Primeiro amor

Aquele seria seu primeiro baile de quinze anos. Sua primeira valsa, seu primeiro amor ... há três anos começara a sentir tremor nas pernas, suor excessivo pelo corpo, coração acelerado , saltando pela boca, brilho nos olhos, emoções vividas sempre que via o vizinho, estrábico, usava óculos, estatura mediana, olhos negros, cabelo ondulado - um pão - como se dizia à época. Morava em uma dependência de madeira azul desbotado ao lado, com a tia, Cornélia, mulher invejável, guerreira, caminhoneira, e seu primo Roberto. De família rica mas falida, viera para Londrina trabalhar e estudar. Intelectual, lia Camões, Victor Hugo, Dostoiévski, entre tantos. A menina franzina, sardenta, de nariz vermelho, olhos castanhos esverdeados, apaixonada, lia seu coração. Trabalhava de arrumadeira na casa da avó, três casas acima da sua e, da janela da despensa, ficava olhando o moço bonito na cozinha. Varria rigorosamente, a calçada da rua, todos os dias de manhã, só para vê-lo passar. Um dia ousou dar-lhe uma rosa, a mais viçosa do jardim. No outro dia, lá estava a perfumada flor na lata do lixo. Que dor. Que vergonha. Chorou, chorou, mas não desistiu. Em algum momento ele haveria de a querer, pensava a pobre menina. Entre rodas de samba e serenatas, fazia de tudo para o conquistar: tocava violão, cantava em espanhol, Bésame Mucho, francês , L'amour est Bleu, inglês, Strangers in the Night, cantava Maysa, sua cantora predileta :" hoje eu quero a rosa mais linda que houver, quero a primeira estrela que vier, para enfeitar a noite do meu bem" , e nada. Nem sequer um olhar , um toque de mãos ... seria timidez? Pensava. Quando a prima convidou-a para dançar a valsa em sua festa de quinze anos, o coração bateu direto na porta do vizinho. E por que não? Ele adorava dançar, adorava festas, adorava o glamour dos eventos sociais. Aceitou na hora. Sem pestanejar. Ela nem dormira naquela noite... pegar em suas mãos, sentir o seu cheiro, rodopiar Danubio Azul em seus braços... estaria sonhando? Escolheu seu melhor vestido, comprou sapatos novos, arrumou o cabelo no melhor cabeleireiro do bairro, e lá foram. Uma noite de sonhos. Sentiu-se a própria Cinderela.Tremia, suava, sorria, vivia. Mas ele parecia não estar em seus braços, seus olhos eram para um outro alguém... cabelos à la James Dean, blazer azul marinho impecável , jeito sedutor... a primeira troca de olhares fisgou seu coração.