CARTA PARA DEUS

Eram dias tristonhos, desde a última mensagem em que Maria disse: FICA COM DEUS, MEU AMIGO. As interrogações eram a razão da dor de cabeça que acometia Breno. Para tentar aliviar a dor, naquela tarde chuvosa, resolveu escrever uma carta para Deus ler. O rapaz usou a fé, desabafou com Deus. Por que Maria reapareceu depois de dezoito anos? Não foi pessoalmente, mas sim pelo aplicativo de mensagens.

Nesse dia, Breno estava retomando seu trabalho de jornalista na internet, estava vivendo sua vida, se recuperando de uma decepção amorosa. O rapaz colocou seu coração nas mãos de Deus, e passou a cuidar de outras áreas de sua vida, no intuito de dar uma sacudida, se libertar da roupa da tristeza que vestia sua alma. " Agora é vida nova! ", dizia consigo o jovem, com um semblante renovado.

Breno é um rapaz que estava na faixa dos quarenta anos, bem tranquilo, avesso a farras e noitadas, sem vícios, muito educado, um amigão que, embora tímido, é um ser humano que está sempre disposto a ajudar, estender a mão... enfim, uma pessoa que ninguém consegue acreditar que esteja sozinho, não tenha uma companheira. A verdade é que Breno, parece não ter sorte ( se é que assim podemos dizer ) no amor.

Ele, na época dos seus vinte e poucos anos, conheceu Maria Crislane. Foi num sábado à noite. Breno estava passando as férias da faculdade no Nordeste, mas precisamente em João Pessoa.

Tinha muitos parentes da parte paterna que eram da capital paraibana, pessoas que ele nem conhecia, a não ser por fotos ou somente de nome. Breno resolveu aproveitar as férias para, além de sair do estresse de São Paulo, também estreitar os laços familiares. Foi bem recebido na rodoviária por Odivânio, o primo que ele tinha mais contato e que foi o seu cicerone na cidade. O rapaz era bem animado, namorador, piadista. Breno gostava muito da companhia dele. " Primo, seja bem-vindo! Já chegou tirando onda né, tá parecendo ator de Hollywood. Aqui você vai arrumar uma mulher maravilhosa, aqui tem cada gata que você vai amar ser arranhado. Só peço que namore, mas não se apegue. Porque o beijo das mulheres daqui costumam hipnotizar, aí meu camarada: é namoro, noivado e até casamento"

Breno caía na gargalhada. Ele era um rapaz comportado, não tinha a índole de farrista e aventureiro do primo paraibano. Breno tinha um sonho de formar uma família. Era um jovem com bons pensamentos, e esse sonho ele sempre pedia a Deus que o realizasse. Breno chegou no Nordeste e passeou muito: praia de Tambaú, Piscinas Naturais do Seixas, Centro Histico de João Pessoa, Parque Sólon de Lucena...

Realmente, férias inesquecíveis!

Mas o melhor de tudo Breno ainda iria conhecer: a doce Maria Crislane, doce e ao mesmo tempo com um temperamento um pouco difícil. Uma semana antes de ir embora, Breno recebeu um convite de seu primo Odivânio para irem até a casa de Maria ( ela era tia de um amigo de infância de Odivânio ). Odivânio disse que a tia Cris ( como ele a chamava ) era a fim dele. Cris era uma mulher ainda jovem, uma balzaquiana, teve algumas decepções amorosas. Nunca foi feliz no amor, jamais sentiu o prazer de amar e ser amada. Breno amou olhar nos olhos azuis de Maria, percebeu-os tristes. Breno quase não falava nada, tampouco Maria. Odivânio era quem quebrava o gelo com suas piadas. Breno e Odivânio foram mimados por Maria com sorvete e pudim. Breno disse que amou a cidade, e que sem dúvida voltaria mais vezes.

