém, logo sorrio pensando nas vastas possibilidades de interpretação daquele impecável ato.
Ana Cristina Silveira