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Três meses depois desse encontro na sequência de trabalho*, corria o verão de 2012, Diana andava eufórica desde que tivera a certeza que se iria encontrar de novo com António. Apesar da distância, correspondiam-se por e-mail e mais recentemente, por grande insistência dele, falavam-se por skype.
Agora, ela iria ter oportunidade de visitar Portugal e também o seu adorado.
Só uma vez falara com a mãe sobre o assunto, e ao de leve, pois sabia que ela era muito ciumenta e possessiva. Mesmo as tias Christina e Elisabeth, apesar de próximas, pouco sabiam sobre o lado sentimental dela, por isso foi com surpresa que a mãe soube das férias em Portugal e também a razão dessa viagem. Ficou amuada, apenas lhe disse - vê lá o que vais fazer…
Diana não era criança, já tinha trinta e seis anos, alimentava um sonho persistente: ser mãe e com o homem ideal. António preenchia esses requisitos, embora soubesse que havia algo de salto no escuro nessa postura. A vida é um risco e quem não arrisca, não petisca…
Na véspera do dia aprazado, tendo em conta que ambos estariam de férias durante duas semanas, já com tudo tratado e itinerário definido em comum, os nervos não a deixavam sossegar. Nessa noite não pregou olho, a insónia valeu-lhe umas marcadas olheiras que em vão tentou disfarçar com maquilhagem.
O táxi levou-a ao aeroporto, quase três horas antes da partida. Infelizmente, deparou com filas mais compridas que o costume. O aeroporto F. Kennedy, que ela já tantas vezes utilizara quer em trabalho, quer em lazer, agora parecia-lhe estranho. Por fim, já sentada no seu lugar em classe turística, olhava através da pequena vigia para o exterior, refletindo sobre aquela decisão, a aventura em que se ia meter. Amava muito António. Mexera com ela como nenhum outro, uma paixão que a deixara totalmente dependente, tirara-lhe muitas vezes o sono, tinha sonhos intensos com ele… e mantivera-se sempre fiel, porque tenha-lhe amor verdadeiro.
No entanto… preocupava-a o futuro comum. Algumas vezes aflorou o assunto, ele disse-lhe que fosse no país dele ou no dela, o mais importante era ficarem juntos e ambos o queriam, não era verdade?
Na altura descansava das suas preocupações, mas ansiosa como era, depressa voltava a pensar no assunto.
Após o avião descolar, depressa adormeceu…
Cochilara, comera apenas uma parte das refeições que lhe serviram ao longo da viagem, adormecera de novo… claro que o comprimido que tomou logo a seguir ao embarque também teve responsabilidades nesse sono artificial.
De manhã, ao sobrevoar Lisboa a baixa altitude, preparando a aterragem no aeroporto Humberto Delgado, constatou uma cidade extensa, embora muito diferente da sua Big Apple, plana, sem arranha-céus nem grande densidade de cimento armado.
Logo que o avião tocou o solo, sentiu uma vibração no seu celular, avisando de uma mensagem.
Era ele, carinhoso como sempre, avisando que a aguardava ansioso na zona de chegadas.
O processo inerente ao desembarque foi algo complicado, muita burocracia, até que conseguiu chegar ao imenso hall de saída onde, no meio de um magote de gente, António a aguardava algo impaciente. O seu rosto iluminou-se quando os olhares se cruzaram, ela correu para ele e abraçou-o com emoção. Beijaram-se de forma comedida pois muitos olhares se pousaram neles, curiosos.
Ele conduziu-a até ao carro, um BMW novo, onde Diana se instalou.
Enquanto conduzia ele brincou com as palavras, deixando-a à vontade. Era uma faceta que não conhecia dele, em Nova Iorque e mesmo na net era tão austero e circunspecto...
António dirigiu até Oeiras, onde num restaurante na praia degustaram arroz de marisco acompanhado de vinho verde. Ela estava cheia de fome e comeu com vontade.
Deram uma volta pela linha do Estoril, entretanto o dia correu rápido e foram parar a uma zona tranquila dos arredores da capital. Ele arrumou o carro na garagem coletiva do prédio onde morava e de elevador foram até ao piso do apartamento dele.
António perguntou se ela queria tomar duche, ela assentiu, ele trouxe-lhe a mala para um quarto espaçoso mas simples, que Diana deduziu ser o dele.
Tomou banho, nem acabou pois ele entrou na box abraçando-a e beijando-a. Ambos nus, estiveram algum tempo em carícias intensas até que meios molhados, caíram sobre a cama e amaram-se sem noção das horas. Já perto das vinte e uma horas encomendaram comida de take away e depois ela deitou-se, ele de conchinha com ela, adormeceram assim até de manhã.