Breno já sentiu em sua alma o desejo de morar em João Pessoa só pra estar mais bem perto de Maria. O jovem se despediu de Maria com um beijo no rosto, mas já meio que querendo tocar seus lábios nos dela. Odivânio notou que o primo ficou bem interessado ( pra não dizer totalmente apaixonado ) em Maria Crislane, e então resolveu não mais investir em Maria. Ele, como não queria mesmo nada sério, e tendo em vista o histórico de fracassos amorosos na vida de Maria, abriu mão e deixou o caminho livre para Breno.

E o caminho do jovem paulista estava aberto, ele regressou à Cidade do Sol. Sua vida amorosa começou a deslanchar, seu sonho estava se tornando realidade. Mãos dadas, carícias no rosto, conversas para expor o que havia no coração, Breno e Maria foram percebendo coisas em comum. Breno constatou que seu primo Odivânio realmente tinha razão: o beijo da mulher paraibana é doce e atrai mais que imã, é hipnotizante. Eis que a felicidade era uma constante no namoro!

Depois, através de muita luta, chegaram a fase do noivado.

Breno estava na expectativa do casamento, mas a vida difícil, o pouco dinheiro, o desemprego, tudo jogava contra o sonho. Breno gastava sola de sapato entregando currículos e nada! Maria era uma doçura de pessoa, mas por ser tão bela e tão atraente queria ser mimada, paparicada. Breno não sabia mais o que fazer para bancar os luxos da mulher. Maria não queria trabalhar fora, só queria ser dona de casa, amava os seus móveis, seus eletrodomésticos, seus bibelôs, seu guarda -roupa com vestidos de seda.

Maria começou a virar a cabeça, o amor que sentia por Breno deu lugar a reclamações tipo: " Breno, você com tanto estudo não consegue um bom emprego? Como é que pode? ", " Breno, sua mãe chegou aqui com a sua avó doente. Ela nem tem modos pra falar, ela achou que eu iria sair daqui do meu lar para resolver o problema que ela mesma criou, deixando sua vó com fome para ficar direto na igreja sem obrigação com a casa. " " Eu amo a minha casa, amo me vestir bem. Sua mãe com aquelas roupas cafonas, eu acho ridículo. Não sei como ela não tem vergonha! "

Breno foi alertado por Deus! Mas infelizmente seu coração já estava preso ao coração de Maria. Ele era um rapaz que não queria passar uma imagem de aproveitador, por isso ele fez de tudo para ir levando aquela situação na esperança que viesse mudar. Até chegar o dia em que o seu " saco encheu " , chegou no limite. Breno voltou pra São Paulo, mas com o pensamento ainda em Maria. Ela o levou até a rodoviária. Estava triste, mas ao mesmo tempo mantinha um leve sorriso no rosto por achar que Breno voltaria para ela, como já tinha acontecido algumas vezes. Mas Breno estava decidido, dessas vez não tinha mais volta! E realmente não teve mais! Breno voltou pra casa dos pais, que já tinham deixado João Pessoa um ano antes, pois estavam se sentindo impotentes por não conseguirem abrir os olhos do filho. Breno chegou e, graças a Deus, não ficou ouvindo sermão dos pais. Muitos deveriam agir assim com os filhos, ao invés de ficarem falando: " Eu não te avisei! Você é isso, você é aquilo... Bem feito, não nos ouve! "

Na vida adulta a melhor lição é quebrarmos a cara para aprender.

Breno sofreu, mas não quis mais voltar pra Maria. Não atendia mais os telefonemas dela. Começou a trabalhar, fez alguns cursos, seguiu a vida sempre acreditando no amor. O sonho não saiu de dentro dele. Ah, o sonho de formar uma família!...

Breno deixou aquele amor por Maria adormecer. Teve outros relacionamentos, mas nenhum que o marcasse como marcou Maria. Ah, seus beijos!... Realmente era muito chata, mas era tão carinhosa!...

Breno não queria que tivesse sido assim. Se pudesse voltar no tempo...

Mas ele não podia mudar Maria! Ninguém muda ninguém!

Se ele errou, ela também errou...

Mas Maria, por ser orgulhosa, não reconhece que errou.

