O Corno Virtual
Mal casaram-se, nem deu tempo para uma perfeita lua de mel e logo apareceu a notícia de agravamento da pandemia do COVID 19.
Úrsula era bem jovem e sensual despertava o desejo de vários homens, mas sempre se manteve fiel aos namorados da vez, trabalhava lecionando aulas on-line para alunos de inglês e para isso reservou um dos quartos de seu apartamento, com computador, boa internet e câmera.
Ailton era um cara bem apessoado e trabalhava em um banco, saia de casa as sete da manhã e retornava as sete da noite, chegava cansado e com esse tal de vírus tinha que largar todas as roupas na entrada de serviço e correr para o banheiro e depois ainda não podia pegar a mulher para não infectá-la, .Ela era pirada de medo por qualquer doença e tinha um enorme pavor de morrer.
Depois do banho até que Ailton tentava cumprir sua obrigação de marido, mas Úrsula recusava sob o argumento de que ele poderia estar com o vírus encubado.
Enquanto isso ela isolava-se no seu gabinete de trabalho, as vezes estava a trabalhar e outras a rezar, assim avisava para Ailton não a interromper.
Um dia, encontrou em seu face book uma mensagem de um sujeito pedindo para ser amigo. Logo o identificou, um moreno alto e musculoso que fora seu colega na academia, deu vontade de excluí-lo de imediato, mas repensou e foi verificar as fotos dele, lá estava aquele olhar provocante que a estuprava todos os dias na academia. Não aceitou e nem excluiu, nenhum problema lhe traria, estava casada e seria fiel a seu marido, mas ficou a relembrar aquele olhar, e gostava de relembrar, se passara tanto tempo, mas o olhar agora lhe provocava como nunca, aparecia a todo momento, até durante as aulas com seus alunos de inglês ela enxergava o olhar do moreno musculoso.
Certo dia apareceu no seu WhatsApp uma mensagem pedindo-lhe “me aceite como amigo”, assinava Kleber. Ele havia, com jeitinho, conseguido não só o número do celular como o endereço de Úrsula com a secretária da academia.
Respondeu-lhe secamente, “não se atreva, ou irá se haver com meu marido”.
Uma semana depois orquídeas cor de rosa chegaram à portaria do prédio “para ser entregue a Sra. Úrsula”, o remetente era o Kleber, que mais uma vez suplicava “me aceite como amigo”.
Úrsula ficou entre nervosa e feliz, jamais houvera ganho flores de um homem em toda a sua vida, resolveu então aceitá-lo como amigo no face book, que mal faria, era tudo virtual mesmo, menos as orquídeas rosas, que eram uma declaração de amor.
Correu ao computador e aceitou Kleber como seu amigo virtual e logo lhe enviou uma mensagem de boas vindas e agradecimento pelo gesto tão amável.
Estabeleceu-se assim um papo diário pelo face book e que logo veio a se tornar rotineiro pelo WhatsApp.
Um dia, Kleber sugeriu que em algum momento do dia se falassem pelo Skype, assim poderiam contemplar um ao outro. Úrsula não concordou de início, mas logo lhe deu vontade de apreciar aquele olhar malicioso, penetrante e se fez muito bonita para tanto. Que mal faria, era tudo virtual mesmo, pensava.
A conversa pelo Skype se dava no meio da tarde, momento em que reinava paz em toda a casa. A cada dia o entusiasmo pelo encontro era maior de ambos os lados. Kleber caprichava nas camisas regatas dando toda ênfase ao seu peitoral e seus braços musculosos, Úrsula passou a comprar blusinhas bem decotadas e compô-las com sutiã meia taça. Era completa a excitação dos dois.
Um dia Kleber, sentindo o clima propício, colocou pimenta na conversa:
- Linda, eu sinto que a gente anda tão carente de uma satisfação sexual.
- Que você quer dizer com isso seu louco?
- Que a gente poderia se satisfazer aqui, conversando, faz de conta que estou cochichando em seu ouvido e você no meu.
- Sim, faz de conta e daí?
- Você me excita e eu lhe excito. Que tal você me mostrar seus lindos seios?
- Que estranho Kleber! Mas acho que vai bem, na verdade já me acaricio quando estamos conversando, me excita muito a ideia de sexo virtual. Não será pecado.
Daí para frente Úrsula fez um enxoval de sutiãs e calcinhas, estas bem sensuais de modo a agradar ao Kleber, e as seções de Skype passaram a ser mais longas e mais prazerosas. No momento dos encontros virtuais ela virava a imagem do santo de sua devoção de costas para ele não a ver nua se contorcendo de prazer na cama perfumada.
Ailton já estava desesperado, não era dado a masturbações e se encontrava no limite, então teve uma ideia de que achou brilhante e chegou em casa contente e excitado para informá-la a Úrsula e logo pô-la em prática.
- Amor, tenho uma ideia para a gente namorar, que não será possível a infecção pelo COVID19.
Sem muita vontade de ouvir, pois satisfeita pela orgia vesperal, Úrsula mandou que ele falasse.
Ailton ficou um tanto sem jeito pelo desinteresse, mas prosseguiu:
- Numa posição que a gente não fica de frente para o outro, e logo partiu para mostrar na prática.
Úrsula deu a louca, disse que não iria ficar de quatro, que não era animal, que aquela posição não fora concebida para humanos. Ailton murchou e nesta noite satisfez-se às sós.
A relação com Kleber estava cada vez mais intensa, nem ela nem ele aguentavam mais tanto sexo virtual, em que pese Úrsula a cada dia se tornar mais desinibida em seu desempenho frente a câmera, e começaram a projetar um encontro físico, quando acabasse a crise do COVID19, ele, nesta época, estava morando em Aracaju.
Mas alguns dias e Úrsula quase enlouqueceu, esperou a chamada de Kleber por três dias e nada, contatou-lhe pelo face book, pelo WhatsApp, fez ligações telefônicas e caia na caixa. Que teria acontecido, não aguentaria ficar sem notícias. Estava apaixonada, consentiu.
Desesperada, pegou o carro assim que o marido saiu para trabalhar, nada avisou, tomou a estrada com destino a cidade de Aracajú, 315 quilômetros de Salvador, ainda chegou a tempo, mas não pôde assistir o enterro do parceiro virtual. Fora vitimado pela COVID 19.
LUÍS BACELAR VIDAL