Acordaram tarde, de novo um banho e houve mais sexo, que os deixou bem molinhos…
Depois de almoço, pizzas e sumo de ananás, conversaram um pouco.
Ela soube que a família dele era mínima, os pais morreram cedo e ele e o irmão, o José, mais velho dois anos que ele, foram educados a partir daí pelos tios, uns ricos proprietários entretanto já falecidos e que lhes legaram toda a fortuna. Na altura o irmão, já casado e com dois filhos, vivia emigrado na Suíça, e depois de ter essa surpresa monetária, decidira continuar a viver lá.
Assim sendo, António habituara-se, até aos quarenta e nove anos, a viver só, embora de vez em quando tivesse companhia na cama…
Ele abrira-se assim com ela, confiou-lhe coisas que poderia ter omitido, Diana agradeceu-lhe pela sinceridade. António marcava pontos sobre pontos…
No dia seguinte rumaram ao Algarve onde ficaram alojados num hotel na praia da Falésia.
Esses oito dias que lá ficaram alojados fizeram verdadeiras férias, acordar tarde, fazer amor, comer e apanhar sol.
Depois vieram pela autoestrada até à região norte, passando por Setúbal, Santarém, Castelo Branco, onde pernoitaram, Guarda, Chaves e Guimarães, segunda noite. Dali foram a Braga, Viana do Castelo e dormiram no Porto. Por ser a segunda cidade do país, ficaram mais uma noite.
Sobretudo à noite, em que ficavam à janela ou a uma varanda, se o alojamento a tivesse, conversaram seriamente sobre o futuro, o que a agradou muitíssimo.
Queria-o, precisava dele como se fosse o seu oxigénio. Percebia que António também a amava, e ver os olhares que as mulheres lhe deitavam, uma sedução velada, ele só tendo olhos para ela, sempre de mão dada, com o braço pelos ombros ou então envolvendo-lhe a cintura quando caminhavam lado a lado, fazia-a sentir-se confortável.
Em todos os aspetos, nunca tivera um homem como ele.
Regressados a Lisboa, a casa dele, tiveram então uma conversa muito importante, em que António lhe confessou estar farto do país e desde adolescente que alimentava o sonho de um dia viver nos States, preferencialmente em Nova Iorque ou perto. E acrescentou que não se importava de largar tudo e emigrar para lá, arranjar emprego, tinha habilitações mais que suficientes, com o MBA em gestão e um razoável pecúlio no bolso, compraria um pequeno flat bem situado e viveriam juntinhos como dois pombinhos… Ela riu-se e ao mesmo tempo ficou arrependida de ter sempre evitado focar o facto de viver com a mãe. Então contou-lhe e ele reagiu bem. E logo resolveu o problema, compraria um apê perto da casa da mãe dela, estariam perto e visitavam-se amiúdes vezes.
A Diana agradaram-lhe esses planos racionais e sensatos. Abraçou-o e beijou-o, comovida. Fora abençoada com o amor, algo puro que nunca conhecera antes.
Passados uns meses, após duas viagens de preparação a Nova Iorque, com sondagem de casas interessantes, António decidiu-se por uma pequena, com dois cómodos, muito perto do Central Park e a três quarteirões da casa da mãe dela.
Mais uma viagem feita e já com a certeza de emprego, um amigo de longa data dera-lhe o contacto de uma empresa análoga onde foi aceite com um bom cargo. Da antiga empresa não teve muita pena pois estava em situação difícil e embora fosse amigo do presidente, sabia que se a empresa se afundasse, todos, ele incluído, iriam para o fundo com ela.
No dia aprazado para ir definitivamente para a Big Apple, já no avião subindo nos céus, deitou um olhar à cidade que o vira nascer e uma lágrima de saudade aflorou-lhe os olhos. A vida era assim mesmo…
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António e Diana viveram felizes durante oito anos. Casaram numa cerimónia simples, após muita insistência dela. Sabia que esse gesto cairia bem na mãe dela e cedeu.
Tiveram um menino, Gabriel, de cabelo castanho escuro como a mãe.
Na primavera de 2020, no eclodir do COVID-19, António foi internado num hospital com graves problemas respiratórios e acabou por morrer.
Diana quase endoideceu, valeram a mãe e as tias para cuidar do filho, então com seis anos.
Mesmo passados meses, quando Gabriel perguntava pelo pai, Diana era acometida por um forte ataque de choro, refugiando-se no quarto e estando horas sem comer.
Só então a mãe dela compreendeu o imenso amor que a filha tinha pelo genro, que a fazia esquecer tudo o resto e, apesar de uma pontinha de ciúme, sabia que Diana fora imensamente feliz.
Restava-lhe dedicar-se a Gabriel, que simbolizava a ternura de António para com ela e era inteiramente correspondida.
* Ler a primeira parte do conto REGRESSA PARA MIM.