É aquele tipo de pessoa que tem facilidade de ver o erro dos outros, mas não vê os próprios erros!

A mãe de Breno, ao vê-lo triste, teve em mente a ideia de voltar ao Nordeste na intenção de trazer Maria para que ela se acertasse com Breno. O rapaz não concordou com a ideia da mãe, disse que seria uma perda de tempo, uma viagem em vão.

Breno estava certo, foi mesmo em vão. Maria disse para mãe de Breno que não arredaria o pé de lá de jeito nenhum.

Eita Maria de coração duro!

A dureza do coração congela a vida!

Dezoito anos depois, Breno reencontra Evinha ( sobrinha querida de Maria, era quase como uma filha pra ela ) nas redes sociais. A menina que era uma criança meiga, linda que parecia uma boneca, e que na época tinha cinco anos e chamava Breno de tio, hoje é uma mulher casada com filho. Breno lembrou do rosto angelical, e ficou meio que sem palavras. Evinha falou para Breno que, independente do que aconteceu, o carinho dela por ela não mudou, e que sempre lembra o tio querido. Breno ficou comovido com a mensagem carinhosa. Sentiu vontade de falar do amor por Maria, mas se manteve calado. Maria o adicionou no aplicativo, mandou um simples OLÁ! BOM DIA!. Breno ao ver sua ex- mulher sentiu o coração acelerado, ficou sem saber como agir, e somente respondeu OI CRIS! QUE SAUDADE!. A sua ex- mulher só visualizou a mensagem e nada disse. Maria se manteve fria durante muito tempo, as vezes bloqueava e desbloqueava o Breno. As vezes dava a entender que queria uma aproximação, e em seguida voltava a ser fria. Breno ficou achando que Maria tinha o intuito de fazê-lo de gato e sapato, de fazer com que ele ficasse só aos pés dela. Maria, certa vez, perguntou como estavam os pais de Breno, que respondeu que estava tudo bem graças a Deus. Breno passou o telefone para a sua mãe conversar com Maria Crislane. A mãe de Breno disse que o filho casou com uma mulher interesseira e que não fazia gosto desse casamento. Tanto que até ficou doente da cabeça, de tanto alertar o filho e ele não dar ouvidos! " Eu queria, Cris que ele estivesse casado com você" . Maria não respondeu à mãe de Breno. Depois a mulher ficou ainda mais fria com Breno. Ela até o bloqueou

Uma vez ele mandou para Evinha uma foto dele junto de Maria, foto da época de início do namoro. Evinha compartilhou a foto com a tia, haja vista Breno não ter mais como entrar em contato com Maria. Depois, no outro dia, disse para Breno que a tia gostou muito de saber que ele ainda tinha a foto guardada, e que nem imaginava que a foto ainda existia.

Evinha falou que a tia iria entrar em contato com ele, o que não se concretizou. Breno ficou ansioso, achando que iria conversar, abrir o coração para Maria e que os dois iriam se acertar. Mas Maria deu um balde de água fria, quando mandou sua sobrinha dizer a Breno que tinha voltado para um namorado, e que também não mais estava morando no mesmo endereço. Breno não acredita na mensagem, vem uma vontade de chorar. Sua mãe diz: " Chega, filho! Só diz para Evinha que deseja muito que a tia dela seja feliz! Pronto! Deixa ela seguir a vida! "

Breno faz o que a mãe lhe disse. Mas algo dentro dele diz que essa história não faz sentido. Por que Maria entraria em contato com ele, e ficaria fria? Por que Evinha está no contato dele e não esclarece nada? Breno quer acreditar que Maria aceitará a reconciliação.

Há uma dúvida pairando no ar!

Tempos nebulosos que já faz cinco anos! Nenhuma resposta!

Nada! Breno escreve a carta para Deus, pois Deus é Deus de resposta .

( Autor: Poeta Alexsandre Soares de Lima )

Poeta Alexsandre Soares
Enviado por Poeta Alexsandre Soares em 21/02/2022
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