JULIETE - SONHO E REALIDADE
Juliete era aquele tipo de garota que, na minha opinião, era diferente das outras, não porque ela fosse chata, de maneira alguma, muito pelo contrário, ela era até sociável, amiga, mas guardava algo que dificilmente conseguíamos decifrar. Seu olhar escondia um certo mistério e com ele fulminava qualquer criatura que a importunasse. Era bonita e poucos se dispuseram a cortejá-la, tinha uma sensibilidade muito além do que se imaginava em uma pessoa normal. Não, Juliete não era uma pessoa anormal, era normal até demais, o problema é que ninguém conseguia "domá-la" quando se iniciava uma situação, digamos assim, complicada. Ela tinha um certo poder mental que as vezes nos deixava perplexos, sabia se sair muito bem de qualquer situação e tinha auto controle em tudo. Algumas vezes eu a observava discretamente e tentava decifrar o seu comportamento misterioso, principalmente o seu olhar que inúmeras vezes eu fugia dele, me parecia que ela adivinhava quando eu estava a observá-la, o que me fazia mudar o foco da visão. Assim era Juliete, a garota que caiu no meu gosto, apesar de não ter a mínima condição de namorá-la, um desejo que eu alimentava secretamente. Deus me livre dela saber disso!
Morávamos na mesma rua, tínhamos nossos costumes, aqueles que todo jovem dos anos 60/70 tinha, ou seja, freqüentar um cinema, ir a praia, curtir um assustado num final de semana e namorar no portão da casa da eleita, isso quem tinha namorada fixa, mas a maioria dos meus amigos não tinha, inclusive eu. Geralmente os nossos finais de semanas eram agitados, sempre tínhamos algum programa e dificilmente passávamos em branco. O destaque de nossa turma era Juliete, moça extrovertida, desinibida e cheia de charme, "cantar" uma belezura dessa era levar um fora na hora, tínhamos um certo receio disso acontecer e todo cuidado era pouco. Ela devia ter uns 18 anos mais ou menos, eu era dessa faixa etária e meu sonho secreto era conquistá-la, aproveitar enquando outro não me passasse a perna, o problema era como. Mas eu pensava, um dia chego lá e boto banca na turma, já que ninguém se aventurava a tal ideia.
Certa noite de sábado estávamos num assustado ali mesmo no bairro, era na casa de Sílvia, uma amiga nossa que estava comemorando seu aniversário, todos estavam alegres e se divertindo ao som de músicas da época. Bebíamos dentro do limite e comíamos alguns petiscos quando a aniversariante me convidou para dançar. Todos nos aplaudiram quando iniciamos a dança, menos Juliete, que me olhava com aquele olhar fulminante. Botei banca e sorri para ela que continuou me fulminando acintosamente, mas nenhum dos presentes notou. Me senti incomodado e pedi a Sílvia para pararmos um pouco, pois queria tomar mais um gole de cerveja (mentira, eu estava tentando saber o que se passava na cabeça de Juliete), só que ao se desvencilhar de mim ela me beijou na face e agradeceu sorrindo. Vi somente aquele dedinho indicador de Juliete me chamando. Fui imediatamente ao seu encontro.
- Quer dançar comigo - falou ela para meu espanto.
- Com certeza, querida - respondi afoitosamente. Tomei uns dois goles de cerveja de uma só vez e demos início a dança. Para mim foi uma imensa felicidade, pois jamais imaginei poder abraçar aquele corpinho que despertava sempre a minha atenção e isso me deixou completamente pasmo e apreensivo com o que poderia acontecer dali prá frente.
- Vi quando aquela sirigaita lhe beijou - disse Juliete como a me incriminar.
Dançamos por um bom tempo e nada dela me largar, mas no fundo eu estava gostando. A turma começou a notar e ficar prestando atenção a nós. Será que meu sonho estava se realizando? Esse foi o meu pensamento. Eu estava tão entusiasmo que julguei estar sonhando. Quando deixei Juliete, após a dança, o comentário foi geral, todos nos aplaudiram e meu sentimento era de pura felicidade. Fomos até o jardim e lá iniciamos um diálogo, notei que essa minha secreta paixão estava vindo a tona, segurando suas mãos criei coragem e me declarei para Juliete. Ela simplesmente me abraçou e demos início ao beijo mais gostoso de toda a minha vida, um beijo de língua que durou cerca de uns dois ou três minutos. Enfim Juliete estava em meus braços, era nesse momento a minha namorada, que saiu dos sonhos e entrou na realidade. Ela me confidenciou dias depois que aquele beijo dado na minha face por Sílvia havia despertado um desejo seu, desejo esse que havia surgido há poucos meses. O beijo de Sílvia lhe causou um certo ciúme e ela resolvera tomar logo a frente antes que fosse tarde.
O tempo passou, isso aconteceu há exatamente 48 anos, hoje somos marido e mulher, temos três filhos e quatro netos, estando esta história bem guardada em um diário que possuo.