DOS EXCESSOS E DA ESCASSEZ DO AMOR

Na medida em que o amor ganhava maiores proporções de desejo, que já Platão traduzia como falta, despedia-se das posses amealhadas por obra de muito trabalho e contenção de gastos. A vida pouca, casa-trabalho-casa, silêncios enormes, discrição, voz baixa, a roupa sempre a mesma, camisa branca, ostentação só de livros. O amado, encontrado quando a maturidade deveria ensinar sossegos e abnegações, morava a centenas de quilômetros, a gasolina em aumento semanal, imensos gastos nas idas e vindas não mais no caminho certo dos muitos anos, mas no das incertezas da paisagem e destino. Culpa da política da Petrobrás, desde o golpe contra Dilma, sucedida por dois impostores: um primeiro, Judas que vendeu a alma por bem mais do que aquele sujeito dos tempos bíblicos quando a ganância cabia nas mãos; um segundo que talvez se vingasse de uma suposta facada, esfaqueando o povo há três miseráveis anos. Era amor, valia o sacrifício, o empobrecimento para tão nobre encanto. Eliminou a carne, contentando-se com ovos dia sim dia não. Abrira já mão da cachaça, porque lhe aumentava o desconsolo em vez de aplacá-lo e comprometia as taxas de glicose, em perigo de diabetes. O amor não se contentava com pouco, depois de tantos anos de carência e pouquidade. Desfez-se do carro, desfez-se da casa, desfez-se de um terreno grande, em que plantara uma amoreira. Desfez-se dos móveis, desfez-se do cigarro. Por fim, como podíamos vê-lo pelas fotos no Face, desfazia-se das últimas peças de roupa, a lucidez resistindo potente na qualidade dos versos que eram todos exorbitância de amor. Valeu a pena, perguntava-se, em meio a ausências. Não sabia onde guardar um último soneto e a solidão enorme.