Memorial Tale

As histórias de amor atuais não são tão distintas das antigas, parece que há uma fórmula baseada em drama ou tragédia, ou as duas ao mesmo tempo, depende de quem vivencia ou observa tal história. E logo hoje ele viria a se lembrar de alguém que lhe jurou amor eterno regado a muitas lágrimas e corações acelerados com punhos e lábios cerrados. Foi uma linda jura eterna que parece não ter sido lembrada por ela na mesma ocasião em que se trombaram em frente a loja que ele esperava chegar o ônibus.

A culpa foi dela, que distraída, como sempre fora, olhava para a bolsa procurando algo e não viu aquele manequim de quase meia idade na mente e um corpo lesionado depois de uma cansativa manhã de treinos. A trombada foi cinematográfica, papéis caindo, documentos pulando dos bolsos, ela caiu, ele pediu desculpas, mesmo sem ter culpa, mas isso não mudou nada no decorrer dos anos, ele ainda não fazia ideia de quem o tinha atropelado e caído causando toda aquela confusão da qual ele só queria sair antes mesmo que chegasse sua condução.

Quando ela escuta aquela “desculpa, moça” naturalmente lhe sai da boca um “a culpa foi...”, mas enquanto fala recorda da voz, mesmo que embrulhada na máscara, ainda era a voz de quem tinha acabado de acordar mesmo sendo 12h. Então ela se levanta rápido, coloca tudo na bolsa e corre para dentro da loja, com as faces tão vermelhas quanto a marquises que os abrigava daquele sol de 39º C.

Os sentimentos dele não valiam nada, e imaginava que as promessas de outrora valiam tanto quanto aquela foto 3x4 aos seus pés. Poderia ser o destino que a vida lhe colocasse ali parado tal qual a pedra que sempre fora no caminho dela, fosse como base para sustentá-la ou obstáculo para lhe atrasar. Mas destinos não são cruéis, as pessoas sim.

Pensou em segui-la e entregar a foto, mas nem ao menos se abaixou para apanhar a memória, só olhou pra trás e pensou que logo pela madrugada era ela quem habitaria seus sonhos, recusando sua companhia enquanto se despia dos valores morais de ambos e se abraçavam naquela cena morfética tão nostálgica que o fez passar a manhã inteira pensando nela.

Voltou a si quando alguém lhe pergunta se está bem. Uma freira, com um rosto tão simpático que foi impossível lhe negar uma resposta “sim, não foi nada” e ela com um olhar gracioso lhe diz que para quem tem uma ferida na alma as dores do corpo não doem tanto. Bem, naquele exato momento ele não podia concordar ou discordar, pois tinha uma dor no cotovelo por ter se distraído no treino e tomado uma queda. Assim sorri com os olhos e responde à Irmã “as cicatrizes da alma gostam de sangrar vez ou outra né moça?”.

Chico Alves
Enviado por Chico Alves em 07/02/2022
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